quinta-feira, 31 de julho de 2008

Viagem - exerto.

"No perfume dos meus dedos,
há um só gosto de sofrimento,
como o sangue dos segredos
no gume do pensamento."
Cecília Meireles

quarta-feira, 30 de julho de 2008

A eternidade e o desejo.

"Gosto do arrepio da sua língua na minha nuca, gosto que me digas quero mais quando creio já ter dado tudo. Gosto das palavras obscenas que inventamos juntos, feitas de restos de barcos e impérios."
Inês Pedrosa

terça-feira, 22 de julho de 2008

Adeus a tudo isso

20/07/2008
Acordei já com o sol alto. Tem alguém trancado no banheiro, espero que ele não esteja morto.
Tem uma manada esparramada na sala. Todos dormem. São onze horas. Ponho óculos escuros (tô virando um vampiro), destranco o armário, pego uma garrafa, um copinho de vidro, um limão, sal e vou lá pra fora.
Fumei uma cigarrilha. Peguei o violão melhorzinho e fiquei dedilhando algumas músicas: toquei muito Whitesnake, David Coverdale canta demais! Após Soldiers of fortune, percebi que todos estavam acordados. Fiquei envergonhado. Tirei o meu time de campo.
A manada foi embora, cada qual foi para a sua cabana, deixando-nos a sós. Estou me comunicando melhor com ela.
E ela sempre e cada vez mais atrevida. Eu disse que teria partir. Ela levantou a blusa, e mostrou dois motivos para que terminasse a conversa ali mesmo, naquele momento.
Resumo: tomamos um café da manhã regado a tequila, limão e sal. Saquei do armário uns queijos e azeitonas, e foi assim. Nos amamos novamente. Mas teria que partir.
Vem à minha mente um poema do Lorca que diz mais ou menos assim:
"Hoje sinto no coração
um vago tremor de estrelas,
mas minha senda se perde
na alma névoa.
A luz me quebra as asas
e a dor de minha tristeza
vai molhando as recordações
na fonte da idéia."

Horses, horses, horses...

19/07/2008
Noite. As coisas são mesmo engraçadas... Ursula arranjou novas amizades (da idade dela, pelo menos) e decidiu fazer uma festinha... aqui!
Tento manter o ritmo. Para quem não queria nem falar, tá difícil.
Oito horas e eles começam a chegar: cada um trazia sua bebida, fumo, comprimidos e um monte de coisas, que tremo até de pensar.
A Ursula ficou o tempo todo ao meu lado. Rolavam cd's que eu trouxe comigo e cd's dela.
Num certo momento colocaram um cd da Patti Smith. Aí a loucura foi geral: as meninas começaram a dançar no ritmo frenético de Free Money, mas a catarse total veio com Horses;
a minha menina cantava, quase esgoelava "horses, horses, horses..." Dançava, rebolando suas ancas metidas numa bermuda jeans esfarrapada e um top amarelinho, sem absolutamente nada por baixo!Dançava e dançava, como um animal, e isso era muito sensual. Passado um tempo, chegou um casal e trouxeram dois violões. Um desses de estudante, o outro já era uma coisa mais fina.
Começava a sessão do canta essa, canta aquela, canta aquela outra...Chegou a minha vez: todos olharam para o tiozinho latino e esperaram alguma coisa de mim, um pobre diabo. Respirei fundo, peguei o violão e toquei "Canteiros":
"Quando penso em você
fecho os olhos de saudade
tenho tido muita coisa
menos a felicidade
correm os meus dedos longos
em versos tristes que invento
nem aquilo a que me entrego
já me dá contentamento."
Não entenderam muita coisa, mas era e é aquilo que eu sinto agora. Gostaram da coisa e, embalado por Jose Cuervo, engatei num Neil Young: "Cortez, the killer". Não muuuito sóbrios, resolvemosm ir para o alpendre, apesar do vento frio e, sendo aqui, verão.
Tinha me prometido nunca mais pegar um violão ou guitarra, mas quando chegar aí vou trazer as minhas guitarras e meus amplificadores, de novo. A história recomeça...
O sol quase já aparecendo e eles resolveram, TODOS, dormir aqui.
Para escapar de qualquer almôndega fora de época me tranquei com a menina no meu quarto e dormi profundamente.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

Marjorie, ma belle.

