João Luiz Mauad, - Instituto Liberal
Recebi ontem a seguinte mensagem do
leitor Alex, preocupado com as más influências sobre sua filha,
atualmente cursando a faculdade:
“Eu tenho uma filha de 20 anos, ela
esta fazendo química na UFESP, tenho procurado mostrar a ela os valores
das ideias liberais, mas sinto que tenho perdido essa batalha, acho que
ela tem sido bombardeada por ideias socialistas e acho que tem sido ou
da faculdade ou de alguns de seus amigos. Não sei como neutralizar essa
influência, ou garantir que ela consiga raciocinar com equilíbrio e
sensatez. Vocês poderiam me ajudar?”
Em primeiro lugar, eu diria que esse
“bombardeio” é normal, não só na faculdade, mas também nos bancos
escolares, desde a mais tenra idade. Infelizmente, o ensino brasileiro
está eivado de proselitismo ideológico. O importante é que a família
nunca perca o diálogo com esses jovens, e tente mostrar, sempre que
possível, o outro lado da história. Por mais que às vezes seja difícil,
isso deve ser feito sem confronto, de forma calma e paulatina. Não
adianta achar que com apenas uma conversa você irá conseguir reverter
anos de doutrinação. É preciso paciência e perseverança.
Durante a juventude somos quase todos
grandes idealistas e achamos que o mundo pode ser mudado (e moldado) de
acordo com a vontade dos bem intencionados. Este é o grande apelo das
teorias revolucionárias com adolescentes e jovens em geral. Eles
costumam acreditar com unhas e dentes em velhos clichês socialistas,
como “um outro mundo é possível” ou “de cada um conforme as suas
capacidades, para cada um conforme as suas necessidades”.
Tendo isso em vista, é importante tentar
demonstrar que, se utopias baseadas no altruísmo nunca deram certo, é
porque vão de encontro à natureza humana, calcada muito mais no
interesse próprio do que no altruísmo, uma virtude que, embora desejável
em qualquer sociedade, jamais pode ser imposta de cima para baixo.
Por outro lado, a grande beleza do
capitalismo está no fato de que os indivíduos só são recompensados
quando satisfazem as demandas dos outros, ainda que isso seja feito
exclusivamente visando aos próprios interesses. Minha renda, portanto,
está diretamente ligada à satisfação do meu semelhante. O capitalismo
não pretende extinguir o egoísmo inerente à condição humana, mas nos
obriga a pensar nas demandas do próximo, se quisermos ser bem sucedidos.
Para explicar esse poder misterioso que
leva os homens, cada qual trabalhando exclusivamente em busca do próprio
ganho, a promover o interesse de muitos, Adam Smith cunhou a famosa
metáfora da “mão invisível”.
Segundo ele, se cada consumidor puder escolher livremente o que comprar
e cada produtor escolher o que e como produzir, esse “jogo de
interesses” será capaz de maximizar a produção e distribuição de bens e
serviços, em benefício de todos.
Outro argumento importantíssimo, que deve
ser sempre levantado, é a História do ser humano através dos tempos, e
como essa verdadeira odisseia foi radicalmente alterada com o advento do
capitalismo.
Por milhares de anos, quase todo ser
humano viveu em estado de absoluta pobreza. Durante a maior parte da
existência humana, a vida foi assustadoramente carente e precária.
Faltava tudo, desde o pão, até a saúde. A palavra conforto não fazia
parte do vocabulário de 99,9% dos homens. A expectativa de vida, nos
primórdios do Império Romano era de menos de 30 anos, e permaneceu assim
até o final do século XVIII.
A renda média, durante milênios, foi
menor que US$ 900 por ano, a valores atuais. As pessoas mais ricas e
poderosas do mundo viam suas crianças morrerem antes da idade adulta,
não raro vítimas de infecções simples. Eles mesmos nem sempre podiam
desfrutar de água fresca e limpa, ou de qualquer um dos milhares de
produtos e serviços aos quais até os brasileiros mais pobres têm acesso
hoje dia.
Como escrevi alhures,
o lugar mais avançado do mundo no século XVIII era Londres. No entanto,
o cotidiano da capital inglesa naquela época era terrível,
principalmente quando comparado aos padrões atuais, a começar pelo meio
ambiente. Segundo Liza Picard,
as ruas de Londres eram nojentas. Por onde se andasse, havia uma
mistura abundante e licorosa de esterco animal, gatos e cachorros
mortos, cinzas, palha e excrementos humanos.
O fornecimento de água era contaminado
com chumbo, matéria orgânica apodrecida e lixo variado. Imagine o grau
de desconforto num lugar onde velas e sabonetes eram dois dos itens mais
caros do orçamento familiar, a ponto de os chamados “fins de velas”
serem produto altamente cobiçado no mercado negro.
