Policial “suspeito de reagir a assalto”: Três lições para sobreviver na leitura de notícias
O
G1, portal da Globo, quis dar um passo além e chamar um policial de
"suspeito de reagir". Cabem certas lições para quem lê muitas notícias.
Uma
notícia de Contagem, MG, sacudiu a internet nos últimos dias. Não
graças à notícia, tão banal em um país cuja violência é tão banalizada,
até mesmo em relação à própria polícia, mas graças à manchete do G1, o portal da Rede Globo, que escancarou: Sargento da PM é suspeito de reagir a tentativa de assalto e matar ladrão em Contagem, na Grande BH.
A inversão é tão grande que nem foi
preciso alertar o leitor. É explícita, não sedutiva. Não disfarça, ou ao
menos não consegue disfarçar sua intenção: mesmo se um policial fardado é assaltado, é ele o suspeito, pelo “crime” de reagir, e não quem o assalta.
Mesmo assim, o episódio dá ensejo para
que se aprenda três liçõezinhas básicas para sobreviver no reino do
vício em notícias da internet.
Lição número 1: “Suspeito”. Todos
acostumados a ler notícias já se enfezaram com o vezo pelo termo
“suspeito”. Quando não se possui uma certeza sobre a identidade de um
criminoso, mas já se tem o seu nome, é costume dizer que a pessoa é
“suspeita” de ter cometido um crime. Afinal, dizer que fulano roubou ou
matou ou estuprou sem que ele o tenha feito é também um crime (calúnia,
art. 138 do Código Penal).
Mas quando se usa suspeito para “tudo”,
passa-se de um cuidado necessário para o relativismo absoluto. Até mesmo
ao descrever uma cena filmada por câmeras de segurança, se fala: “Os
suspeitos foram vistos…”. Ora, nesse caso não há suspeito: só não se
sabe o nome de quem certamente cometeu um crime. Justamente tentando amenizar, “suspeito” vira sinônimo de “bandido”. Se tudo é suspeito, tudo é absoluto.
Aí está o caminho para a ideologia: é o
que faz com que um jornalista, sabendo que seu jornal sempre trata
qualquer conflito com policiais como se a polícia fosse “excessiva”, o
que nunca é o caso para bandidos, escreva simplesmente que o policial é
suspeito de reagir. Ora, apesar da cabeça de jornalista viver
numa realidade paralela, seu público ainda vive na realidade do busão
lotado no horário do rush. O povão enfrenta bandido, não
enfrenta polícia. E já está é de saco cheio da “suspeição” eterna, não
disposto a aceitar mais um passo na direção do relativismo.
Lição número 2: “O jornalismo trabalha é nas entrelinhas”. Nenhum
jornal, a não ser os sites ideológicos que jornalistas lêem (DCM,
OperaMundi, Carta Capital, Brasil 247 etc) declaram suas intenções nas
manchetes. Onde dominam seus leitores e os guiam para uma direção ou
outra é nas entrelinhas, nas palavras que não são percebidas com muita
atenção, nos termos escolhidos para apresentar um fato.
Um jornal, site, portal, blog pode
muito bem noticiar algo desfavorável à sua linha editorial. Mas basta
escolher as palavras certas, eufemismos e hipérboles, e voilà, Janaína Paschoal recebe “esculacho”, enquanto Maria do Rosário sofre “estupro remoto” (sic).
Lição número 3: “A Globo não é mais de direita desde O Rei do Gado”. A
esquerda brasileira ainda vive de uma narrativa de vitimismo e crendo
que todos os seus fracassos se devem ao poder ultra-conservador e
direitista e “neoliberal” da emissora.
Não são apenas seus jornalistas: sua
linha editorial inteira hoje tende para a esquerda mais extrema,
inclusive no papel revolucionário da bandidagem (compare-se com o Cidade
Alerta ou com o Datena) e na desculpa “social” de tudo. Todos os seus
atores são progressistas, feministas e todos os –istas da modinha, e seu jornalismo é quem mais tenta forçar a Janela de Overton ainda mais para a esquerda antes de outros veículos.
Lição Bônus: “Incidente”. Para
quem vai fazer redação no Vestibular ou ENEM, cabe lembrar: incidente é
algo não-programado, contra as intenções dos partícipes, mas de pouco
dano. Tirar o carro da garagem raspando na pilastra é um incidente.
Mesmo sem vítimas fatais, bater a 180 km/h na traseira de um caminhão é
um acidente. Curiosa a forma como a palavra “incidente” anda aparecendo na mídia, mesmo com mortes envolvidas.
Mesmo um fatinho isolado como a notícia
do G1, como se vê, é capaz de ensinar muito a quem tem olhos para ver
além do que prestidigitadores tentam nos fazer prestar atenção.
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