domingo, 30 de agosto de 2015

Hostilidade dos republicanos em relação ao acordo do Irã não é novidade
Nicole Hemmer e Tom Switzer - NYT
Mike Segar/Reuters
Manifestantes protestam contra o acordo nuclear com o Irã na Times Square, em Nova York (EUA)Manifestantes protestam contra o acordo nuclear com o Irã na Times Square, em Nova York (EUA)
Desde que o acordo nuclear com o Irã foi anunciado em 14 de julho, os republicanos o atacaram com unhas e dentes. Eles o chamaram de tudo, de concessão a traição. O presidente Obama reagiu, argumentando que a oposição ao acordo vem da mesma visão de mundo que levou à invasão do Iraque em 2003: "a mentalidade caracterizada pela preferência pela ação militar em vez da diplomacia".
Mas esta linha de pensamento vai além do Iraque. Embora nem todos os republicanos conservadores compartilhem dela, a tendência a rejeitar acordos diplomáticos está enraizada na direita do espectro político norte-americano. E embora vários democratas –-de Harry Truman a Henry "Scoop" Jackson durante a Guerra Fria-– tenham adotado aspectos desta política externa radical, os conservadores são muito mais propensos do que os liberais a priorizar o confronto em vez da conciliação.
Desde o início da década de 1950, muitos conservadores –-condicionados a pensar em termos maniqueístas de vitória absoluta ou rendição total-– se opuseram a importantes iniciativas de paz, alegando que elas eram formas de rendição e concessão. Ao invés de tornar o mundo mais seguro, eles argumentavam, essas ofertas diplomáticas enfraqueciam a posição global dos Estados Unidos.
A antipatia para com a diplomacia frequentemente encontrada na direita data do que os conservadores vêem como o pecado original da diplomacia do pós-guerra: a Conferência de Yalta de 1945. O encontro entre Franklin Roosevelt, Winston Churchill e Joseph Stalin reconheceu a hegemonia soviética na Europa Oriental, onde o Exército Vermelho tinha se estabelecido em sua marcha a oeste em direção à Alemanha.
Para os linha-dura, Yalta representou a traição das "nações cativas" da Europa Oriental e o início da Guerra Fria. Assim como Neville Chamberlain havia feito concessões a Adolf Hitler em Munique, em 1938, os líderes da aliança anglo-americana capitularam diante dos soviéticos, legitimando tanto o governo de Stálin quanto seus apetites expansionistas. A lição: a diplomacia foi um sinal de fraqueza e uma expressão ingênua de confiança em um inimigo não confiável.
Mais do que ninguém, foi James Burnham, um trotskista que se tornou conservador, cofundador da revista National Review com William F. Buckley Jr., em 1955, que transformou a antipatia para com a diplomacia numa pedra angular da política conservadora moderna. Burnham via a União Soviética como exclusivamente má, e uma ameaça existencial para os Estados Unidos. Para ele, negociar com os inimigos era o mesmo que uma rendição; a coexistência era o mesmo que a derrota. A contenção jamais venceria a Guerra Fria. O que era necessário era uma espécie de guerra ofensiva –-o que Burnham, e depois Barry Goldwater, chamaram de "rollback".
Definir a política externa em termos ideologicamente tão rígidos ajudou a estabelecer o teste decisivo para o movimento conservador: nenhuma diplomacia para com inimigos mortais.
Quando Dwight Eisenhower convidou o primeiro-ministro soviético Nikita Krushchev para os Estados Unidos em 1959, conservadores linha-dura reagiram com raiva e horror. Eles criaram o Comitê Contra Complicações da Cúpula para protestar contra a visita e fizeram um comício com ingressos esgotados no Carnegie Hall. A grande ofensa da visita não foram as mãos encharcadas de sangue de Krushchev, Buckley argumentou, mas o fato de que os EUA tinham buscado um aperto de mãos e manchado suas próprias.
Essa crença de que a diplomacia comprometia a autoridade moral dos Estados Unidos levou esses conservadores a uma oposição imediata a qualquer negociação com países comunistas –-mesmo quando isso significava brigar com os próprios correligionários. Os conservadores por muito tempo abraçaram Richard Nixon e Ronald Reagan como companheiros de guerra e opositores da "China Vermelha" e do "Império do Mal". No entanto, tanto a aproximação de Nixon com a China comunista em 1971-1972 e a de Reagan com a União Soviética em 1987-88 gerou críticas severas.
Quando Nixon anunciou em julho de 1971 sua decisão de visitar a China, a direita atacou –-tanto que 12 líderes conservadores suspenderam publicamente seu apoio ao presidente, apoiando a malfadada campanha do congressista John Ashbrook, de Ohio, contra Nixon em 1972. Em seu primeiro mandato, Nixon tinha ultrapassado os limites dos conservadores apoiando a ação afirmativa, criando a Agência de Proteção Ambiental e implementando controles sobre salários e preços. Mas foi só depois da mudança de política em relação à China que eles romperam.
Da mesma forma, quando Reagan, antes beligerante, buscou acordos de controle de armas com Mikhail Gorbachev 15 anos mais tarde, os linha-dura ficaram horrorizados. Da National Review ao senador republicano Jesse Helms, antigos apoiadores da presidência de Reagan sentiram-se especialmente traídos. Reagan defendeu os tratados de controle de armas, dizendo que os EUA iriam "confiar, mas verificar". Mas para os conservadores linha-dura, esta frase era um absurdo: como era possível confiar nos soviéticos? O Wall Street Journal publicou vários editoriais no inverno de 1987-1988 condenando Reagan por ser "ludibriado a deixar os soviéticos voltarem as negociações de controle de armas para os seus próprios fins." Para os linha-dura, as cúpulas de Eisenhower, a aproximação da Nixon, a détente de Reagan e agora o acordo nuclear de Obama, todos seguem a tradição vergonhosa dos acordos de Yalta.
Mas, apesar de todo o drama, a abertura de Nixon para a China acabou se mostrando extremamente significativa. Ao quebrar um tabu de 23 anos e negociar com os líderes da nação mais populosa do mundo, os EUA exploraram a ruptura sino-soviética para criar um novo equilíbrio de poder global. Da mesma forma, praticamente todos os historiadores de hoje reconhecem que as cúpulas Reagan-Gorbachev ajudaram a acabar com o impasse de quatro décadas entre as superpotências nucleares de forma pacífica. Quando os conservadores elogiam Reagan por vencer a Guerra Fria, eles estão elogiando políticas às quais eles mesmos se opõem.
Depois de uma década em segundo plano, os ataques de 11 de setembro trouxeram de volta a abordagem linha-dura na forma da doutrina de Bush, de unilateralismo, direito de invasão e mudança de regime em um mundo dividido entre o bem e o mal. E como têm demonstrado a reação contra o acordo com o Irã e os recentes debates das primárias presidenciais republicanas, a mentalidade que começou em Yalta deixou uma impressão duradoura no pensamento de política externa republicano.
O Irã pode ser um regime radical e profundamente anti-ocidental que subvencionou milícias brutais por todo o Oriente Médio. Mas, diante de tais inimigos, os interesses norte-americanos avançaram melhor no passado através da diplomacia, e não do isolamento.
Ao jogar pedras no presidente, os herdeiros modernos da tradição linha-dura –-da liderança republicana ao senador democrata Chuck Schumer-– estão simplesmente lembrando os norte-americanos de episódios anteriores de rejeição da direita. Hoje, essa reações do passado contra aberturas diplomáticas importantes parecem tolas e duvidosas.
Tradutor: Eloise De Vylder 

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