Marjorie, ma belle, é lindo...
Lembro-me de vc, sentada na primeira fileira de carteiras.
Espero que tudo o que vc queria, tenha conseguistado por esforço próprio.
Isso é muito bom e estimulante.
Você merece.
Muito legal vc manter contato. Caso haja algum problema, lembre-se de que aqui tens um amigo.

Cidade pequena

19/07/2008 Aluguei duas bicicletas, e ela apareceu, de banho tomado, vestia uma calça estilo pescador, verde musgo, blusinha branca e tênis de cano curto, sem meias. Andamos pelas estradinhas da região. Sentamos à beira da estrada, na sombra duma árvore e namoramos. Cenas, cenas, cenas. Ficam registrados os seus cabelos longos esparramados no meu colo e eu mexendo neles. Na linguagem dos amantes, combinamos que ela ia pegar "as suas coisas" e ficar na minha cabana... Seus pais vão embora, e depois é por minha conta. Peguei pra criar, só pode! Tentarei manter o ritmo (não sei se consigo). Cheguei na cabna, tomei uma ducha e não desci para o almoço. Improvisei: atum enlatado, limão e uma cerveja gelada para acompanhar. Resolvi ir à cidade, que ficava uns dez quilômetros da fazenda. Estava tirando o carro, quando ela chegou com funcionários do hotel e as suas malas (duas). Foi comigo até a cidadezinha. Era uma cidade que vivia da pesca, com muitos rios em volta. Achei uma lan house, e enquanto eu fazia a tarefa do dia, postando textos, recados e resolvendo problemas, ela foi ao mercado mais legal da região. Estava finalizando as minhas tarefas, quando ela chegou e trouxe consigo dois sacos de papel enormes. Tinha comprado tequila, limão (aquele limão deles, que não é gostoso como o nosso) e sal. Nenhuma comida. Coloquei tudo isso no carro, e fui comprar algo para comer, pois estava disposto a ficar na cabana e não descer para a sede. Por enquanto, não.

Ursula

19/07/2008 A menina se chamava Ursula e era do meio oeste norte-americano. Um nome singular para uma americana, eu pensei, o mais comum seria Mary-alguma-coisa, mas gostei. Ficamos. No alpendre tinha uma mesa e quatro cadeiras. Escutamos música, Pink Floyd, Grateful Dead e muito blues. Ela beijava com um vigor que quase fiquei sem ar. Eu tentava conversar com ela: ela tentava um espanhol meia boca e eu um inglês de rap, prevaleceu, então, a linguagem do corpo. Foi aí que me aconteceu de pensar sobre a idade dela. Ela era muuuuito nova! Pensei na prisão, detentos malucos, guardas sádicos, tipo filme de cinema/seriado de tv. Perguntei a ela e ela sorriu pela enésima vez, fez um silêncio, criou um suspense e depois disse: dezoitos anos rasos! Fiquei na dúvida, mas... O instinto animal prevaleceu e nós nos amamos. No outro dia de manhã, acordei "mais cansado que sozinho" E ela estava lá, deitada entre os lençóis e dormia profundamente. Em cima da mesa, uma Jose Cuervo vazia. Matamos sozinhos uma garrafa de tequila! Isso não era um bom sinal. Deus, dezoito anos rasos! Perdi a noção do bom senso. Pensei num monte de coisas... Mas não descobri um motivo sequer para ela dormir comigo. Muito estranho, seu pai deveria ter a minha idade. Ou menos se tivesse sido precoce. Tomei uma ducha, lavei a mente de pensamentos confusos. Coloquei uma roupa limpa e fui fumar uma cigarrilha lá fora. Ela acordou, e foi ter comigo. Usava um jeans de cós muito baixo (dava pra ver uma tatuagem próxima das nádegas e sua calcinha era algodão branco). A camiseta amarela trazia uma estampa dos Ramones. Estava linda na sua juventude. Ela, diria Rubem Braga, fazia o que fazia de melhor: ela fazia olhos azuis. Veio e me beijou. Eu não queria mais nada neste mundo. Fomos juntos até a sede, a pé. Entramos no salão para o café, ela se dirigiu a uma mesa com um casal sentado. Eram os seus pais! Queria ter uma pá nessa hora, cavar um buraco bem fundo e me jogar lá dentro. Sentamos, depois os dois juntos numa mesa bem afastada. Estava mais perdido que o Stevie Wonder num tiroteio. Ela me disse que o pai morreu num acidente de carro e aquele era o seu padrasto. Na dúvida, pensei, pegava ela pra criar. Que cafajeste! Desci muito, no funndo do poço! Para o café, pedi dois ovos no prato, com muita pimenta do reino e fatias generosas de presunto, suco de laranja e um café preto.

