Frédéric Giraut - Le Monde
Pascal Rossignol/Reuters
Marine Le Pen, líder da Frente Nacional, partido de extrema direita na França, deixa cabine de votação nas eleições departamentais de março
A extrema direita xenófoba na França cultiva seu populismo com um discurso simplista sobre o suposto necessário bom senso contra as ideologias. Ela sistematicamente contesta dessa forma toda uma série de iniciativas municipais, departamentais ou regionais por seu caráter internacionalista e intelectual, no domínio cultural e memorial. Sua retórica reacionária muitas vezes se alinha à interpretação proposta pelo economista americano Albert O. Hirschman (1915-2012).
Esse discurso se soma ao da direita promotora da identidade nacional, uma vez que invoca a inutilidade dessas iniciativas culturais. A ele são atribuídos efeitos perversos que contribuiriam para a perda de referências e para o comprometimento de valores essenciais à coesão nacional.
A toponímia, na condição de domínio do simbólico e do ideológico, muitas vezes é remetida, nesse tipo de discurso, à inanidade em relação às verdadeiras questões que seriam aquelas da vida cotidiana local e das necessárias economias a se fazer. Em contextos muito diferentes, muitas vezes foi com esses argumentos que se rejeitaram ou contestaram iniciativas feministas ou internacionalistas que também se revelaram reacionárias nesse domínio.
Em Elne, em Limeil-Brévannes e em Romorantin, nomes femininos homenageando figuras nacionais e internacionais de resistentes ou de feministas, previstos para novas ruas, foram abandonados ou contestados sob diferentes pretextos. Assim, as pessoas preferiram uma rua Canigou a uma rua Rosa Parks ou Olympe de Gouges, em Elne, enquanto que em Limeil-Brévannes, a nova municipalidade voltou em sua decisão em um batismo homenageando essa última figura histórica emblemática para os movimentos feministas, para promover dessa vez outras figuras femininas mais locais; por fim, uma parlamentar da Frente Nacional em Romorantin chamou esse mesmo ícone feminista de "não sognolote" e "espécie de prostituta" para contestar a nomeação de uma avenida com seu nome.
Um espaço perfeito para esse tipo de disputa política reacionária e muito ideológica é o das nomeações com o nome de Nelson Mandela. Estas eram rejeitadas nos anos 1980, pois celebravam um comunista e um terrorista. No Reino Unido, na França e na Holanda, a decisão de rebatizar um lugar como Nelson Mandela conseguiu ser derrubada por novas equipes, bem como em Sartrouville, em 1989.
A extrema direita chegou a intervir espalhafatosamente nesse campo no final dos anos 1990 quando Nelson Mandela, presidente da nova África do Sul e Prêmio Nobel da Paz, já havia adquirido um status de figura internacional de defesa dos direitos humanos e da paz. Assim, a praça Nelson Mandela de Vitrolles se tornou a Place de Provence, enquanto em outro lugar, na cidade governada pelo casal Mégret, uma figura de extrema direita (Jean-Pierre Stirbois) pôde ser homenageada no lugar de uma outra figura pós-colonial como Jean-Marie Tjibaou.
Essas iniciativas reacionárias mexeram os pauzinhos para não poderem ser claramente associadas a motivações racistas ou sexistas, promovendo em contrapartida figuras e símbolos locais e regionais no caso de Vitrolles, e/ou promovendo figuras femininas ou negras no lugar das desbatizadas: Marguerite de Provence no lugar de Dulcie September (a representante assassinada do CNA na França) em Vitrolles; Félix Eboué no lugar de Nelson Mandela em Sartrouville.
A nova onda de parlamentares de extrema direita está sendo levada a se pronunciar sobre as escolhas do nome Nelson Mandela, em um outro contexto que é o de uma homenagem quase universal, inclusive pela direita, de uma figura dos valores democráticos e da defesa dos direitos humanos. Assim, iniciativas nesse sentido dispararam desde o início dos anos 2010 e particularmente a partir do final de 2013, com a morte de Mandela. Às vezes ele é colocado pela direita no mesmo patamar que o co-laureado do prêmio Nobel e ex-dirigente do regime do apartheid Frederik de Klerk, ou pode servir para apagar a memória dos combates de municipalidades comunistas anteriores como em Yerres, onde o nome de Mandela foi dado à ponte de Soweto que homenagearia o mártir dos militantes anti-apartheid na África do Sul, ou em Saint-Cyr, quando o nome de Nelson Mandela foi dado à rua Georges Dimitrov, resistente anti-nazista e primeiro líder do partido comunista búlgaro.
