Bronwen Maddox - Prospect
AFP
O presidente russo, Vladimir Putin, discursa durante evento em Moscou para marcar o aniversário de um ano da anexação da Crimeia
"Eu acho que, com certeza, deveríamos continuar ajudando o Afeganistão", disse Paul Wolfowitz. "Infelizmente, é uma boa questão" se o Congresso concordaria com isso. "Não se trata apenas de dinheiro, é a mensagem que enviaria se nós os abandonássemos. Dito isso, eu sei como os contribuintes americanos se sentem por pagarem a conta. Eu gostaria que tivéssemos procurado há muito tempo outros países que tem interesse no resultado para dividir o fardo." Wolfowitz, o vice-secretário de Defesa dos Estados Unidos de 2001 a 2005, foi um dos principais neoconservadores por trás do presidente George W. Bush na época da invasão ao Iraque.Ele aparentemente era um dos mais confiantes na capacidade dos Estados Unidos de mudar o regime e levar democracia ao país, apesar da caricatura popular, que retratava o grupo como ávido em lançar uma guerra e ingênuo a respeito de seus efeitos, ter obscurecido o nuance e idealismo em sua análise.
Ele levou esses ideais de ambições elevadas de desenvolvimento ao Banco Mundial, quando se tornou seu presidente em 2005, apesar da oposição à sua nomeação por parte de importantes economistas, a controvérsia a respeito do Iraque, a briga entre membros do banco sobre seu esforço anticorrupção e as disputas em torno de seu relacionamento pessoal com uma colega do banco terem contribuído para sua partida repentina depois de dois anos.
O sentido de falar com ele agora é em parte devido à Ucrânia e a continuidade da turbulência no Oriente Médio levantar a questão sobre se podemos intervir com sucesso ou se, depois do Iraque e do Afeganistão, nós deveríamos descartar essas antigas esperanças. Também porque, apesar de ter conversado com a "Prospect" de modo pessoal, ele se tornou conselheiro de política externa do ex-governador da Flórida, Jeb Bush, irmão de George W., que anunciou em dezembro que está considerando disputar ou não a indicação republicana para presidente em 2016.
A importância da democracia e da ordem internacional ainda é central para Wolfowitz. "Putin provavelmente violou o acordo de segurança individual mais importante resultante do final da Guerra Fria", ele disse, "o que permitiu à Ucrânia abrir mão de suas armas nucleares em troca da garantia de sua independência e integridade territorial não apenas pela Rússia, mas pelos Estados Unidos e o Reino Unido".
Também central é a crença na importância da liderança americana na afirmação dessa ordem. "Essa é a garantia para a qual olham as pessoas na Ásia, por exemplo. Elas veem nosso desempenho atual e, francamente, ficam consternadas."
Há "motivos para ser cauteloso", ele reconheceu, acrescentando que "o slogan do momento no lado ocidental" é que devemos ter "paciência estratégica", em vez de corrermos para intervir.
Ele considera isso preocupante. "Putin está invocando o princípio incrivelmente perigoso de que as fronteiras de alguma forma devem seguir a etnia. Eu não vou compará-lo a Hitler, mas esse foi o princípio do Acordo de Munique. (...) Parte do que torna isso tão perigoso é que há muitos lugares no Leste Europeu onde etnia é uma questão."
O que podemos fazer? Nós melhoramos em expor a corrupção dos comparsas do presidente Vladimir Putin, ele diz, ao, por exemplo, colocá-los na lista de sanções do Tesouro americano. "Putin é muito sensível ao fato de muitos de seus associados mais próximos terem ganhado muito dinheiro, sem contar que ele é provavelmente uma das pessoas mais ricas do mundo. Essa não é uma história que ele deseja que o povo russo ouça" acima do ruído das "mensagens ferozmente anti-Ocidente" que a mídia estatal produz.
"Eu não tenho nenhum interesse em voltar à Guerra Fria", ele disse, "mas uma coisa que fizemos muito bem no passado foi disseminar a verdade dentro da União Soviética, em uma época em que era muito mais difícil penetrar. Nós deveríamos estar fazendo um trabalho muito melhor agora".
Altos funcionários de Obama discutiram recentemente em Londres com seus pares britânicos sobre como melhor responder à enxurrada de propaganda que a Rússia está despejando no leste da Ucrânia e em partes do Báltico.
O Reino Unido, disse Wolfowitz, "está certo em reabrir a investigação do assassinato de Litvinenko" – o agente da inteligência russa fugitivo, que estava investigando o crime organizado e quer foi assassinado em Londres em 2006 – "e as informações que ele estava tentando tornar públicas".
Wolfowitz sugere, gentilmente, que "eu acredito que o Reino Unido pode fazer mais e espero que faça" para investigar o dinheiro russo em Londres. "Minha sensação é de que (as autoridades britânicas) podem, mas obviamente a grande quantidade de dinheiro russo é o motivo para hesitarem. Eles provavelmente veem isso de modo acertado como uma espada de dois gumes, que pode ferir ambos os lados."
A União Europeia também poderia assumir a liderança na ajuda à Ucrânia com a "assistência econômica em grande escala ou perdão da dívida" que precisa para reformar sua política e economia. Mas "é tolice esperar que tudo isso seja realizado enquanto estão travando uma batalha perdida para defesa de seu próprio território –apesar de termos dito que defenderíamos sua integridade territorial".