Jose Cuervo, limão e sal

18/07/2008
Mantinha-me muito limpo e saudável, de corpo e alma. Pretendia ficar assim.
Num recesso amoroso. Mas uma serpente apareceu no horizonte... e eu comi a desgraçada da maçã.
Era noite e, lá pelas tantas acabou a água mineral. Resoluto, fui até a sede, de carro, e enquanto esperava o meu pedido, esbarrei numa menina que estava na festa. Havia um monte de gente em torno da piscina, tocava uma música eletrônica e eles estavam enfeitados com colares e pulseiras fluorescentes.
Cumprimentei-a no meu mau ingês, girei nos meus calcanhares e fui embora. Já estava na cabana e escuta uma música, Sad and deep as you, muito linda, mas triste, trazendo más recordações, de um tempo muito difícil e dolosoda da minha vida.
Vai daí que a menina chegou, assim, do nada. Pelo que entendi, ela me convidadava para a festa na piscina. Sorrindo, estende a mão e me ofereceu uma pílula. Temendo o pior, recusei, usei uma pá de argumentos, do fazia-mal-pra-saúde até não-tenho-mais-idade-pra-isso.
Diante da negativa, ela sorriu, virou as costas e foi embora.
Duas da manhã (horário deles), ela voltou, gritou algo na porta e eu atendi. Foi aí que eu me perdi.
Sorriu e entrou sem ser convidada. Trazia na mão uma garrafa de Jose Cuervo Ouro, três limões e um saleiro.
Agora ela estava falando a minha língua.

No meio do nada

17/07/2008
Eis que estou aqui, no meio do nada. Sem telefone ou internet. Se o mundo acabar, ficarei sabendo daqui uns cinco dias. O jornal mais atualizado data de uma semana atrás.
Aluguei uma cabana que foi um dia um estábulo para cavalos. Ela é bem espaçosa, com banheiro e uma cama king size só pra mim. Únicos confortos, além da geladeira, do mundo moderno.
No início me desesperei. Mas, agora, estou mais relaxado. A cabana foi construída na década de vinte, mas aí veio a depressão e a fazenda mudou de mãos...
O lugar é muito bonito, paisagem bucólica: estrada até a cabana é sombreada por árvores altas (que depois fui saber que são álamos). A cabana dista quase um quilômetro da sede. Um silêncio aterrador. A uns duzentos metros da cabana, mais à frente, tem um lago imenso, onde pescadores de fim de semana vão pescar uns peixes prateados, de tamannho considerável (trutas, eu creio).
A sede é bem confortável, a piscina é tão grande (com bares dentro) que imaginado-a cheia de gente, fico com arrepios.
Eu estou em busca de paz do espírito. Na fase de admirar monge budista pela sua mudez e quietude. O meu trabalho me obriga a falar demais, então eu quero, agora, silêncio.
A única exceção foi para uma amiga que veio de muito longe e tive um imenso prazer em falar com ela. Só.
Depois disso, peguei a mochila, tomei um avião, um ônibus e aluguei um carro, e vim para cá.
No meio do nada.