Mas os parlamentares de extrema direita, longe de participarem dessa homenagem que varia de acordo com as circunstâncias ao ícone Mandela, são contrários a ela com uma constância notável. Os argumentos, contudo, variam dependendo de se os parlamentares se alinham com o discurso oficial da direção da Frente Nacional, buscando respeitabilidade, ou se trazem de novo à tona uma natureza muitas vezes presente no local. Assim, desde as eleições municipais de 2014, em Toulon, Lomme, Lyon e Saint-Etienne, os parlamentares da Frente Nacional se recusaram a votar a favor do uso do nome Nelson Mandela para batizar o pátio da nova estação ferroviária, um estabelecimento regional de ensino adaptado (EREA) e duas esplanadas.
Eles usaram como argumento, no primeiro caso, o mau tratamento infligido à memória do general golpista Salan, homenageado em sua época pela prefeitura da Frente Nacional, e nos dois casos seguintes, uma oposição à "internacionalização da cidade", e por fim em Saint-Etienne, eles retomaram a ladainha sobre o caráter comunista e terrorista de Nelson Mandela e sua contribuição somente passiva para o fim do apartheid.
Por fim, em Béziers, o novo prefeito de extrema direita, em um primeiro momento, quis desbatizar a nova escola Nelson Mandela na nova rua Frederik De Klerk, para lhe dar o nome de um poeta occitano que faleceu subitamente, mas depois voltou atrás. Mas longe de abandonar o campo toponímico, a priori tão afastado de seus discursos pragmáticos e anti-ideológicos, ele começou, assim como seus antecessores prefeitos da Frente Nacional dos anos 1990, a apagar a lembrança dos acordos de paz de Evian que selaram a última guerra colonial francesa para homenagear um de seus atores engajados.
Assim, apesar de seu discurso visando deslegitimar a promoção de figuras ideológicas na toponímia, a extrema direita está sempre tentada a impor seu próprio panteão, feito sobretudo de figuras coloniais e singularmente extremistas da Argélia francesa.
Não se deve nunca subestimar a extrema direita, sua natureza e suas referências históricas e ideológicas subjacentes tentam voltar à tona na primeira oportunidade.
Esse discurso se soma ao da direita promotora da identidade nacional, uma vez que invoca a inutilidade dessas iniciativas culturais. A ele são atribuídos efeitos perversos que contribuiriam para a perda de referências e para o comprometimento de valores essenciais à coesão nacional.
A toponímia, na condição de domínio do simbólico e do ideológico, muitas vezes é remetida, nesse tipo de discurso, à inanidade em relação às verdadeiras questões que seriam aquelas da vida cotidiana local e das necessárias economias a se fazer. Em contextos muito diferentes, muitas vezes foi com esses argumentos que se rejeitaram ou contestaram iniciativas feministas ou internacionalistas que também se revelaram reacionárias nesse domínio.
Em Elne, em Limeil-Brévannes e em Romorantin, nomes femininos homenageando figuras nacionais e internacionais de resistentes ou de feministas, previstos para novas ruas, foram abandonados ou contestados sob diferentes pretextos. Assim, as pessoas preferiram uma rua Canigou a uma rua Rosa Parks ou Olympe de Gouges, em Elne, enquanto que em Limeil-Brévannes, a nova municipalidade voltou em sua decisão em um batismo homenageando essa última figura histórica emblemática para os movimentos feministas, para promover dessa vez outras figuras femininas mais locais; por fim, uma parlamentar da Frente Nacional em Romorantin chamou esse mesmo ícone feminista de "não sognolote" e "espécie de prostituta" para contestar a nomeação de uma avenida com seu nome.
Um espaço perfeito para esse tipo de disputa política reacionária e muito ideológica é o das nomeações com o nome de Nelson Mandela. Estas eram rejeitadas nos anos 1980, pois celebravam um comunista e um terrorista. No Reino Unido, na França e na Holanda, a decisão de rebatizar um lugar como Nelson Mandela conseguiu ser derrubada por novas equipes, bem como em Sartrouville, em 1989.
