Normas de gênero ultrapassadas estão atrasando as mulheres no mundo do trabalho e a economia do país
Rohini Pande e Charity Troyer Moore - TINYT
Sanjeev Gupta/Efe
Mulheres trabalham em área de construção em Bophal, na Índia
Normalmente, o crescimento econômico nos países de baixa e média renda gera mais postos de trabalho para as mulheres. Mas enquanto a economia da Índia teve um crescimento médio de 7% entre 2004 e 2011, a participação das mulheres na força de trabalho caiu sete pontos percentuais, de 31% para 24%. Apesar do aumento da escolaridade das mulheres e da redução da natalidade, a Organização Internacional do Trabalho em 2013 classificou a Índia em 11º lugar, de baixo para cima, em termos de participação feminina no mercado de trabalho.
A pesquisa mostra por quê isso é importante: o trabalho, e o controle de bens que ele possibilita, reduz as taxas de violência doméstica e aumenta a tomada de decisão das mulheres no ambiente doméstico. E uma economia na qual todos os cidadãos capazes podem entrar na força de trabalho é mais eficiente e cresce mais rápido.
Para o governo da Índia manter o progresso do país próximo daquele dos países de renda média, ele precisa entender por quê a participação das mulheres no mercado de trabalho está caindo, e desenvolver uma resposta política eficaz.
Dados mostram um quadro complexo e enigmático: as
mulheres estão crescendo em nível de escolaridade, mas, ao mesmo tempo,
os efeitos positivos normalmente associados ao ensino superior no
mercado de trabalho estão diminuindo.
Não é que as mulheres não queiram trabalhar. Nossa análise dos dados da última pesquisa sobre trabalho da Índia mostra que mais de um terço das mulheres que se dedicam principalmente ao trabalho doméstico dizem que gostariam de ter um emprego, e esse número chega perto da metade das mulheres com maior escolaridade na Índia rural.
Grande parte do motivo para elas não trabalharem parece ser a persistência das normas de gênero tradicionais da Índia, que buscam garantir a "pureza" das mulheres, protegendo-as de outros homens que não sejam seus maridos, e restringindo sua movimentação fora de casa.
O trabalho assalariado em casa ou o empreendedorismo, mesmo quando ele existe, raramente transformam e libertam o trabalhador. Em nosso trabalho com mulheres jovens que participaram de programas de formação profissional na Índia rural, temos visto homens que se recusam a permitir que suas filhas, esposas e noras saiam dos vilarejos para continuar o treinamento ou trabalhar.
Os professores desses programas, cuja remuneração depende dos resultados de emprego de seus alunos, relutam em trabalhar com mulheres que têm mais chances de recusar empregos. Na Índia urbana, os empregos são mais próximos em termos de localização geográfica, mas as mulheres não têm acesso às redes de contatos de trabalho tradicionalmente dominadas pelos homens.
Assim, as mulheres muitas vezes acabam em cargos com menor salário e responsabilidade do que suas habilidades permitiriam – o que, por sua vez, torna menos provável que elas resolvam trabalhar, especialmente quando a renda familiar cresce e elas não precisam trabalhar para sobreviver.
Esse quadro pode parecer assustador. No entanto, normas aparentemente imutáveis podem ruir quando os mercados de trabalho começarem a valorizar o trabalho das mulheres de forma adequada.
A indústria do vestuário no vizinho Bangladesh responde por mais de 75% das receitas nacionais de exportação e, surpreendentemente, quase 80% dos quatro milhões de funcionários do setor de vestuário de Bangladesh são mulheres.
O crescimento explosivo do setor durante os últimos 30 anos causou um aumento em grande escala da participação das mulheres no mercado de trabalho. Ele também atrasou idade de casamento e fez com que os pais passassem a investir mais na educação das filhas. Essas mudanças, por sua vez, muito provavelmente reforçaram o forte histórico de crescimento de Bangladesh no setor do vestuário.
Na Índia, nos sectores profissionais de maior expansão, e onde as condições de trabalho são claramente boas, as mulheres têm ido muito bem. Um exemplo é o setor de serviços financeiros: embora apenas uma em cada dez empresas indianas sejam lideradas por mulheres, mais da metade delas estão no setor financeiro. Hoje, o principal banco privado e o principal banco público da Índia são ambos chefiados por mulheres.
Outro exemplo é o setor de aviação da Índia, que desde o início se posicionou como uma profissão favorável às mulheres. Hoje, 11,7% dos 5.100 pilotos da Índia são mulheres, contra 3% no mundo.
