sábado, 30 de maio de 2015

Embaixada 'fantasma' dos EUA em Cuba espera sua vez
Paulo A. Paranagua - Le Monde
A retomada das relações diplomáticas entre os Estados Unidos e Cuba, anunciada pelos presidentes Barack Obama e Raúl Castro no dia 17 de dezembro de 2014, vem passando por uma aceleração. Os embaixadores poderiam ser nomeados a partir de sexta-feira (29), com a retirada de Cuba da lista de países que apoiam o terrorismo, elaborada pelo departamento de Estado. "Não acho que precisaremos de uma outra reunião", afirmou a secretária de Estado adjunta, Roberta Jacobson, após o encontro de diplomatas das duas nações em Washington, nos dias 21 e 22 de maio. Jornalistas da imprensa oficial cubana participaram pela primeira vez, no dia 21 de maio, da entrevista coletiva diária da Casa Branca, que lhes deu as boas-vindas.
A embaixada norte-americana em Havana só terá de mudar de nome, deixando de ser a "seção de interesses norte-americanos" (Sina em espanhol, Usint em inglês), que teoricamente depende da embaixada da Suíça. O imponente prédio de sete andares ainda se encontra no Malecón, o quebra-mar. Na entrada principal, uma placa lembra a data de sua inauguração, em 1953.
O edifício moderno e elegante é obra do escritório de arquitetura Harrison&Abramovitz, de Nova York. Do lado de fora, há policiais cubanos posicionados a cada dez metros, numerosos o suficiente para dissuadir os curiosos de passagem. Nesse dia, eles não estavam pedindo os documentos dos visitantes, como costumavam fazer antes do degelo entre os dois inimigos da Guerra Fria tropical.

Liberdade de movimentação

Do lado de dentro da Sina, marinheiros norte-americanos de uniforme controlam o acesso, como fazem em qualquer outra embaixada dos Estados Unidos pelo mundo. Uma vez que se passa pelos detectores, o ar-condicionado e o ambiente silencioso exercem seu efeito. O número de funcionários norte-americanos em Havana é reduzido, são cerca de 50 pessoas. Deduzindo a dezena de marinheiros, restam no máximo uns 40 diplomatas.
Os norte-americanos esperam dobrar os efetivos quando os dois governos entrarem em um acordo sobre as regras às quais ambos estarão sujeitos (a reciprocidade é de praxe). A principal questão é a liberdade de movimentação dos diplomatas. Toda viagem para fora de Havana, até o momento, está sujeita a uma autorização prévia, mesmo para uma viagem turística de um final de semana. Os diplomatas querem menos vigilância: "Na embaixada russa, um único policial faz a guarda", observam.
Além dos norte-americanos, 300 cubanos trabalham na Sina, com uma grande ressalva: eles não são contratados livremente pelos diplomatas, mas sim mantidos e dependentes de um órgão estatal cubano que detém o monopólio da mão-de-obra empregada por estrangeiros, empresas e embaixadas. Essa agência retém a maior parte da remuneração em divisas. Pode-se dizer que há, ao mesmo tempo, um problema de contrato de trabalho e de segurança, tanto nos casos dos países considerados hostis quanto dos aliados.
Nos últimos anos, o confronto entre os dois vizinhos algumas vezes virou rixa. Em 2006, uma tela eletrônica na fachada da Sina, em um andar superior, exibia informações que não agradaram às autoridades cubanas. Elas responderam colocando, bem em frente, uma floresta de mastros e bandeiras para escondê-la. Depois, um "palanque anti-imperialista" recebeu comícios exaltados.
Em frente à Sina, um cartaz com figuras de desenho animado anunciava orgulhosamente: "Senhores imperialistas, não temos medo nenhum de vocês!". Depois de 17 de dezembro de 2014, um pichador astuto transformou a palavra de ordem: "Senhores irmãos da pátria de Lincoln, não os culpamos por nada!". Desde então, o cartaz sumiu.
Apesar das dificuldades, a Sina coloca à disposição dos solicitantes cubanos 23 computadores conectados à internet, artigo raro na ilha, pois a rede é bloqueada pelo governo. Todos os usuários, assim como os visitantes, são fotografados e fichados pela Segurança de Estado cubana, instalada em todo o entorno de maneira mais discreta que os policiais fardados.
Em uma pracinha vizinha se reúnem, desde o comecinho da manhã, todos os dias da semana, os muitos cubanos em busca de um visto ou de um serviço. Normalmente indisciplinados quando se trata de entrar em um ônibus, ali todos esperam pacientemente sua vez, sem tentar se aproveitar da distração do vizinho. A multidão é heterogênea, composta por pessoas de todas as idades, condições e cores de pele, e descontraída, sem medo. Os jovens às vezes são discretos, pois estão tentando mudar de país definitivamente.
"Eu vim de Matanzas para pegar o visto da minha mãe, que vai uma vez por ano para a Flórida visitar a família", conta uma dona-de-casa de quarenta e poucos anos. E a espera é longa? "Faz cinco horas que estou esperando, mas estou quase lá", ela diz aliviada, mesmo fazendo 30ºC à sombra. Para todos aqueles ao seu redor, a normalização das relações com os Estados Unidos deverá simplificar as burocracias.
O bairro vive em harmonia com essas milhares de pessoas que procuram um visto de turista ou se reunir com a família. "Preenchemos formulários e tiramos fotos para o passaporte", dizem cartazes que podem ser vistos espalhados por toda a área, nas janelas dos apartamentos, nas portas das casas, nas garagens e nas lojas. Assim, um equipamento mínimo e uma conexão à internet, lícita ou não, vão dando lucro aos muitos espectadores dessa feira de partidas que não se esvazia nunca.

Aquecimento

A cota de imigrantes admitida pelos norte-americanos é de somente 20 mil por ano, um número insuficiente para satisfazer a demanda de expatriação, que vem sobretudo de jovens cubanos. O anúncio de Obama e de Castro provocou um aquecimento entre as agências de viagens, uma renovada curiosidade entre os turistas estrangeiros, mas não um aumento de pedidos de visto norte-americano pelos cubanos. Em compensação, o que provocou uma corrida até a sede da Sina foi a eliminação das restrições de viagem por parte de Havana, no início de 2013. Antes, uma autorização de saída do território deveria ser negociada com muito esforço, e agora o passaporte já é o suficiente.
No entanto, muitos temem que a normalização entre as duas nações vá acabar com as facilidades concedidas aos cubanos que se apresentam nas fronteiras dos Estados Unidos (a chamada lei "de ajuste" de 1996, considerada um respiro para os imigrantes). Além disso, a emigração ilegal continua, sobretudo através do México. Algumas fontes falam, sob anonimato, que existe um verdadeiro tráfico de pessoas por meio da costa sul da ilha, chegando em 2014 a 14 mil indivíduos. Seria a polícia de fronteira cubana cega ou cúmplice?

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