domingo, 20 de julho de 2008

Horses

Estou no meio do nada. Numa cabana que um dia foi um estábulo.
A menina que conheci é muito legal. Apesar de ser muuuuuuuito nova.
Ela colocou para tocar um disco meio punk, da Patti Stmith, chamado Horses.
Eu estou sentado no sofá e ela dança, dança como um animal. Onde vou parar com isso eu não sei. Mas eu estou gostando disso tudo. Ela me faz bem. Dá-me uma esperança que eu não tinha mais. Vamos ver...

quinta-feira, 17 de julho de 2008

Jus et Societas II

Para demonstrar o quanto apreciei o vosso apoio, deixo aqui, um pequeno poema de um monge busdista, zen, do século XVIII, chamado Ryokan:
"Pensar viagens
toda noite me leva
a um pouso diferente
mas o sonho que sonho
é sempre o mesmo:
um lar."
Acho isso muito lindo, de uma singeleza ímpar. Espero que você goste também.
Até.

Jus et Societas

Não sei o que dizer.
Faço uma pálida idéia
de quem tu sejas. Mas isso não importa.
Dei-me a insanidades temporárias. Habitante onírico de um mundo sem razão.
Nos e-mails, eles reclamam por mais comentários políticos, mais economia, mais isso, mais aquilo.
Mas eu estou cansado, e não quero falar sobre esses assuntos tão áridos.
Permiti-me sonhar e escrever sobre coisas belas. Poesias de autores famosos, que muitos dos que me criticam ignoram, na existência medíocre que possuem.
Desculpe o desabafo, mas se eu tiver que escrever como se estivesse dando aula, prefiro parar por aqui. Chega, o Lula é um cretino, mas não vale os minutos da minha vida.
Nem ninguém.
Ponto.
Beijos.

Deuses em palco terrestre

Eles avançam, e percebi que não tenho dedos para pintar as aquarelas que desejam. Entre fragilidade e o desejo, sou apenas eu. O assédio às portas da corajosa Esparta era irresistível.
Nem Menelau, que teve e perdeu Helena, o paradigma de mulher/amante, nem Leônidas, o bravo Leônidas, iriam conseguir deter a tragédia em curso. Caía, miseravelmente, o Rei de Copas. Não sobra nada.
"Insana, Me afogo na seiva de um deus humano. Ecoa trepidante uma voz em meus ouvidos, Qual cálido sêmem vertendo vertigens ruidosas. E assim, Cerrado os olhos, Invento curvas e projeções anatomicamente improváveis. Teu corpo faço Molde surreal com maleabilidade de espuma Escorrendo em curvas rabiscadas em papéis inventados. São atos ébrios desta peça teatral... Neste claustro romano cabem meu coração, minha alma, um beijo profano, Prefácio de uma canção. Neste palco de tragédia e glória, De noites de Lua insana, Cabe seu nome na minha história. Dentre meus sonhos; As conquistas e encontros Eis um deles a que aspiro sem que os soldados estejam prontos: Libertar-me desta peça tardia. Pois o que por vezes se derrama de tua boca, Não é a saliva de anjos ou demônios É o fluido cósmico que vem corromper o destino. Empresta-me então a tua boca... E adeus às asas para transpor os limites deste coliseu." L.

Voragem

Depois que a conheci, a beijei, a toquei, a senti e amei nada mais me satisfaz, bebo, fumo, canto, grito como um insano mas nada, nunca mais será como antes. As noites me consomem em horas de espera e vigília vã: ela não voltará. O inimigo de dentro torna o sono uma possibilidade remota e, o corpo desassossegado clama sem fim por um toque, um beijo, um algo, que venha dela, do seu corpo magro e branco, gravado no meu a ferro e a sangue. Imperativo, o desejo exige e a alma fraca como é, cede e eu me contorço em dor e saudade. pareço com um velho navio encalhado num mar de sargaços, quanto mais tento me movimentar, mais próximo do vórtice eu fico. Somos pequenos demais, somos apenas um acidente sem importância num lance de dados mal jogados. Hoje, porém, as janelas ficam abertas na esperança vã de que o cheiro das madressilvas em flor tragam um pouco do perfume daquela pequenina pétala que um dia repousou na palma da minha mão. Paulo Mello

