sábado, 1 de agosto de 2015

Imigrantes criam cidade paralela na França
Cerca de 5.000 que tentam chegar ao Reino Unido acampam perto de mata em Calais, sob condições precárias
Chamado de 'jungle', local fica a 5 km do centro da cidade, onde não há sinal da crise migratória existente
LEANDRO COLON - FSP
Quem chega ao centro da cidade portuária de Calais, no extremo norte da França, não tem a percepção de que a cidade representa hoje um drama imigratório que assusta a Europa. Calais toca sua vida com restaurantes, lojas e hotéis sem sinal da recente confusão de imigrantes que tentam passar para o Reino Unido pelo Eurotúnel, que faz a ligação entre os dois países pelo canal da Mancha.
Basta percorrer cerca de cinco quilômetros, no entanto, para se deparar com o subúrbio miserável de barracas montadas em uma mata rasa à beira das rodovias que dão acesso ao túnel. É uma "Calais paralela", marginalizada dos que vivem de fato na cidade.
Os acampamentos são apelidados de "jungles" (selvas, em inglês). Estima-se que vivam ali cerca de 5.000 pessoas, em sua maioria homens, que deixaram países na África e na Ásia para chegar à Europa por terra (via Turquia) ou pelo mar Mediterrâneo.
As primeiras barracas começaram a surgir ainda no fim dos anos 90, mas o modelo atual de moradia se consolidou em 2002.
A Folha visitou os dois principais "jungles", marcados por muita poeira e pouca higiene.
Além das barracas, há uma farmácia, uma loja de bebidas, uma mesquita e uma igreja improvisadas, tudo debaixo de lona. Voluntários prestam assistência médica numa enfermaria.
Todo dia às 12h, dezenas de imigrantes se amontoam na portaria de um centro comunitário para tomarem banho. É quando recebem uma refeição.
Esse espaço foi reformado pelo governo francês, que diz ter gastado € 3 milhões (R$ 11,28 milhões) no local –visitantes, como jornalistas, são proibidos de conhecê-lo por dentro.
As autoridades dizem ainda que investiram recentemente € 500 mil (R$ 1,88 milhão) para melhorar as condições das barracas.
A prefeita de Calais, Natacha Bouchart, tem culpado o governo britânico pela crise.
Ela afirma que os benefícios sociais e o crescimento do mercado de trabalho informal no Reino Unido incentivam a chegada de mais pessoas a Calais.
Os britânicos, por sua vez, consideram que os franceses estimulam o fluxo de imigrantes (leia texto ao lado).
Bouchart diz que o país deveria compensar Calais em até € 50 milhões (R$ 188 milhões) por supostas perdas econômicas de imagem.
VIAGEM NO BANHEIRO
Os imigrantes passam o dia perambulando pelos acampamentos ou pela área do Eurotúnel –poucos se arriscam a se deslocar, de fato, para o centro da cidade.
O sudanês Victor Mohamed, 23, é um deles. Na manhã de sexta-feira (31), ele cumpriu a rotina de encher galões de água no acampamento. Chegou há apenas uma semana ao local. Desembarcou há seis meses na Sicília (Itália), após uma viagem de quatro dias de barco.
Viajou alguns dias de trem da Itália até Calais. E como pagou a viagem? "Conseguia entrar no trem e passava a maior parte do tempo no banheiro dos vagões para não ser pego pelo cobrador."

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