sexta-feira, 24 de abril de 2015

Investigação revela novos suspeitos de apoiar autores de ataque ao "Charlie"
Investigadores suspeitam que vários indivíduos tenham ajudado o assassino do Hyper Cacher a obter armas
Elise Vincent - Le Monde
Quase quatro meses após os atentados de Paris, nos dias 7 e 9 de janeiro, revelou-se que um novo grupo de supostos cúmplices de Amedy Coulibaly e dos irmãos Kouachi está sendo investigado. Logo após os ataques do "Charlie Hebdo" e do Hyper Cacher, foram identificados suspeitos, da periferia, que ajudaram Amedy Coulibaly a conseguir coletes táticos, facas, luvas e um arma 'taser'. Mas um segundo círculo de "terceirizados" pode ter tido um papel ainda mais sério no apoio logístico ao assassino do Hyper Cacher.
Agora são sete homens indiciados e em detenção provisória por formação de quadrilha em associação com uma organização terrorista. Os primeiros a terem sido interpelados, em meados de janeiro, se chamam Willy P. (28 anos), Christophe R. (25 anos), Tonino G. (22 anos) e Nezar A. (30 anos). Dois outros foram interrogados em meados de março --Amar R. (33 anos) e Said M. (25 anos)--, e um último no final de março, Ali Riza P. (30 anos).
A meada das responsabilidades de cada um é difícil de destrinçar. Mas depois de fazerem audições e análises técnicas, os investigadores suspeitam que estes tenham ajudado Amedy Coulibaly a obter as armas das quais ele precisava, armas que este poderia ter dado aos irmãos Kouachi.
Amar R. é um desses homens do segundo círculo que mais intrigam a polícia. Esse grande e taciturno franco-argelino foi notado por ter seduzido uma policial do Fort de Rosny [instituto de pesquisa criminal]. Conhecido por tráfico de entorpecentes, posse de armas e agressões diversas, ele foi um dos últimos a ter visto Amedy Coulibaly no dia 6 de janeiro, véspera do ataque ao "Charlie Hebdo".
Naquele dia, os dois vieram a se encontrar pelo menos duas vezes, sendo uma delas por volta das 21h, pouco antes de o assassino do Hyper Cacher fazer uma visita a Chérif Kouachi, por volta de meia-noite, na frente de seu prédio em Gennevilliers (Hauts-de-Seine). Após essa visita, Amar R. e Amedy Coulibaly não tiveram mais contato, sendo que até então eles trocavam em média seis mensagens de celular por dia.
Teria sido assim que Chérif Kouachi conseguiu obter as armas (duas AK-47 e um lança-foguetes) usadas por ele e por seu irmão no dia seguinte? Amar R. alega que seu encontro tardio com Amedy Coulibaly foi motivado por uma "dívida" de 200 euros entre os dois. Além disso, seu DNA foi encontrado em um maço de dinheiro no esconderijo que o assassino do Hyper Cacher havia alugado antes de seu ataque. "Naquele dia, ele me disse que queria ir embora, cair fora, fazer sua hijra (imigração para a terra do islã) (...), mas eu não achava que ele realmente quisesse ir", ele explicou aos investigadores.
Contudo, alguns deslocamentos de Amar R. intrigam a polícia: este efetuou uma dezena de viagens a Reims (Marne) ao longo de 2014. Essa era a cidade onde morava Said Kouachi e de onde ele partiu na manhã de 6 de janeiro antes de fazer uma breve parada na casa de Chérif, na região parisiense, encaminhando-se depois até o "Charlie Hebdo". Essas viagens aconteceram entre julho e outubro de 2014. Amar R. diz que ele fazia essas viagens por causa de "roubos" de carros, uma atividade que ele diz ser seu ganha-pão como outro qualquer, uma vez que está desempregado. Durante uma dessas voltas, seu celular foi acusado nas proximidades da casa de Said Kouachi.