Dispersos

"Tenho me confundido na tentativa de te decifrar, todos os dias. Mas confuso, perdido, sozinho, minha única certeza é que cada vez aumenta ainda mais a minha necessidade de ti. Torna-se desesperada, urgente. Eu já não sei o que faço. Não sinto nenhuma outra alegria além de ti.
Pergunto-me como pude cair assim nesse fundo poço. Não quero me afogar. Quero beber tua água. Não te negues, minha sede é clara."
Caio F.

Fernando Pessoa

"O amor é uma companhia. Já não sei andar só pelos caminhos, Porque já não posso andar só. Um pensamento visível faz-me andar mais depressa E ver menos, e ao mesmo tempo gostar bem de ir vendo tudo. Mesmo a ausência dela é uma coisa que está comigo. E eu gosto tanto dela que não sei como a desejar. Se a não vejo, imagino-a e sou forte como as árvores altas. Mas se a vejo tremo, não sei o que é feito do que sinto na ausência dela. Todo eu sou qualquer força que me abandona. Toda realidade olha para mim como um girassol com a cara dela no meio." Alberto Caeiro

No café, outra pequena epifania

Às vezes parece que os deuses nos sorriem e concedem um fiapo de esperança para que esqueçamos, ao menos temporariamente, o desespero que aflige e fustiga a nossa breve existência nesse pedaço de chão.
Ontem, a mensagem dela explodiu na tela do meu computador. Míriade de cores, flores e grafias. Como uma good trip. O coração elevou a pressão e as pupilas dilataram: ela queria marcar um encontro no café! "Mas há que tentar o diálogo quando a solidão é vício.", dizia Drummond. Deixei a vida miserável, e fui ao encontro da minha Galatéia.
Entrei no café, e ela estava lá, recostada na cadeira lendo um Deleuze. Para ficar melhor, pensava eu, só falta ela me amar!
Sua blusa, larga, ressaltava o seu corpo magro, insinuante e sensual, jovem. Juventude reafirmada por um jeans manchado e por um par de tênis All Star cano curto. Quase menina nos seus vinte e um anos, ergueu seus olhos do livro e sorriu daquele jeito que sorria quando estava feliz.
Falamos sobre a vida, as nossas dificuldades (diferentes para cada um nós). Falamos sobre poesia: Quintana, Adélia, Drummond, João Cabral, Cecília Meireles e outras glórias deste país tão emotivo que é o Brasil. Discutimos sobre as diferentes emoções de diferentes povos espalhados por essa grande nave azul. E concluímos: o nosso povo é mais solidário e afetuoso do que os outros. Não importa que se diga ao contrário.
Foi nesse momento, enquanto ela gesticulava e ria (ficava levemente ruborizada quando ria) é que percebi como as suas mãos com dedos finos e longos eram bonitas. E, subindo um pouco mais o olhar (já medindo os centímetros) observei os seus ombros esculpidos no mais puro e alvo dos marfins e me envergonhei de pensá-la minha.
Ela deve ter percebido, pois parou de falar e tornou a rir, agora do meu jeito meio sem graça de ter sido flagrado em pensamentos impróprios.
Percebemos como o tempo correu depressa, quando o café começou a fechar, com os funcionários colocando as cadeiras com as pernas pro ar sobre as pequenas mesas redondas que deviam ter testemunhado vários encontros como o nosso, decretavam o fim da jornada.
Levantamos e, juntos, resolvemos terminar o nosso assunto em outro lugar.
Lá fora a temperatura havia caído, mas nada no mundo seria capaz de nos demover daquilo que nos havíamos proposto.