Esses sucessos, contudo, representam alguns poucos milhares de mulheres num país de centenas de milhões. A Índia precisa de políticas que criem uma demanda rápida e generalizada pelo trabalho das mulheres, semelhante ao que aconteceu em Bangladesh.
Na ausência de um setor industrial em rápido crescimento que crie postos de trabalho para as mulheres, a resposta para a Índia pode estar em aumentar as quotas de gênero no mercado de trabalho.
A Índia já usou essas quotas com sucesso nas eleições locais. Pesquisas mostram que em locais com quotas, mais mulheres disputaram e conquistaram cargos públicos, mesmo depois de as quotas deixaram de existir. As quotas aumentaram as aspirações das famílias para suas filhas, e as aspirações das mulheres para si mesmas.
O aumento do número de líderes mulheres também gerou melhores resultados para as mulheres em geral: mais fundos foram gastos em bens e serviços públicos que beneficiam as mulheres, e as mulheres agora estão denunciando mais atos de violência. A economia também se beneficiou à medida que mais mulheres tomaram empréstimos empresariais nos vilarejos que tinham a quota.
A outra grande experiência da Índia com cotas de gênero, que começou na década de 1980, foi com professoras nas escolas. Mais uma vez, usando dados das pesquisas de trabalho da Índia, descobrimos que a educação é o setor que mais emprega mulheres nas áreas urbanas e o segundo, depois da agricultura, nas áreas rurais.
Implementar, e avaliar com rigor, as quotas em outros setores acessíveis a mulheres jovens com boa escolaridade e que lhes ofereçam uma carreira atraente em um ambiente de trabalho seguro é um passo promissor.
Além disso, para garantir que a oferta de mulheres capacitadas atenda à nova demanda, o estabelecimento de quotas deve se apoiar em programas de formação e colocação profissional seguros e eficazes.
O discurso do primeiro-ministro Narendra Modi no Dia da Independência no ano passado enfatizou a necessidade de transformar as normas de gênero na Índia. Pouca coisa, entretanto, mudou desde então.
O que é necessário é óbvio: Modi e seus assessores deveriam fazer um uso mais amplo dos instrumentos políticos já disponíveis, incluindo de quotas e treinamento, para garantir que todas as mulheres da Índia tenham a oportunidade de ter um trabalho gratificante – um trabalho que permita que elas determinem o rumo de suas próprias vidas, o de suas famílias e o de seu país.
Avó deixa menino preso em ponto de ônibus na Índia para ir trabalhar
20.mai.2014 - Um menino de nove anos passava as tardes preso a um ponto de ônibus na cidade de Mumbai, na Índia. Lakhan Kale não pode ouvir, nem falar e sofre de paralisia cerebral e epilepsia. A avó do menino, Sakhubai Kale, 66, decidiu deixá-lo preso em uma tentativa de mantê-lo seguro, enquanto ela trabalhava como vendedora de flores e guirlandas. Segundo a avó, o menino frequentava uma escola específica que parou de atendê-lo. Após a publicação das imagens, entidades de assistência a crianças colocaram Lakhan sob os cuidados de uma instituição governamental, onde a avó poderá visitá-lo - Punit Parajpe/AFP
Não é que as mulheres não queiram trabalhar. Nossa análise dos dados da última pesquisa sobre trabalho da Índia mostra que mais de um terço das mulheres que se dedicam principalmente ao trabalho doméstico dizem que gostariam de ter um emprego, e esse número chega perto da metade das mulheres com maior escolaridade na Índia rural.
Grande parte do motivo para elas não trabalharem parece ser a persistência das normas de gênero tradicionais da Índia, que buscam garantir a "pureza" das mulheres, protegendo-as de outros homens que não sejam seus maridos, e restringindo sua movimentação fora de casa.
O trabalho assalariado em casa ou o empreendedorismo, mesmo quando ele existe, raramente transformam e libertam o trabalhador. Em nosso trabalho com mulheres jovens que participaram de programas de formação profissional na Índia rural, temos visto homens que se recusam a permitir que suas filhas, esposas e noras saiam dos vilarejos para continuar o treinamento ou trabalhar.
Os professores desses programas, cuja remuneração depende dos resultados de emprego de seus alunos, relutam em trabalhar com mulheres que têm mais chances de recusar empregos. Na Índia urbana, os empregos são mais próximos em termos de localização geográfica, mas as mulheres não têm acesso às redes de contatos de trabalho tradicionalmente dominadas pelos homens.
Assim, as mulheres muitas vezes acabam em cargos com menor salário e responsabilidade do que suas habilidades permitiriam – o que, por sua vez, torna menos provável que elas resolvam trabalhar, especialmente quando a renda familiar cresce e elas não precisam trabalhar para sobreviver.