Traço de DNA

Amar R. também tem a particularidade de ser muito próximo da "esfera islâmica radical", segundo o departamento de investigação. Sobretudo de Mohamed Belhoucine, apelidado de "Moha", suspeito de ter partido alguns dias antes dos atentados para a Síria junto com sua esposa e filho, bem como de Hayat Boumeddiene, a companheira de Amedy Coulibaly. Amar R. também era muito amigo de Nezar A., que teve seu DNA encontrado em uma arma que ficou no apartamento de Amedy Coulibaly e também dentro de uma luva usada pelo assassino dentro do Hyper Cacher.
Com o cabelo despenteado e a barba hirsuta, Nezar A. tem um perfil atípico. Ele chegou à religião muçulmana através de sua mãe, seu pai é católico e sua irmã adotou a religião judaica. Ele ganha a vida como mecânico de carros e é conhecido pela Justiça por tráfico de entorpecentes. Foi para ele que Amar R. telefonou pouco antes de seu último encontro com Amedy Coulibaly, na noite de 6 de janeiro. Os investigadores puderam determinar que o assassino do Hyper Cacher tinha ido depois até sua casa em Epinay-sur-Seine (Seine-Saint-Denis). O encontro ocorreu por volta das 23h30, e Nezar A. jura "ter se recusado a abrir a porta".
Todo esse grupinho se conheceu na prisão de Villepinte, entre 2010 e 2014, onde Amedy Coulibaly foi encarcerado depois de ter sido condenado pelo plano de fuga de Smaïn Ait Ali Belkacem, um dos artífices dos atentados de 1995, um caso no qual também fora indiciado Chérif Kouachi, antes de ele ser beneficiado por um indeferimento. Depois de saírem da prisão, eles passaram a se encontrar regularmente, chegando a assistir juntos a vídeos de propaganda jihadista. Amar R., Mohamed Belhoucine e Amedy Coulibaly estavam ainda no pequeno círculo de convidados do casamento de Nezar A., no verão de 2014.

"O bobo da história"

O jovem Said M., motorista de ambulância de profissão, foi o sexto indiciado no inquérito sobre os atentados. Por pelo menos três vezes esse homem grande e robusto acompanhou Amar R., seu primo distante, em viagens até Reims. A principal acusação contra ele foi seu traço de DNA encontrado na correia da arma 'taser' do Hyper Cacher. Said Kouachi também destruiu seu chip de telefone no dia 9 de janeiro, ao mesmo tempo que Amar R., quando soube da tomada de reféns.
E, por fim, Ali Riza P., um franco-turco de 30 anos, originário de Essonne, como Amedy Coulibaly. Ele foi o último do bando a ser interpelado. De origem curda, começou a praticar assiduamente o islamismo em 2014, após uma passagem pela prisão por tráfico de entorpecentes. Por sua corpulência, os investigadores suspeitam que ele seja o "gordo" de "cabelo curto" e "pele escura" com quem teriam se cruzado vários supostos cúmplices de Amedy Coulibaly. Ali Riza P. de fato serviu várias vezes de "motorista" ao assassino do Hyper Cacher, inclusive em trajetos para a Bélgica, em Charleroi, até a casa do mecânico de origem curda que o jovem conhecia.
Esse mecânico curdo aceitou receber um Mini Cooper que Hayat Boumeddiene havia comprado na França com um cartão de crédito fraudado. Os investigadores suspeitam que essa compra tenha sido feita, em parte, em troca de armas. Fui o "bobo da história", se defende Ali Riza P. Segundo ele, alguns anos atrás, Amedy Coulibaly teria lhe dado "alguns quilos de maconha", e ele não conseguiu pagá-lo. Ao sair da prisão, o assassino do Hyper Cacher retomou contato e ele se sentiu em dívida.
Na noite de 6 de janeiro, por volta de 1h30 da manhã, algumas horas antes da chacina no "Charlie Hebdo", Ali Riza P. foi o último a ver Amedy Coulibaly, em uma rua de Montrouge (Hauts-de-Seine). Os investigadores lhe perguntaram se ele lhe havia contado sobre os irmãos Kouachi, e ele lhes respondeu que preferia "manter silêncio".

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