Contra o muro

"Pulou no rio a menina cuja mãe não disse: minha filha. Me consola, moço. Fala uma frase, feita com meu nome, para que ardam os crisântemos e eu tenha um feliz natal! Me ama. Os homens de nucas magras furam os toucinhos com o dedo, levantam as mantas de carne e pedem um quilo de sebo. Toca minha mão. Quem fez o amor não vazará meus olhos porque busco a alegria. A vida não vale nada, por isso gastei os meus bens, fiz um grande banquete e este vestido. Olha-me para que ardam os crisântemos e morra a puta que pariu minha tristeza." Adélia Prado

quarta-feira, 16 de julho de 2008

"Toque meu verso com as tuas mãos nuas,
Já te enxergo a face além das máscaras.
Alcanço-te o céu da boca com as minhas constelações
E decoro noites a fio à via láctea dos teus sons
Repousa teu sono em minhas mãos nuas,
Para sempre e agora tuas
Em órbitas incandescentes,
Em devaneios, em luas."
L.

Pequenas Epifanias IV

Conversávamos. Falávamos da situação ruim no Brasil, da inflação, dos imigrantes na Europa, do avanço do Islão, mas, quanto mais era falado, mais os nossos olhos pediam...
O seu corpo branco, estendido no sofá, parecia uma Maja desnuda. Sua cabeça no meu colo se entregava indolente aos carinhos dos meus dedos longos em seus cabelos de ninfa.
Vestidos, fumamos juntos, cigarrilhas aromatizadas, feitas na Holanda. A segunda parte da trilha sonora do Zabriskie Point rolava, e o Pink Floyd tocava Country Song. Víamos o poente
e as suas cores alaranjadas. Discutímos Margritte e Dali, depois Dali e Matisse, mas o que queríamos mesmo era que o tempo não passasse.
E foi então que ela se levantou do chão onde estávamos sentados, de frente pro gramado, e disse que iria embora. Jogou sobre os ombros um xale delicado (eu não me lembrava dela ter entrado com ele, mas enfim...), e desapareceu pela noite que se fazia cair.
Restava-me o som melancólico de Jerry Garcia, dedilhando Love Scene Improvisations. O eco das notas da guitarra na casa vazia, apertou-me o coração.
Tomei um Calvados, fumei outra cigarrilha e fui dormir.

Camões

"Busque amor novas partes, novo engenho para matar-me, e novas esquivanças, que não pode tirar-me as esperanças que mal tirarão o que eu não tenho. Olhai que de aspereza me mantenho! Vede que perigosa segurança! Que não tenho contrastes, nem mudanças, Andando em bravo mar, perdido lenho. Mas, conquanto não pode haver desgosto onde esperança falta, lá m'esconde amor um mal, que mata e não se vê. Que dias há que n'alma me tem posto um não sei quê, que nasce não sei donde, vem não sei como, e dói não sei porquê."

terça-feira, 15 de julho de 2008

Improviso - LVG - Opus 01

Este texto improvisado foi criado sobre poema de minha autoria, ficou bem original.
Ele
"Da tua língua áspera a minha guarda o teu gosto
Do mel que estio algum
Pode amadurecer."
Ele estava sozinho agora. A tela do computador devorava seus olhos inertes e submissos. A lucidez
sangrava e árvores pulavam das janelas eufóricas. Lembra do toque, do sexo virgem, e um vento turvo enlouquecido arrancou-lhe os pés do chão atirando-o ao cosmo. Estrelas giravam e furavam seus olhos, já não podia ver suas palavras, elas desciam agora garganta abaixo. E elas giravam, desgovernadamente...
Estavam insanos, loucos, aturdidos, enganados pelo cheiro do sexo ou do pecado. Línguas, dedos, e faces, o nu deitado sobre o santo sudário.
"Teu corpo, cheiros, suspiros e sucos
habitam agora os estilhaçados labirintos da minha memória."
Estava sentado, somente a Lua iluminava seus dedos escorregando trêmulos no teclado. Encimando a escrivaninha, uma reprodução de René Margritte, Personnage méditant sur la folie. Ele também meditava sobre a loucura, reclinava o corpo para trás e soltava aliviado a fumaça. Olhava para o chão e ainda podia ouví-la confessar seus medos, sua paixão profana. Na estante, seu reflexo ecoava um melhor-teria-sido-tivessem-permanecido-calados, melhor-teria-sido-ir-se-embora, melhor-teria-sido-não-tocar-a-pele-fria-para-depois-deixá-la-em-carne-viva.
"Da tua volúpia, felina pantera,
o meu corpo reclama incessante, saudades imorredouras."