A vida profissional começava
bem cedo, e a limpeza de chaminés era um dos trabalhos para os quais as
crianças eram escaladas com maior freqüência, até mesmo quando a
chaminé encontrava-se em chamas.
Muitos evitavam qualquer tipo
de tratamento médico, pois o estado da medicina era tal que a tentativa
de cura era muitas vezes pior que a própria doença. Não seria exagero,
portanto, dizer que até para a realeza a vida era “pobre, sórdida,
brutal e curta”, para usar a famosa expressão do filósofo Thomas Hobbes.
A partir de meados do século
XVIII, porém, teve início uma revolução extraordinária na história da
humanidade. No curto espaço de 250 anos, a população mundial aumentou
mais de sete vezes e, apesar desse enorme crescimento demográfico, a
renda real per capita cresceu 16 vezes. No mesmo período, a expectativa
de vida mais que dobrou.
O que explica essa verdadeira revolução?
Sem dúvida, o nascimento e evolução do que posteriormente se
convencionou chamar de “capitalismo”. Sim, a principal mudança econômica
e social dos últimos 250 anos de História foi a introdução e o
desenvolvimento das chamadas instituições capitalistas, particularmente
a propriedade privada, os mercados livres e o império da lei.
Sim, foi graças ao capitalismo liberal –
um sistema que nasceu e evoluiu espontaneamente, e não foi parido da
mente fértil de algum iluminado – que a imensa maioria dos nossos
contemporâneos goza hoje de um padrão de vida bem acima do que, há
apenas poucas gerações, era impossível até aos mais abastados.
Se eu fosse o Alex, convidaria sua filha a
pensar nas maravilhas tecnológicas criadas pelo engenho humano no
último par de séculos. Pensar nos automóveis, locomotivas, navios e
aviões que facilitaram os deslocamentos humanos, bem como de suas
mercadorias. Pensar nos eletroeletrônicos que facilitam e entretêm
bilhões de pessoas mundo afora: geladeiras, televisores, máquinas de
lavar, microondas, condicionadores de ar, computadores, telefones
celulares. Pensar nos equipamentos médico-hospitalares, que ajudam a
tornar a medicina muito mais eficiente e prática, como tomógrafos,
centrífugas, aparelhos de ultra-sonografia, de ressonância magnética,
microscópios eletrônicos, micro-chips, marca-passos. Pensar na indústria
farmacêutica, nos avanços e nas descobertas frequentes que ela faz.
Pensar, por exemplo, que, há apenas vinte e poucos anos, a maior parte
dos doentes com úlcera gástrica terminava numa mesa de operações e que
hoje essa é uma doença facilmente tratável com medicamentos. Pensar na
agricultura e nos avanços de produtividade dessa área, que permitem
alimentar um contingente humano que cresceu de forma geométrica nos
últimos duzentos e poucos anos, contradizendo as previsões catastróficas
de Malthus e muitos de seus seguidores.
Pois bem, esses avanços, e toda a
fantástica geração de riquezas conseguida pelo homem, foram obtidos
graças à divisão e especialização do trabalho e, acima de tudo, às
instituições capitalistas. Sem isso, talvez 99% da população ainda
precisasse trabalhar de sol a sol, morando sem qualquer conforto,
sujeitos a condições extremas de insalubridade e impedidos de qualquer
outra atividade na vida que não trabalhar, comer e dormir.
Sem a recompensa pessoal, seja ela fruto
da remuneração do trabalho ou do capital (lucro) não há incentivo para
que os indivíduos produzam, invistam, pesquisem, desenvolvam novas
tecnologias, criem novos produtos. Analise a relação de ganhadores do
Prêmio Nobel (inclusive os de química). Onde está (ou esteve)
domiciliada a imensa maioria deles? Sem dúvida, em países onde há
liberdade econômica e, consequentemente, a busca pela recompensa
pessoal. Será que isso acontece por mero acaso?
Por outro lado, não se tem notícia de
qualquer bem de consumo criado no seio das economias coletivistas (ditas
altruístas) que tenha trazido algum benefício permanente para a
humanidade. Com exceção das máquinas de guerra, das armas de destruição
em massa, nada de relevante eles produziram. Para piorar as coisas,
esses mesmos experimentos de planificação econômica, passados e atuais,
em que os tiranos a tudo controlam, o processo de marcado é quase
inexistente e o lucro individual proibido, redundaram sempre na
escassez, no desabastecimento e na distribuição equitativa da pobreza.
O socialismo pode ser muito bonito no
papel, mas na prática mostrou-se um grande desastre. Talvez a maior
prova disso seja o fato de que jamais se viu um só indivíduo tentando
fugir de Miami para viver no paraíso cubano. No entanto, milhares
arriscaram suas vidas nos últimos 60 anos tentando fazer o caminho
contrário, fugindo da igualdade forçada, em busca de liberdade e de um
padrão de vida melhor, ainda que arriscado. Novamente: será que isso
aconteceu por acaso?
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