A extrema direita chegou a intervir espalhafatosamente nesse campo no final dos anos 1990 quando Nelson Mandela, presidente da nova África do Sul e Prêmio Nobel da Paz, já havia adquirido um status de figura internacional de defesa dos direitos humanos e da paz. Assim, a praça Nelson Mandela de Vitrolles se tornou a Place de Provence, enquanto em outro lugar, na cidade governada pelo casal Mégret, uma figura de extrema direita (Jean-Pierre Stirbois) pôde ser homenageada no lugar de uma outra figura pós-colonial como Jean-Marie Tjibaou.
Essas iniciativas reacionárias mexeram os pauzinhos para não poderem ser claramente associadas a motivações racistas ou sexistas, promovendo em contrapartida figuras e símbolos locais e regionais no caso de Vitrolles, e/ou promovendo figuras femininas ou negras no lugar das desbatizadas: Marguerite de Provence no lugar de Dulcie September (a representante assassinada do CNA na França) em Vitrolles; Félix Eboué no lugar de Nelson Mandela em Sartrouville.
A nova onda de parlamentares de extrema direita está sendo levada a se pronunciar sobre as escolhas do nome Nelson Mandela, em um outro contexto que é o de uma homenagem quase universal, inclusive pela direita, de uma figura dos valores democráticos e da defesa dos direitos humanos. Assim, iniciativas nesse sentido dispararam desde o início dos anos 2010 e particularmente a partir do final de 2013, com a morte de Mandela. Às vezes ele é colocado pela direita no mesmo patamar que o co-laureado do prêmio Nobel e ex-dirigente do regime do apartheid Frederik de Klerk, ou pode servir para apagar a memória dos combates de municipalidades comunistas anteriores como em Yerres, onde o nome de Mandela foi dado à ponte de Soweto que homenagearia o mártir dos militantes anti-apartheid na África do Sul, ou em Saint-Cyr, quando o nome de Nelson Mandela foi dado à rua Georges Dimitrov, resistente anti-nazista e primeiro líder do partido comunista búlgaro.
Mas os parlamentares de extrema direita, longe de participarem dessa homenagem que varia de acordo com as circunstâncias ao ícone Mandela, são contrários a ela com uma constância notável. Os argumentos, contudo, variam dependendo de se os parlamentares se alinham com o discurso oficial da direção da Frente Nacional, buscando respeitabilidade, ou se trazem de novo à tona uma natureza muitas vezes presente no local. Assim, desde as eleições municipais de 2014, em Toulon, Lomme, Lyon e Saint-Etienne, os parlamentares da Frente Nacional se recusaram a votar a favor do uso do nome Nelson Mandela para batizar o pátio da nova estação ferroviária, um estabelecimento regional de ensino adaptado (EREA) e duas esplanadas.
Eles usaram como argumento, no primeiro caso, o mau tratamento infligido à memória do general golpista Salan, homenageado em sua época pela prefeitura da Frente Nacional, e nos dois casos seguintes, uma oposição à "internacionalização da cidade", e por fim em Saint-Etienne, eles retomaram a ladainha sobre o caráter comunista e terrorista de Nelson Mandela e sua contribuição somente passiva para o fim do apartheid.
Por fim, em Béziers, o novo prefeito de extrema direita, em um primeiro momento, quis desbatizar a nova escola Nelson Mandela na nova rua Frederik De Klerk, para lhe dar o nome de um poeta occitano que faleceu subitamente, mas depois voltou atrás. Mas longe de abandonar o campo toponímico, a priori tão afastado de seus discursos pragmáticos e anti-ideológicos, ele começou, assim como seus antecessores prefeitos da Frente Nacional dos anos 1990, a apagar a lembrança dos acordos de paz de Evian que selaram a última guerra colonial francesa para homenagear um de seus atores engajados.
Assim, apesar de seu discurso visando deslegitimar a promoção de figuras ideológicas na toponímia, a extrema direita está sempre tentada a impor seu próprio panteão, feito sobretudo de figuras coloniais e singularmente extremistas da Argélia francesa.
Não se deve nunca subestimar a extrema direita, sua natureza e suas referências históricas e ideológicas subjacentes tentam voltar à tona na primeira oportunidade.
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