Dos Ipês

Uma vez derrubada as muralhas de Constantinopla, o ataque foi centrado em Alexandria e assim, caía o Rei de Ouros. A vida é cruel! Não fica nada! "Dos ipês Guardo ainda a derradeira pétala Na concha de um ventre adormecido. Tenho tuas mãos derramadas em meu colo E guarneço em mim o teu sêmem, Secreto anseio de mádidas noites De suores incessos De arfares Tenho teus dedos desenhando minhas margens Escorrendo lívidos por longínquos instantes. Mas sendo lépida a hora que nos embala Ensandeço sob o ápice de um ponteiro." L.

Clarice

Uma das três melhores escritoras deste país (apesar de não ter nascido nele, era brasileiríssima), Clarice Lispector deu-nos um grande livro de contos (corria o ano de 1964), ele se chamava A Legião Estrangeira. Desse livro, eu destaco um conto curioso, chamado Tentação, que relata o amor impossível entre duas criaturas prisioneiras (ela na sua infância, ele cativo de sua dona).
Fica um pequeno trecho:
"Eles se fitavam profundos, entregues, ausentes de Grajaú. Mais um instante e o suspenso sonho se quebraria, cedendo talvez à gravidade com que se pediam.
Mas ambos eram comprometidos.
Ela com a sua infância impossível, o centro da inocência que só se abriria quando ela fosse uma mulher. Ele, com a sua natureza aprisionada."

Zooilógico

"Eu sou o menino que abriu a porta das feras no dia em que todas as famílias visitam o zôo." G. G.

Pequenas Epifanias III

A minha ninfa (é tão fácil e gostoso se apropriar das pessoas) vestia uma saia dessas de brechó caro, uma blusa de mangas compridas, que deixava à mostra uma pequena parte de uma pele branca, alva, alvíssima do seu sagrado ventre.
O conjunto era rematado por botas que iam até o joelho, daquelas de zíper, daquelas usadas pelas mulheres fatais em filmes noir.
Seus cabelos vinham até a altura dos seios e eram crespos. Emolduravam uma face delicada (como convém a uma ninfa) e lábios que eu toquei com os meus (sim, agora eu sei que a beijei-lhe e a sua língua tocou a minha) e toquei-lhe também com os meus dedos. Era real, a minha ninfa.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Camille Claudel

"Il y a toujours quelque chose d'absent qui me tourmente."

Pequenas Epifanias II

Tá. Admito que pisquei. Mas, logo que abri os olhos, lá estava ela: sentada no sofá. Voltada para mim. E ainda continuava a sorrir. Perguntei o motivo, e ela tão somente levantou a taça, com o vinho da cor rubi mais intenso, daqueles rubis saídos das mil e uma noites. Servi-lhe noz pecã e o sal dos seus lábios carrego aqui, comigo, na minha boca. Beijei-lhe, talvez. Não sei se é possível beijar uma ninfa. Pouco me importa. Talvez nem vivo eu esteja, portanto dane-se. Mas o sal dos seus lábios carrego comigo. Isso eu sei.

Cai

Um dia, as fortalezas de Constantinopla caíram. E ele amou outra vez. Cai, poema escrito pela pessoa que ele amava, pertencia às areias do deserto, pertencia ao passado. Agora, eis que ressurge Constantinopla assolada. Trêmulo, toco estas teclas frágeis de incertezas. Mas o destino é o homem. Eu, pelo menos. "Cai, Desaba neste leito Feito chuva Vento Num copo de silêncio Acalento o som-ranger Dos teus braços. Ganidos de alma prisioneira. Cai, Ri assim E me devora. Deságua em mar, Na boca, Em mim. Cai. " L.

domingo, 13 de julho de 2008

Pequenas Epifanias.

