O desmonte da Universidade pública
Radicalização de grupos de estudantes e o
ativismo sindical de funcionários têm contribuído para tumultuar os
campi, onde o ensino passa a ficar em segundo plano
O Globo
Não fosse suficiente a crise de qualidade enraizada no ensino básico, a
Universidade pública passa por uma fase de turbulência, a qual a falta
de recursos em função da crise fiscal do Estado não explica por inteiro.
A degradação educacional brasileira tende a fechar o círculo: vai da
falta de creches ao ensino superior precário.
A alegada escassez de recursos aparece apenas na superfície de uma
fase de conflitos, muitas vezes violentos, entre reitoria, professores,
alunos e servidores, alimentados por muita politização radical e
sindicalização de atividades secundárias nos campi, mas que afetam a
própria finalidade dos estabelecimentos: a formação de profissionais de
alto nível, sem os quais nenhum país eleva seu estágio de
desenvolvimento.
A depredação, na noite de quinta-feira, do campus da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro (Uerj), com a participação de estudantes e
pessoas que resistiam à remoção de parte de uma favela próxima, retrata
este momento da crise do ensino superior financiado pelo contribuinte.
Foi iniciado também na quinta um movimento de greves nas universidade
federais. O sindicato nacional de docentes (Andes—SN) contabilizou
paralisações em 18 instituições, distribuídas em 12 estados. Movimento
que o novo ministro da Educação, Renato Janine Ribeiro, critica porque,
segundo ele, não foi dada chance para negociações. Parece que é mais
forte a motivação política das paralisações, outro sintoma da
radicalização nos campi.
O
fenômeno não é novo. Há tempos, a Universidade de São Paulo (USP), a
instituição de ensino superior brasileira mais bem colocada em rankings
mundiais, tem enfrentado sérias dificuldades devido a esta exacerbação
de grupos de alunos e sindicatos de servidores.
Mal administrada, a USP estourou a folha de salários. Por isso, está
em fase de ajuste, o que alimenta a radicalização. Em artigo ontem na
“Folha de S.Paulo”, o professor Francisco Carlos Palomanes, do curso de
História, relatou as dificuldades para conseguir dar aula. A tendência é
a universidade cair nas avaliações internacionais.
A banalização da greve nos campi levou, por sua vez, o professor da
UFF, também de História, Daniel Aarão Reis a criticar publicamente esses
movimentos. Insuspeito perante a esquerda, participante da chamada luta
armada, preso político, Daniel, em entrevista ao GLOBO, de que é
articulista, destacou a absoluta falta de representatividade das
assembleias que decretam essas greves. Nas quais os maiores prejudicados
são os estudantes da graduação.
Mas como parece haver outra e delirante agenda para esses grupos que
infestam os campi, a ebulição continua. Vozes sensatas como a dos dois
professores não devem ser minoritárias entre o corpo docente. Porém,
falta mobilização política daqueles que entendem qual o papel da
Universidade. Enquanto isso não ocorrer, o ensino superior público corre
sérios riscos.
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