Ele critica os debates sobre intervenção que rejeitam, como ele vê com frequência, dar armas ao povo para que se defendam, citando "1991, onde abandonamos os xiitas no sul do Iraque, ou os anos 90, onde nos recusamos a permitir que os bósnios recebessem armas".
A Líbia, ele disse, é "um exemplo perfeito e infeliz", onde a recusa ocidental em armar e equipar as forças de segurança após a revolução fez com que os moderados que venceram as eleições fossem minados por extremistas, que foram ajudados pelo afluxo de armas do Golfo Pérsico.
Esse tipo de prescrição leva alguns a retratarem Wolfowitz como um perpétuo falcão, mas isso está errado. No caso da Ucrânia, ele disse: "Nenhuma quantidade de armas permitirá que vençam. Mas vencer não é a meta. Manter o máximo possível do território deles é a meta, e fazer com que Putin pague o preço mais alto possível".
Isso significa que deveríamos intervir agora na Síria e no Iraque? Não; sua resposta retoma as metas dos Estados Unidos quando estes se retiraram do Iraque em 2011. "Pode soar um pouco como um conto de fadas", ele disse sobre a Síria, "mas a meta precisa ser unir sunitas e xiitas moderados contra os extremistas" de cada lado.
Isso significa colocar na mesa "uma solução política, que para que tenha alguma esperança de ser aceita, teria que incluir a saída de Assad e de seus comparsas, assim como algumas garantias reais para as comunidades cristã e alauita. A esta altura, mesmo se antes não temessem pelo seu futuro, elas agora têm tanto sangue em suas mãos que precisam temer".
Ele acrescentou: "Não há muitos sunitas moderados restantes, depois que nós os abandonamos, mas talvez alguns possam ser ressuscitados". Talvez uma força de paz árabe possa ajudar, apesar "disso talvez soar um conto de fadas", ele repetiu, um final hesitante para uma prescrição que dificilmente é menos substancial que a política americana ou britânica atual.
No Iraque, de modo semelhante, ele acha que precisamos retornar ao tipo de pacto que os Estados Unidos tentaram estabelecer. "É preciso um esforço para restabelecer a barganha que foi concluída durante o que chamamos às vezes erroneamente de 'aumento das tropas', pois não se tratava disso, mas sim de separar os extremistas sunitas daqueles preparados para trabalhar com um governo (xiita) razoável."
Isso significava trazer a grande minoria sunita do país, a elite sob Saddam Hussein, aos acordos de compartilhamento de poder com os xiitas em ascensão. "Desde que partimos em 2011", ele disse, "o governo se tornou mais e mais irracional"; sua perseguição às minorias sunitas permitiu a ascensão do Estado Islâmico.
"Há esquadrões da morte xiitas e limpeza étnica da pior espécie ocorrendo no momento em Tikrit e, provavelmente logo, em Mosul", disse Wolfowitz.
A acusação de ingenuidade costuma ser aplicada com frequência contra exatamente essas esperanças: as de que os Estados Unidos poderiam superar as profundas divisões tribais e religiosas dentro do Iraque com um pacto de divisão de poder empregando as noções americanas de proteção constitucional às minorias.
Mas apesar disso ter fracassado até o momento, não há outra meta real disponível, como testemunham as autoridades das capitais europeias, enquanto diplomatas de muitos lados agora esperam que os Estados Unidos possam puxar os fios de sua rede complexa de alianças para melhorar a estabilidade na região.
"É preciso afastar Bagdá de Teerã", disse Wolfowitz, "e o que poderia fazer isso é uma ideia clara da estratégia americana, assim como maior apoio da Arábia Saudita. Os sauditas cometeram um erro terrível em grande parte da última década ao não apoiarem um governo xiita razoável em Bagdá. Não causa surpresa que os iranianos entraram com muito dinheiro e muitas armas".
Ele acrescentou: "Os sauditas podem ter muitos antolhos ideológicos em relação aos xiitas, mas eles são realistas e querem sobreviver em uma região difícil. Eles precisam entender que precisarão de aliados".
Ele é o primeiro a comentar que "há um limite para o que forasteiros podem fazer" para ajudar países a se desenvolverem após um conflito. "Os processos e exigências envolvidos são localmente específicos, de modo que é preciso uma abundância de conhecimento local. Esse é o tipo de coisa que as pessoas que cresceram em um país têm em suas mãos e que alguém com Ph.D. em estudos do Afeganistão não consegue dominar".
Não é, ele acrescentou, "algo em que você chega de fora com um roteiro. Algumas pessoas achavam que o Iraque seria como o Japão e a Alemanha (depois da Segunda Guerra Mundial)".
Mas uma área onde ajuda externa é "com frequência desesperadamente necessária" –e valiosa– é segurança. "Nós cometemos o erro no início ao não formarmos um exército afegão grande o bastante. Nosso raciocínio é que não poderíamos bancar um exército do tamanho realmente necessário. Bem, seis meses mantendo uma força da OTAN ali provavelmente pagaria por seis anos de um exército afegão de tamanho apropriado."
Qualquer tentativa de intervenção "significa dar muita liberdade para a população local e aceitar que ela cometerá erros. Assim como nós. Mas é muito melhor que ela cometa os erros, e meu palpite é que cometerão menos".
Tradutor: George El Khouri Andolfato
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