Reinaldo Azevedo - VEJA
O ministro
Gilmar Mendes, vice-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e
membro do Supremo Tribunal Federal (STF), não deixou a arrogância
grosseira, ou a grosseria arrogante, de Rodrigo Janot, procurador-geral
da República, passar em branco e respondeu com todas as letras em
entrevista a este blog, neste domingo: “Janot não deveria se comportar
como um dos advogados do PT; afinal, o partido já contratou
profissionais competentes para fazer a sua defesa”.
Nas moscas! Para quem não acompanhou, explico.
A empresa
VTPB, que se diz especializada na área gráfica, recebeu R$ 26,8 milhões
do PT a título de serviços prestados durante o processo eleitoral —
desse total, R$ 23 milhões foram pagos pela campanha de Dilma Rousseff.
Muito bem! Mendes, relator da prestação de contas do PT, dadas as
informações que estão vindo à luz em razão da Operação Lava-Jato e de
apurações da imprensa, encaminhou à Procuradoria-Geral da República e à
Polícia Federal um pedido de investigação da empresa.
E ele
explica os motivos: “Ora, sabemos agora tratar-se de uma empresa que
recebe esse enorme volume de dinheiro, embora não tenha um único
funcionário contratado, não disponha de parque gráfico e não tenha nem
mesmo, num dia de visita fortuita, uma sede aberta para chamar de sua.
Convenham: é, no mínimo, estranho”.
Pois é… Em
seu parecer, que recomenda o arquivamento da investigação, Janot alega
que já se extinguiu o prazo para se apurar crime eleitoral e ainda se
atreve a dar uma lição de moral no ministro. Escreveu:
“Não interessa à sociedade que as controvérsias sobre a eleição se perpetuem: os eleitos devem poder usufruir das prerrogativas de seus cargos e do ônus que lhes sobrevêm, os derrotados devem conhecer sua situação e se preparar para o próximo pleito. A questão de fundo é que a pacificação social e estabilização das relações jurídicas é um das funções mais importantes de todo o Poder Judiciário, assumindo contornos de maior expressão na Justiça Eleitoral, que lida ‘com a escolha de representantes para mandatos temporários’”.
“Não interessa à sociedade que as controvérsias sobre a eleição se perpetuem: os eleitos devem poder usufruir das prerrogativas de seus cargos e do ônus que lhes sobrevêm, os derrotados devem conhecer sua situação e se preparar para o próximo pleito. A questão de fundo é que a pacificação social e estabilização das relações jurídicas é um das funções mais importantes de todo o Poder Judiciário, assumindo contornos de maior expressão na Justiça Eleitoral, que lida ‘com a escolha de representantes para mandatos temporários’”.
Gilmar
responde: “Repudio esse entendimento, obviamente absurdo. Ainda que não
se pudesse mais apurar crime eleitoral, há a possibilidade de que outros
tenham sido cometidos. É preciso investigar se uma gráfica, nessas
condições, não está praticando, por exemplo, crime previdenciário ou de
lavagem de dinheiro. Isso tudo é da alçada do procurador-geral.” E a
suspeita surge do nada? Não! O delator Ricardo Pessoa afirmou em seu
depoimento que a tal VTPB recebeu dinheiro sujo do petrolão.
De fato, estabelece o Parágrafo 10 do Artigo 14 da Constituição o que segue:
“§ 10 – O mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral no prazo de quinze dias contados da diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude”.
“§ 10 – O mandato eletivo poderá ser impugnado ante a Justiça Eleitoral no prazo de quinze dias contados da diplomação, instruída a ação com provas de abuso do poder econômico, corrupção ou fraude”.
Muito bem.
Gilmar foi relator das contas de Dilma no TSE. Basta consultor o seu
voto para constatar que ele recomendou a aprovação das ditas-cujas,
deixando claro, no entanto, que eventuais irregularidades poderiam e
deveriam, sim, ser apuradas. Por isso mesmo, ele não fechou o
procedimento. De resto, o próprio tribunal, por maioria, já determinou
que se investiguem os indícios de irregularidade na campanha.
Mendes
afirma a este blog: “A Justiça Eleitoral não pode servir de lavanderia
de dinheiro sujo. Se aquela aulinha que o procurador-geral tentou dar à
Justiça Eleitoral estivesse certa, deixar-se-ia de investigar até um
homicídio ocorrido no âmbito de uma campanha eleitoral. Aliás, parte
considerável da investigação da Lava-Jato, então, estaria fora da lei.
Quando mandei apurar o caso dessa gráfica, não pensava exclusivamente no
eventual crime eleitoral, mas principalmente nos outros, os conexos. O
Parágrafo 10 do Artigo 14 da Constituição não embasa a recusa do
procurador-geral.”
Já
enfrentei alguns ataques na área de comentários do blog em razão de
críticas que fiz a Janot quando as julguei procedentes. E, meus caros,
quando avalio ser pertinente, critico também o papa. À moda Padre
Vieira, de vez em quando, sobre até para o Altíssimo. E, por óbvio,
sendo assim, é claro que também posso ser criticado. O problema é que
alguns bobos se deixam levar pela subimprensa a soldo, que tem
compromisso com uma agenda, não com os fatos. Aos poucos, como vemos,
ela vai se desmoralizando. Nessa questão, como em qualquer outra, basta
perguntar: “Quem está financiando?” Obtida a resposta, o resto é fácil.
Já tem farsante com um pé na cadeia. Desde o começo da Operação
Lava-Jato, pergunto onde estão os representantes do Poder Executivo, não
é mesmo?
Mas
voltemos a Mendes. Diz o ministro sobre Janot: “Se ele quer opinar
contra a investigação, que o faça, mas, então, que aponte as razões. Se
ele não viu sinal de irregularidade na tal gráfica, que diga isso. Mas
não lhe cabe dizer quais são os limites da Justiça Eleitoral. Ele
precisa tomar cuidado para não criar a Hermenêutica Dilma, de sorte que
se tem uma linha interpretativa destinada à proteção da presidente. A
Justiça Eleitoral sabe muito bem qual é o seu papel e está atuando
dentro dos mais estritos limites legais. Se há indícios de outros
crimes, conexos ao eleitoral, cabe à Procuradoria-Geral da República
atuar”.
Pressão antiga
Não custa lembrar. No fim do ano passado, Eugênio Aragão, procurador-geral eleitoral e aliado de Janot, entrou com um pedido para que Mendes deixasse de ser o relator das contas da campanha de Dilma. O PT fez a mesma coisa. Aragão é um homem muito próximo do partido e frequentava a lista dos preferidos de Dilma para o Supremo.
Não custa lembrar. No fim do ano passado, Eugênio Aragão, procurador-geral eleitoral e aliado de Janot, entrou com um pedido para que Mendes deixasse de ser o relator das contas da campanha de Dilma. O PT fez a mesma coisa. Aragão é um homem muito próximo do partido e frequentava a lista dos preferidos de Dilma para o Supremo.
A reação de Mendes é dura, sim, mas à altura da provocação gratuita de Janot.
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