Ainda à deriva
Política econômica parece ter parado de piorar, mas não se nota a
organização de uma agenda capaz de evitar danos piores e crise mais
aguda
FSP
A velocidade com que a economia se deteriorou nos últimos meses
atropelou a estratégia do governo Dilma Rousseff (PT). Se o Ministério
da Fazenda já havia jogado a toalha em relação à meta de poupança nas
contas públicas, agora o Banco Central reconheceu que, dado o quadro
recessivo, não poderá manter a alta dos juros.
Com a elevação da Selic para 14,25%, o BC deu por encerrado o ciclo de
aperto monetário, mesmo sem ter obtido a convergência das expectativas
de inflação para a meta de 4,5% em 2016 –a projeção atual é de 5,4%.
Foi uma decisão correta, tendo em vista que as estimativas de queda do
PIB para 2015 se aproximam de 2%; um número crescente de analistas,
ademais, conta com retração também no ano que vem. Nesse ambiente, faz
sentido aceitar um recuo mais lento da inflação.
Em termos mais gerais, o governo errou de forma grosseira ao apostar na
repetição da fórmula utilizada em 2003, quando a adoção de uma política
ortodoxa de corte de gastos e aumento de juros afastou o pessimismo e
ajudou o país a crescer 5,7% em 2004.
Desta vez, porém, os problemas são bem maiores. O governo registrou
inédito deficit de R$ 9,8 bilhões no primeiro semestre (antes dos
estratosféricos desembolsos com juros), apesar do maior
contingenciamento de gastos de que se tem notícia –R$ 78 bilhões até
agora.
Mesmo a meta de economia reduzida para R$ 8,7 bilhões (0,15% do PIB) em
2015 depende de receitas extraordinárias pouco prováveis.
Não resta dúvida de que o aperto orçamentário será insuficiente. Há um
desequilíbrio estrutural entre receitas (em queda, por causa da
recessão, mas não só por isso) e despesas (sempre crescentes).
Não será possível estabilizar a dívida sem mudanças mais profundas nos
gastos obrigatórios –incluindo benefícios sociais e uma ampla gama de
subsídios– e aumentos de impostos.
Quanto à inflação, o BC fez o possível. Ao contrário dos últimos anos,
manteve firme a tentativa de conter os preços. Se não atingir os
prometidos 4,5% em 2016, há boas chances de isso ocorrer em 2017.
Pelo menos há uma boa notícia: a política econômica está no rumo
correto. Mas o ajuste necessário é duro, impopular e demandará tempo
para render frutos. Até agora não se nota a organização de agenda mínima
capaz de evitar danos piores e crise mais aguda.
Um primeiro passo seria Dilma Rousseff apresentar um diagnóstico honesto
dos problemas e, em nome de um consenso, abandonar todo oportunismo
eleitoral. Improvável, é claro; mas, sem isso, o ambiente político não
desanuviará –e o país continuará à deriva.
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