Os entregadores
Os sete homens fizeram discursos sequenciais em que a
palavra mais repetida foi “entrega”. Disseram que vão entregar o que
foi prometido por administrações anteriores em exatos 7.439 projetos.
Apesar do esforço do governo para construir, com o anúncio de ontem, uma
agenda positiva, o que teve destaque foi a ordem de despejo que Aécio
entregou a Tasso.
O governo não tem tempo nem dinheiro para entregar o que prometeu nos
discursos de ontem do presidente e de seis ministros, mas pelo menos
fez uma proposta cuja filosofia é interessante: a de completar obras
paradas que se espalham pelo país. Os ministros apresentaram uma coleção
de projetos iniciados, alguns há 13 anos, como disse o ministro Bruno
Araújo, das Cidades, e disse que o governo vai completá-los. Não iniciar
novas obras, mas terminar as antigas.
Isso tem o poder de atrair políticos pelo Brasil afora. Em cada uma
dessas obras paralisadas há um grupo de pessoas interessadas. Quem viaja
pelo Brasil vê pontes suspensas no ar, duplicações de estradas
perigosas que ficaram pelo caminho, puxadinhos de aeroportos mal
escondidos atrás de tapumes. Completar o que foi começado é, na maioria
dos casos, uma boa ideia. Difícil é combinar isso com a realidade
fiscal, administrativa e de governança da administração Temer em seus
últimos 13 meses e 20 dias.
O primeiro objetivo que o governo tinha com o anúncio do programa
Avançar ele não conseguiu: era o de ocupar com boas notícias, de
recomeço de obras, e de investimento, o noticiário do dia. Quem saltou
para as manchetes dos portais foi o aliado senador Aécio Neves, pelo
golpe dado contra o senador Tasso Jereissati. Com um gesto apenas, Aécio
entregou vários recados: que o PSDB não é um partido, é um feudo com
dono; que a impunidade subiu-lhe à cabeça; que a proposta de renovação
do partido e a autocrítica foram enterradas; que o afastamento do
senador, quando ele entrou em apuros por receber dinheiro de um
empresário investigado, era puro teatro. Ele era o verdadeiro presidente
da tucanolândia, tanto que teve força para destituir o seu suposto
substituto e nomear outro para o lugar. Se o partido precisava de mais
um sinal de decrepitude, ele foi entregue ontem pelo senador que deveria
estar ocupado em explicar as entregas de dinheiro de Joesley Batista
feitas através do primo.
O palco montado pelo governo ontem era para dizer em resumo o que o
presidente Temer disse: que a crise acabou e que agora o país vai
retomar o crescimento. Na narrativa do presidente, seu governo enfrentou
um problema há cinco meses, que ele denunciou desde o começo dizendo
que era “assim, assim e assado” e que agora “o assado” está aparecendo.
Quem assimilou o sentido dessa mensagem ficou assim com impressão de que
ele quis dizer que conspiraram contra ele, mas ele descobriu tudo
antes. A verdade como se sabe é que ele teve uma conversa de teor
indefensável com o empresário Joesley Batista, numa noite do Jaburu, e
que se livrou das denúncias com todas as entregas que fez aos grupos de
interesse da base do governo.
O argumento usado por Aécio para defenestrar Tasso do posto de
presidente do PSDB poderia até ser cômico se estivéssemos em momento de
achar graça na política. Disse que Tasso precisava sair do cargo para
disputar com seu concorrente em igualdade de condições a presidência do
partido. Ou seja, quem está no cargo tem vantagens. E isso dito no
partido que inventou a reeleição.
No cenário traçado pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, o
governo vai entregar um crescimento de 3% ao fim do ano que vem. Há
sinais de melhora da economia, sem dúvida, mas dificilmente isso
entregará ao governo a melhora da popularidade. Também há poucas chances
de o programa de ontem, de reapresentar um cozido de obras inacabadas,
entregar a agenda positiva que o governo quer.
Esse governo permanecerá sob o sinal da crise até o final, tentando,
com nomeações como a desta semana para a Polícia Federal, entregar um
salvo conduto para os seus integrantes ou aliados fiéis. O problema é
que a encomenda desejada talvez não chegue a tempo.
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