Hoje uma ninfa visitou-me. É, uma N I N F A. Você, no seu orgulho besta, achava que as ninfas pertenciam a um mundo de fantasias. Está redondamente enganado. Aqui, deve ter alguma passagem escondida. Ou entre as orquídeas, ou, entre os ipês. Mas deve estar por aqui. Ela passou pelo gramado e os cães de guarda não fizeram nada! Eu podia jurar que os seus pés não tocavam no chão. Mas também não lhe procurei asas. Mas vi quando ficou diante da porta de vidro e sorriu para mim.

sábado, 12 de julho de 2008

Num café, uma pequena epifania

De repente, entre o caos civilizado de livros, pessoas, mesinhas e sons desconexos, eis que surgiu uma ninfa, diáfana como o som da brisa, de sorriso cativante e doce, como um favo de mel.
Gestos medidos, suaves, linda, quase irreal, estava diante da minha mesa. Seus olhos, um convite, e logo, lá estava eu a discutir filosofia, Sartre, Merleau-Ponty e outras coisas que não me recordo mais. Mandava-me um encanto após outro. Estava mesmo encantado, sorria, não sabia o que fazer com as mãos, como um adolescente. Ela derrubou a colher do seu capuccino no chão. Eu esbarrei nos objetos que estavam na mesa vizinha, felizmente desocupada.
Nos levantamos, e saímos. As luzes dos automóveis, acabaram com o encanto. Fomos embora, cada um para a sua casa.

PÓGRÉÇO

Entre o"trem da alegria" do Senado, criado na calada da noite, durante o sono dos justos, e, o prende e solta dos gângsters do colarinho branco (olha o racismo aí, gente!), li, na FSP, que as meninas estão se iniciando mais cedo na prática do sexo. O Ministério da Saúde divulgou que, em 1996, 11,5% das meninas entrevistadas tinham tido sua primeira relação aos 15 anos ou ANTES, e em 2006 o índice havia subido para 32,6%, ou seja um aumento de quase três vezes em 10 anos.
É o que dá, viver num país sem parâmetros morais. Ou seriam os nossos parâmetros a falta de parâmetros....
Cruzes! No atual andar das coisas, os "lobos" serão as futuras vítimas das "chapéuzinhos" libidinosas! Hehehe. Não tenho filhos, mas com certeza daria um pai melhor do que esses que vagueiam por aí! Estamos rodeados de imundície!

terça-feira, 1 de julho de 2008

Deus

Diabo e satanás são palavras que significam a sedução pelos bens materiais, pela glória pessoal (o Mundo). Ele sempre fez isso. Afastou aqueles fracos com as promessas, explorando-os em seus desejos. Confunde-os, dizendo que injustiça é justiça, o que é errado é certo. Esse povo enganado caminha sem direção e morre, de fome, peste, injustiça.
Ele define a desigualdade social e todas as desgraças que se abatem sobre o povo.
Desde sempre, ele foi o mesmo. Está aqui para confundir e seduzir.
Desperte!
Nosso Deus disse:
"Eu sou o alfa e o ômega, o princípio e o fim. Eu, a quem tem sede darei da graça da fonte da água da vida.
Quanto, porém, aos covardes, aos incrédulos, aos assassinos aos impuros, aos idólatras, aos feiticeiros, e a todos os mentirosos, a parte que lhes cabe será no lago de fogo, que arde com fogo e enxofre, a saber, a segunda morte."

Deus

Denunciar e resistir, enfrentando a tribulação, faz parte de um grande êxodo da morte para a vida.
É uma bobagem acreditar que Deus compactua com o mal e a mentira.
ELE não compactua com o mal e a mentira. A ignorância do povo perdido no Mundo, faz acreditar que as coisas são assim mesmo, que é vontade de Deus. Não é.
Desperte.
Veja a Mulher vestida com o Sol.
O tempo está próximo.