Viés ideológico explica fracasso de leilão
Planalto insiste em tabelar lucro de
concessionários e, assim, afasta pretendentes a linhas de transmissão.
Isso quando é crucial elevar os investimentos
O Globo
Se em condições normais os investidores precisam contar com um
ambiente institucional que os estimule a executar projetos, numa
situação de grave e paralisante crise econômica e política como a
brasileira, mais ainda. Porém, o desfecho negativo do leilão de linhas
de transmissão de energia feito na quarta-feira aponta para o contrário.
Infelizmente.
A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) colocou em licitação
11 lotes, dos quais apenas quatro foram arrematados, com um deságio
médio baixo, de 2,04%, reflexo do número pequeno de interessados. Será
investido R$ 1,4 bilhão, só 19% do que o governo esperava com as
ofertas.
Há explicações variadas para o fracasso. O dólar em alta, a redução
da atratividade dos financiamentos do BNDES, incertezas econômicas e
políticas generalizadas. Mas no centro da questão está o tabelamento da
taxa de lucro dos concessionários que o governo insiste em fazer, um
viés claramente anticapitalista do Planalto.
Para
este leilão, a burocracia de Brasília, a fim de torná-lo mais atraente,
elevou a margem de retorno de 5,5% para entre 7,63% e 7,86%. Em vão.
Parênteses: por que as casas decimais, não se sabe. O fato é que a
cultura intervencionista do governo resolveu continuar a tabelar o lucro
em licitações e, desta vez, fixou percentuais pouco atraentes.
A ojeriza às leis de mercado já causou vários prejuízos ao país
nestes quase 13 anos de PT no Planalto. Quando Lula, no segundo governo,
não pôde fugir aos leilões de rodovias, desenvolveu um modelo de
“populismo tarifário”: ganha quem cobrar o menor pedágio. Serviu para
inspirar discursos de palanque, e só. Porque, como esperado, empresas
vencedoras daqueles leilões deixaram de executar as obras prometidas.
Outro equívoco de fundo ideológico ocorre na privatização de
aeroportos, além da demora do governo em fazer o óbvio: tirar a Infraero
da área. O Palácio faz o possível para dar sobrevida à estatal, um
custoso cabide de empregos, um símbolo da ineficiência estatal. Forçou
para que a Infraero tivesse uma participação razoável nos consórcios que
disputariam os primeiros terminais, mas, agora, devido à crise fiscal, a
estatal deverá ser obrigada a leiloar essas participações. Perdem-se
tempo e dinheiro do contribuinte ao se manter a Infraero respirando por
aparelhos.
O discurso oficial do Planalto é que, de fato, é necessário atrair
capital privado para modernizar e ampliar a precária infraestrutura do
país, um dos mais apertados gargalos que atravancam o sistema produtivo.
Mas é preciso colocar em prática o discurso, e se vacinar contra a
ideia entranhada na cabeça de alguns em Brasília de que lucro é pecado,
algo entre o medievalismo e o sectarismo religioso do Estado Islâmico.
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