Frankenstein tem conserto
Elio Gaspari - FSP
A reforma política afunilou, melhorou, piorou, demorará e, por incrível que pareça, pode até terminar bem
A reforma política que a Câmara mandará ao Senado ainda é uma criança e
pode até acabar bem. Entendendo-se que o Congresso é um Poder da
República e não uma assessoria, o que os deputados decidiram pode não
agradar, mas reflete uma vontade. Se falta consenso, consenso falta. As
matérias aprovadas irão ao Senado, e o que for mudado voltará à Câmara.
Sepultou-se o sonho petista do voto de lista. Parece pouco, mas ele
quase foi instituído em 2007. Tudo indica que começará a acabar a
reeleição. Na essência, fica tudo mais ou menos como está.
Restam dois espinhos: o financiamento encapuzado de candidatos por meio
de doações de empresas a partidos e a proliferação de siglas amarradas
às tetas do Fundo Partidário. O primeiro pode ser resolvido na
regulamentação. O segundo é mais difícil, mas pode-se restabelecer uma
clausula de barreira séria, negando sobrevivência aos partidos que não
tiverem 5% dos votos nacionais e 3% dos votos em nove Estados. Isso já
foi aprovado pelo Congresso e quem liberou geral foi o STF.
Eremildo, o idiota
Eremildo é um idiota e à noite joga bola no Aterro do Flamengo.
Estranhou quando o presidente da Fifa, Joseph Blatter, disse que as
prisões de José Maria Marin e outros sete cartolas "jogaram uma longa
sombra no futebol".
O idiota acha que a sombra não caiu sobre o futebol, mas sobre Blatter e
a Fifa. O futebol nada tem a ver com isso. Se Blatter tivesse feito o
que devia em 2012, quando foram descobertas as roubalheiras, Marin não
estaria na Comissão Organizadora da Fifa e o atual presidente da CBF,
Marco Polo Del Nero, não precisaria ter voltado às pressas para o
Brasil.
Eremildo acha que a doutora Dilma nunca fez nada de errado e viu no
episódio mais uma prova de que ela é infalível. A doutora nunca foi com a
cara de Blatter, da Fifa e de Marin.
A CBF e Marin
Se a CBF do doutor Marco Polo Del Nero realmente não queria prejulgar o
antecessor José Maria Marin, não deveria ter retirado o nome dele da sua
sede. Vale lembrar que Marin herdou de seu antecessor, Ricardo
Teixeira, um jato de 18 lugares e um helicóptero Agusta de US$ 14
milhões.
Marin e Del Nero moram em São Paulo e a CBF tem sede no Rio. O Agusta
era usado como equipamento de mobilidade urbana pela dupla.
CPI da CBF
O Senado criou uma CPI para investigar as roubalheiras dos cartolas e da CBF. Como diz a porta do inferno:
"Deixai toda esperança, vós que entrais".
EDUARDO CUNHA
Alguém precisa avisar ao deputado Eduardo Cunha que falar tapando a boca é falta de educação.
Se não for coisa pior.
RECORDAR É VIVER
Empresários da indústria automotiva estão mobilizados para preservar as desonerações tributárias que os beneficiam.
O livro "A Capital da Vertigem", no qual o jornalista Roberto Pompeu de
Toledo conta a história de São Paulo de 1900 a 1954, traz uma notável
revelação. O andar de cima não gosta de pagar impostos e hostiliza
quaisquer tributos sobre veículos automotivos desde 1901, quando talvez
só houvesse dois na cidade.
O primeiro documento que trata da existência de um automóvel em São
Paulo é uma petição de Henrique Santos Dumont (irmão do Pai da Aviação)
pedindo que fosse desonerado de pagar imposto sobre seu "automobile",
pois a manutenção do veículo era cara e as ruas, péssimas.
O pedido foi negado, mas a luta continua.
A DONA DA FACA
O comissário Aldemir Bendine, presidente da Petrobras, passou um fim de
semana trancado num hotel de Angra com diretores da empresa.
Na sua equipe a dona da faca é Solange da Silva Guedes, diretora de
Exploração e Produção. Com mais de trinta anos na empresa, sua marca tem
sido a defesa de cortes em projetos, iniciativas e, sobretudo, na
parolagem.
Em 2009 criou-se na Petrobras uma girafa chamada de Grupo de Análise de
Projetos. Era formada por uma pequena equipe, com alta participação de
pessoas estranhas aos quadros da empresa e foi encarregada de
centralizar todas as informações sobre os principais projetos em
andamento. Em 2012 Solange da Silva Guedes fechou a quitanda.
A "BOSTA SECA" AMEAÇA A LAVA JATO
Se o Ministério Público aplicar a "teoria da bosta seca" aos conflitos
existentes nos depoimentos de réus confessos da Lava Jato, aquilo que
hoje é uma investigação arrisca virar uma pizza. Bosta seca "é o tipo de
coisa que quanto mais mexe, pior fica": "Mexeu, fedeu".
A opção do Ministério Público pela teoria da bosta foi revelada pela
repórter Sonia Racy, expondo diálogos ocorridos durante um depoimento do
operador Alberto Youssef, preservado em vídeo. O procurador Andrey
Borges mencionou a Youssef que havia contradições entre a sua narrativa e
a do "amigo Paulinho". O ex-diretor da Petrobras mencionara transações
que envolviam pedidos de pagamentos de R$ 2 milhões para as campanhas da
doutora Dilma em 2014 e de Roseana Sarney no Maranhão, em 2010. Ele
teria encaminhado a Youssef os pleitos, trazidos pelo ex-ministro
Antonio Palocci e pelo senador Edison Lobão.
Youssef diz que esses pedidos não aconteceram e ofereceu-se para uma
acareação com "Paulinho". Um dos dois está mentindo e ambos assinaram
acordos que caducam caso sejam apanhados em patranhas. Não se conhece a
identidade da pessoa que expôs a doutrina da bosta seca, não querendo
mexer no assunto. Pode ter sido um procurador e é impossível que tenha
sido um transeunte. Passaram-se vários dias, o dono da voz não foi
identificado e não se anunciou a acareação.
Desde o início da Lava Jato, tudo o que os larápios precisam é de um
tumulto no inquérito. Eles sabem o que fizeram. Só um louco poderia
esperar por uma absolvição na primeira instância. Tudo o que se precisa é
intoxicar o processo. Numa variante da lição de Neném Prancha ("chuta
pra cima que enquanto estiver no céu não é gol"), trata-se de transferir
a disputa para as instâncias superiores do Judiciário, reduzindo a
questão genérica a tecnicalidades processuais. Foi assim que a Operação
Castelo de Areia virou pó no STJ e no Supremo Tribunal. O banqueiro
Edemar Cid Ferreira, condenado a 21 anos de prisão pela quebra do Banco
Santos em 2006, teve sua sentença anulada pelo Tribunal Regional
Federal.
A doutrina da bosta seca é tóxica. Baseado num vídeo da Polícia Federal,
o Ministério Público pediu e obteve a prorrogação da prisão de Marice,
cunhada de João Vaccari. Erro: a gravação mostrava Giselda, irmã da
senhora. A vida é arte, errar faz parte, mas a demora na condenação da
doutrina da bosta seca e na identificação do seu formulador é mais que
um detalhe. Edemar Cid Ferreira esperou nove anos, mas anulou sua
condenação.
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