Lula diz que denúncias contra ele são ‘insinuações’ e que elite é ‘masoquista’
Ex-presidente ataca a terceirização, defende
Dilma e diz que classe alta tem ‘medo inexplicável’ de uma eventual
recandidatura sua à Presidência
Ronaldo D’Ercole - O Globo
— Sou um homem que sei de onde vim, sei onde estou e para onde vou. O
que assusta é que, mesmo sendo um cidadão quase aposentado, o que me
assusta é o medo que a elite tem de que eu volte a ser presidente. É um
medo inexplicável porque essa elite nunca ganhou tanto dinheiro como no
meu governo, assim como os mais pobres também. Eles deviam agradecer
pela minha passagem e da Dilma pelo governo, mas não. Eles são
masoquistas. Gostam de sofrer. Todo dia eu vejo insinuações— disse o
ex-presidente, em tom de indignação.
Lula considerou “insinuações” as denúncias feitas contra ele. Na
edição desta sexta, a revista Época traz uma reportagem afirmando que o
Ministério Público Federal abriu um procedimento de investigação para
saber se houve tráfico de influência de Lula na relação entre a
construtora Odebrecht e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e
Social (BNDES) para contratos obtidos pela empresa em outros países. Na
semana passada, a Veja publicou que a construtora OAS teria feito uma
reforma em uma chácara de sócios do filho de Lula, Fabio Luiz da Silva, o
Lulinha, a pedido do ex-presidente. Lula elevou o tom e atacou as
publicações.
— As revistas brasileiras são um lixo. Não valem nada. Peguem todos
os jornalistas da Veja e da Época e enfiem um dentro do outro que não dá
10% da honestidade deste aqui (referindo-se a ele mesmo)— disse o
ex-presidente, que completou:— Cada um que olhe para o seu rabo. Se
alguém acha que alguém que chegou onde cheguei, que fez o que eu fiz,
vai baixar o rabo e a crista por conta de insinuações está enganado. Tem
que olhar para o próprio rabo.
O ex-presidente provocou a oposição e disse estar pronto para a disputa política em favor da presidente Dilma.
— Estou quietinho no meu canto. Não me chame para a briga porque eu
vou brigar e sou bom de briga. Está feita a provocação. Tenho evitado
muitas coisas porque sou ex-presidente e quero que a Dilma governe, mas
vou começar a ajudar o país outra vez, a desafiar aqueles que não se
conformam com o resultado da democracia. Tem de saber que, se tentar
mexer com a Dilma, estarão mexendo com milhões de pessoas.
Aos trabalhadores reunidos pela CUT no Anhangabaú, Lula pediu
“paciência” com Dilma, lembrando que a presidente está no início do
segundo mandato.
— Porque ela tem quatro anos para governar e garanto que estaremos
aqui, daqui a quatro anos, para comemorar. Podem fazer a crítica que
quiserem, mas tem de saber que, se mexeu com ela, está mexendo com
milhões de brasileiros.
Apontando dados negativos de uma pesquisa do Dieese sobre
terceirização, Lula atacou o projeto de lei que modifica a atividade no
país e fez uma crítica velada ao presidente da Câmara, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), por ter trazido o tema para a pauta do Congresso. Cunha já
havia sido duramente criticado pelos sindicalistas que discursaram antes
de Lula no ato do Primeiro de Maio.
— O projeto de terceirização foi apresentado há onze anos por um
deputado empresário (Sandro Mabel). Nunca se falava dele e, de repente,
ele ganhou uma prioridade na cabeça de alguns deputados. E foi aprovado
em tempo recorde—ironizou Lula.
O ex-presidente ainda se manifestou contrário à redução da maioridade
penal de 18 para 16 anos e disse que nem os militares defenderam o
projeto.
— Eu sei que esse é um tema muito grave. Sobretudo, na periferia
brasileira, ele é muito caro pelos conservadores. O problema não é ser
de esquerda ou de direita, porque os militares nunca ousaram defender (a
redução) da maioridade penal. Agora, uma parte da elite conservadora
brasileira acha que vai resolver o problema do país mandando para a
cadeia moleque de 15, 16, 17 anos. É bom possível que muitos jovens
cometam crimes. Agora, é importante que a gente diga qual é o crime que o
Estado brasileiro cometeu ao longo de 500 anos não dando a esses jovens
a oportunidade de não estar no crime? Há quantos anos esse Estado não
deu direito a esses jovens estudarem.
Lula ainda criticou a elite brasileira e o atraso na construção da
primeira universidade no Brasil, na comparação com outros países da
América Latina:
— Vou dar um dado para vocês que é uma vergonha para a elite
brasileira, para aqueles que se acham mais inteligentes que nós. A
República Dominicana foi descoberta em 1492, Colombo chegou em Santo
Domingo. Quinze anos depois, Santo Domingo já tinha universidade. O Peru
teve a primeira universidade em 1554. A Bolívia teve a primeira
universidade em 1640. A universidade brasileira, só foi feita a primeira
em 1920, 400 anos depois da descoberta. Como a gente quer punir a
juventude que não teve a oportunidade de estudar, de fazer uma escola
técnica? - questionou.
—Antes da gente saber porque um jovem cometeu um crime, vamos saber o
que aconteceu com a família dele, com o pai e com a mãe, com o avô e a
avó, com o bisavô e a bisavó, o que aconteceu com este país —
complementou o ex-presidente.
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