segunda-feira, 30 de julho de 2012

ALEMANHA: ASSASSINOS SÃO HOMENAGEADOS POR NEONAZISTAS

Memorial misterioso homenageia assassinos de extrema-direita e revolta aldeia alemã
Julia Jüttner - Der Spiegel
Simpatizantes desconhecidos colocaram uma pedra memorial sobre os túmulos dos dois homens que, em 1922, assassinaram o ministro das Relações Exteriores da Alemanha Walther Rathenau, que era judeu, durante a República de Weimar. A população da aldeia de Saaleck suspeita que extremistas de direita estejam por trás do fato.
Assassinar Walther Rathenau foi fácil. Na manhã de 24 de junho de 1922, um sábado, o ministro das Relações Exteriores alemão deixou sua mansão no subúrbio de Grunewald, em Berlim, e era levado por seu motorista para seu gabinete em um carro conversível. De repente, outro carro com três homens ultrapassou o dele. Um dos homens abriu fogo com uma submetralhadora e outro atirou uma granada. Rathenau morreu imediatamente; o motorista sobreviveu.
Os assassinos eram o estudante de direito Erwin Kern, 23, e o engenheiro mecânico Hermann Fischer, 26, ambos ex-oficiais do exército e membros do grupo terrorista de direita Consul. Ernst Werner Techow estava ao volante. Na época, os nacionalistas alemães gostavam de declamar: "Matem Walther Rathenau, o maldito porco judeu!"
Os três fugiram para o castelo de Saaleck, a cerca de 200 quilômetros ao sul da capital alemã. Mas cometeram o erro de deixar uma luz acesa, e os moradores, sabendo que o inquilino, um simpatizante da extrema-direita, estava ausente, alertaram a polícia. Kern foi morto durante a prisão e Fischer se suicidou com um tiro. Techow foi preso e condenado a 15 anos de prisão. O promotor público citou "o ódio cego aos judeus" como motivo.
Hitler mandou colocar lápide
Os corpos de Kern e Fischer foram enterrados entre dois jovens carvalhos na extremidade do cemitério da aldeia de Saaleck. Em julho de 1933, Adolf Hitler mandou que eles fossem reenterrados, e uma grande pedra memorial foi colocada no cemitério com uma inscrição que os elogiava como "combatentes avançados" de sua causa.
Depois da guerra, as autoridades comunistas da Alemanha Oriental removeram a inscrição, e a pedra foi esquecida. Mas, depois da unificação, o lugar se tornou um ponto de peregrinação para neonazistas que agitavam bandeiras, cantavam o hino nacional e brindavam aos assassinos no restaurante Burgblick, perto dali.
A aldeia de 300 habitantes acabou reagindo e livrou-se da pedra em janeiro de 2000. O conselho da igreja decidiu que o local não seria mais usado como túmulo. Os neonazistas foram embora, mas, todos os anos, no aniversário da morte dos assassinos, uma grande coroa de flores aparecia no lugar.
Agora a lápide voltou --ou melhor, uma substituta. A polícia a notou em 17 de julho, o 90º aniversário da morte da dupla. Todos os anos naquele dia, desde a unificação, a polícia patrulhou a aldeia para verificar se havia neonazistas. "Estamos sempre lá, e as pessoas em questão sabem que estamos lá", diz a porta-voz da polícia Ulrike Diener.
Flores para os assassinos
A pedra tem os nomes de Fischer e Kern gravados, com a data de sua morte, nos caracteres rúnicos tão apreciados pela extrema-direita. Na noite de 17 de julho, "um punhado" de pessoas chegou ao cemitério para depositar flores --gladíolos amarelos e begônias vermelhas hoje adornam a pedra memorial. É um lugar idílico ao pé das ruínas dos castelos de Saaleck e Rudelsburg.
"A pedra não é ilegal", disse um porta-voz do gabinete do promotor do Estado na cidade vizinha de Naumburg. Afinal, o cemitério tem acesso livre. Mas a comunidade da igreja protestante que é dona do pequeno cemitério estabeleceu um prazo para sua remoção.
O oficial do distrito de Naumburg Johannes Borchert disse: "Este cemitério será desocupado pela cidade de Naumburg." Ele disse que não havia "qualquer justificativa ou autorização" para a pedra e que a concessão do túmulo expirou há muito tempo.
A população local suspeita que o Partido Democrático Nacional (NPD), de extrema-direita, descrito pelas autoridades como racista, revisionista, hostil à Constituição e simpático ao nacional-socialismo [nazismo] esteja envolvido. Mas não pode provar isso --e o representante local do NPD não quer falar.
Questionado se havia colocado a pedra no local, o limpador de chaminés Lutz Battke, um vereador do NPD, riu e disse: "Bem, eu não sei se posso confirmar isso, tenha um bom dia!" E desligou o telefone.
Os moradores de Saaleck aprenderam a conviver com a extrema-direita. O prefeito Gerd Förster diz que há quase 20 deles na área, cinco dos quais moram em Saaleck. No momento, só uma coisa importa: "A pedra tem de sair daqui".
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves

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