Esse quadro pode parecer assustador. No entanto, normas aparentemente imutáveis podem ruir quando os mercados de trabalho começarem a valorizar o trabalho das mulheres de forma adequada.
A indústria do vestuário no vizinho Bangladesh responde por mais de 75% das receitas nacionais de exportação e, surpreendentemente, quase 80% dos quatro milhões de funcionários do setor de vestuário de Bangladesh são mulheres.
O crescimento explosivo do setor durante os últimos 30 anos causou um aumento em grande escala da participação das mulheres no mercado de trabalho. Ele também atrasou idade de casamento e fez com que os pais passassem a investir mais na educação das filhas. Essas mudanças, por sua vez, muito provavelmente reforçaram o forte histórico de crescimento de Bangladesh no setor do vestuário.
Na Índia, nos sectores profissionais de maior expansão, e onde as condições de trabalho são claramente boas, as mulheres têm ido muito bem. Um exemplo é o setor de serviços financeiros: embora apenas uma em cada dez empresas indianas sejam lideradas por mulheres, mais da metade delas estão no setor financeiro. Hoje, o principal banco privado e o principal banco público da Índia são ambos chefiados por mulheres.
Outro exemplo é o setor de aviação da Índia, que desde o início se posicionou como uma profissão favorável às mulheres. Hoje, 11,7% dos 5.100 pilotos da Índia são mulheres, contra 3% no mundo.
Esses sucessos, contudo, representam alguns poucos milhares de mulheres num país de centenas de milhões. A Índia precisa de políticas que criem uma demanda rápida e generalizada pelo trabalho das mulheres, semelhante ao que aconteceu em Bangladesh.
Na ausência de um setor industrial em rápido crescimento que crie postos de trabalho para as mulheres, a resposta para a Índia pode estar em aumentar as quotas de gênero no mercado de trabalho.
A Índia já usou essas quotas com sucesso nas eleições locais. Pesquisas mostram que em locais com quotas, mais mulheres disputaram e conquistaram cargos públicos, mesmo depois de as quotas deixaram de existir. As quotas aumentaram as aspirações das famílias para suas filhas, e as aspirações das mulheres para si mesmas.
O aumento do número de líderes mulheres também gerou melhores resultados para as mulheres em geral: mais fundos foram gastos em bens e serviços públicos que beneficiam as mulheres, e as mulheres agora estão denunciando mais atos de violência. A economia também se beneficiou à medida que mais mulheres tomaram empréstimos empresariais nos vilarejos que tinham a quota.
A outra grande experiência da Índia com cotas de gênero, que começou na década de 1980, foi com professoras nas escolas. Mais uma vez, usando dados das pesquisas de trabalho da Índia, descobrimos que a educação é o setor que mais emprega mulheres nas áreas urbanas e o segundo, depois da agricultura, nas áreas rurais.
Implementar, e avaliar com rigor, as quotas em outros setores acessíveis a mulheres jovens com boa escolaridade e que lhes ofereçam uma carreira atraente em um ambiente de trabalho seguro é um passo promissor.
Além disso, para garantir que a oferta de mulheres capacitadas atenda à nova demanda, o estabelecimento de quotas deve se apoiar em programas de formação e colocação profissional seguros e eficazes.
O discurso do primeiro-ministro Narendra Modi no Dia da Independência no ano passado enfatizou a necessidade de transformar as normas de gênero na Índia. Pouca coisa, entretanto, mudou desde então.
O que é necessário é óbvio: Modi e seus assessores deveriam fazer um uso mais amplo dos instrumentos políticos já disponíveis, incluindo de quotas e treinamento, para garantir que todas as mulheres da Índia tenham a oportunidade de ter um trabalho gratificante – um trabalho que permita que elas determinem o rumo de suas próprias vidas, o de suas famílias e o de seu país.
Avó deixa menino preso em ponto de ônibus na Índia para ir trabalhar
20.mai.2014 - Um menino de nove anos passava as tardes preso a um ponto de ônibus na cidade de Mumbai, na Índia. Lakhan Kale não pode ouvir, nem falar e sofre de paralisia cerebral e epilepsia. A avó do menino, Sakhubai Kale, 66, decidiu deixá-lo preso em uma tentativa de mantê-lo seguro, enquanto ela trabalhava como vendedora de flores e guirlandas. Segundo a avó, o menino frequentava uma escola específica que parou de atendê-lo. Após a publicação das imagens, entidades de assistência a crianças colocaram Lakhan sob os cuidados de uma instituição governamental, onde a avó poderá visitá-lo - Punit Parajpe/AFP
Nenhum comentário:
Postar um comentário