Alan Schwarz - NYT
T.J. Kirkpatrick/The New York Times
Os efeitos do spice à saúde
foram ressaltados nos últimos meses por um aumento de visitas aos
pronto-socorros e ligações para centros de emergência, por sintomas que
podem incluir ansiedade extrema, comportamento violento e alucinações
Um grande número de passageiros desembarcou de um voo proveniente da
China no Aeroporto Internacional de Los Angeles, em março. Mas um
passageiro, um químico chinês de 33 anos, nunca chegou à esteira de
bagagens.
O passageiro, Haijun Tian, foi preso no aeroporto pelos agentes da DEA
(agência de combate às drogas dos Estados Unidos), o prêmio no final de
uma operação elaborada visando impedir a importação e venda de spice, o
nome de rua de uma família de drogas sintéticas que parecem maconha e
são borrifadas com uma perigosa substância química alucinógena, depois
fumadas.Tian é um dos principais fabricantes e exportadores dos produtos químicos usados na produção do spice, diz a DEA, e a prisão dele ressalta a crescente preocupação de que a China, com seu setor farmacêutico imenso e mal regulado, possa se tornar para o spice o que a Colômbia e o Peru foram para a cocaína, ou o Afeganistão para a heroína.
As autoridades esperam que a informação que extraíram de Tian forneça uma janela para o nebuloso submundo internacional das drogas, onde os fabricantes manipulam prontamente substâncias químicas usadas para produzir o spice e outras chamadas drogas sintéticas, mantendo-se um passo à frente dos reguladores federais que lutam para identificá-las e proibi-las.
"Há uma ilusão de legalidade", disse Scott Albrecht, um agente especial do escritório distrital da DEA em Milwaukee, que supervisionou a investigação de Tian depois que os agentes o associaram a pacotes enviados para um endereço daqui. "Nós tornamos uma coisa ilegal e eles simplesmente passam para outra."
O caso de Tian é particularmente significativo, não apenas porque a DEA o considera um grande exportador de spice, mas também porque os fabricantes chineses de drogas sintéticas raramente vêm aos Estados Unidos. Mas Tian viajou para Los Angeles depois que um grande cliente dele se tornou um informante confidencial da DEA. O informante, que não foi identificado, disse aos investigadores que 70% do spice vendido nos Estados Unidos eram produzidos com substâncias químicas provenientes do laboratório chinês de Tian. A localização desse laboratório não foi revelada.
Os advogados de Tian se recusaram a comentar o caso antes de seu julgamento, marcado para começar em julho em um tribunal federal em Milwaukee.
Apesar do uso do spice ter diminuído nos últimos anos, segundo alguns levantamentos, a droga continua a ser vendida nas ruas, assim como abertamente pela Internet e em lojas de maconha e outras do varejo, em forma de pot-pourri ou incenso com nomes de marca como Scooby Snax e Black Diamond.
Os efeitos do spice à saúde foram ressaltados nos últimos meses por um aumento de visitas aos pronto-socorros e ligações para centros de emergência, por sintomas que podem incluir ansiedade extrema, comportamento violento e alucinações. Relatos de vários Estados sugerem que pelo menos 1.000 americanos já morreram desde 2009 por fumar spice. Mas os Centros para Controle e Prevenção de Doenças (CDC) não monitoram os dados nacionais para spice ou outras drogas sintéticas, incluindo as popularmente conhecidas como sais de banho ou flakka.
"Há um afluxo constante dessas novas drogas sintéticas e os exames toxicológicos não conseguem acompanhar", disse Ron Flegel, um toxicologista forense da Administração de Serviços de Saúde Mental e Abuso de Substâncias. "Você pode dizer o nível de ingestão de oxicodona por alguém, mas geralmente não de sintéticos."
Assim que são criadas nos laboratórios chineses, as substâncias químicas do spice são enviadas em forma de pó, em pacotes rotulados como fertilizante ou solventes industriais, por meio de transportadoras comerciais para atacadistas nos Estados Unidos. Esses atacadistas liquefazem o pó em acetona ou álcool, aplicam o líquido em um material vegetal que pode ser fumado e embalam a mistura em bolsas metálicas.
Os produtores de spice são conhecidos por preparar a mistura em cochos de alimentação animal, misturadores de cimento e em lonas no quintal. O produto embalado, frequentemente rotulado de "Impróprio para consumo humano", não é submetido a nenhum teste de segurança e já foi encontrado contaminado por outras substâncias químicas, fungos e bolor.
A facilidade com que os produtores de drogas sintéticas modificam a forma molecular de seus produtos químicos representa um desafio para as autoridades. A lei federal proíbe ligeiras variações de substâncias controladas, chamadas análogas, mas com mais de 400 variedades de canabinoides disponíveis, disseram as autoridades da DEA, e novas surgindo semanalmente, os promotores têm encontrado casos difíceis de provar.
"A cocaína é ilegal assim que você a coloca na mesa", disse Albrecht. "Aqui, trata-se de um tipo diferente de traficante –eles olham você nos olhos e lhe dizem o motivo para o produto deles ser legal, em vez de tentar lhe dizer que não têm nada a ver com aquilo."
Por serem incapazes de processar os cidadãos chineses conhecidos por criar e exportar spice, as autoridades americanas passaram a se concentrar em perseguir os atacadistas nos Estados Unidos. Desde o início do ano passado, segundo a DEA, essas operações resultaram na apreensão de 19 toneladas de spice embalada e matéria-prima para criação de mais 5 toneladas, com um valor combinado de rua estimado em centenas de milhões de dólares.
A ligação do spice com a China costuma ser uma surpresa para as famílias de centenas de jovens cujas mortes são atribuídas à substância. Depois que Phil Sisneros, 22, morreu em maio passado depois de fumar uma forma de spice, sua mãe, Elizabeth Manning, checou o notebook dele e encontrou trocas de e-mails com empresas na China, sugerindo que ele estava comprando as substâncias químicas diretamente e produzindo o seu próprio spice.
"Ele conseguiu da mesma forma que você entra online e compra um livro", disse Manning, que vive em Albuquerque. "Você compra algo, mas não sabe o que é e pode ser venenoso."
Enquanto Tian aguarda julgamento na Cadeia do Condado de Kenosha, a uma hora ao norte, em Milwaukee, bolsas reluzentes de ervas continuam sendo vendidas em várias lojas de maconha. Em uma loja, quando lhe foi pedido por algo inquestionavelmente legal, uma balconista estendeu a mão sob o balcão e pegou uma bolsa de 10 gramas de um "novo" pot-pourri, Black Diamond. No verso da embalagem de US$ 48 estava escrito: "Este produto está de acordo com toda a legislação federal e estadual".
"Não é para consumo humano", ela disse.
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