sexta-feira, 24 de abril de 2015

Maduro precisa reorientar economia e aceitar oposição, diz ex-presidente do Peru
Alejandro Toledo - TINYT
Paco Chuquiure/EFE
Alejandro Toledo foi presidente do Peru de 2001 a 2006
Alejandro Toledo foi presidente do Peru de 2001 a 2006
As notícias recentes da Venezuela têm sido preocupantes –e nada surpreendentes. À medida que a economia venezuelana continua derrapando e a inflação deixa muitas das necessidades diárias mais básicas fora do alcance dos trabalhadores comuns, o presidente Nicolás Maduro vem reagindo não com um plano, mas com repressão. Assim, prendeu Antonio Ledezma, prefeito de Caracas, e outras figuras da oposição sob acusações questionáveis ​​–isso sem falar nas prisões de manifestantes pacíficos. 
As tentativas de Maduro de se desviar das críticas acusando os Estados Unidos de agressão e a comunidade internacional de intromissão, mesmo que estivessem enraizadas na verdade, nada fariam para resolver os problemas da Venezuela. Se fosse um líder sério, iria olhar primeiro para a economia venezuelana, que tem, no mínimo, duas economias separadas e desiguais.
Apesar de sua fama de redistribuição de renda, a Venezuela tem visto um aumento da desigualdade. Enquanto os venezuelanos comuns viram o seu poder de compra diminuir em face da inflação em rápida ascensão, a elite tem contado com um crescente acesso a dólares, uma dicotomia que deixa a economia da Venezuela cada vez mais desigual.
Os problemas econômicos da Venezuela se estendem para além da desigualdade e da pobreza. Em longo prazo, a Venezuela deve seguir o exemplo de outras nações latino-americanas e afastar sua economia da dependência do volátil mercado de exportação de petróleo. Deve desenvolver outros recursos e capacidades em um amplo espectro de indústrias que exigem trabalho intensivo, como a manufatura ou o processamento agrícola. Mas esse problema de longo prazo não é razão para não enfrentar a desigualdade neste momento.
As ferramentas para isso variam em complexidade e dificuldade, mas oferecem uma variedade de abordagens para um governo comprometido com a questão.
Uma ferramenta fundamental é a combinação de cobrança de impostos e política fiscal. Uma melhoria na cobrança de impostos aumenta as receitas sem aumentar as taxas, e essas receitas permitem investimentos em saúde, educação infantil, ensino fundamental e médio, capacitação profissional e programas de educação agrícola que oferecem aos pobres uma chance de melhorar suas vidas.
Outra ferramenta é o apoio direto, que muitas vezes toma a forma de financiamentos e aumento do alcance de programas tradicionais há muito estabelecidos, como pensões para os idosos e seguro desemprego.
Há também abordagens mais recentes e inovadoras que são uma grande promessa. Uma delas é a transferência condicionada de dinheiro: pagamentos feitos diretamente às famílias pobres desde que satisfaçam determinadas condições, tais como manter seus filhos adolescentes na escola. Enquanto eu era presidente do Peru, tivemos sucesso com um programa de transferências condicionadas de dinheiro (conhecido como Juntos). Um estudo do Banco Mundial atribuiu ao programa Juntos uma queda de 5% no hiato de pobreza em apenas alguns anos, e mostrou efeitos conexos positivos, incluindo um aumento do consumo de alimentos e um uso mais consistente dos serviços de saúde por crianças pequenas e mulheres grávidas.
Através destas e de outras intervenções, os governos latino-americanos nos últimos anos têm mostrado que a luta contra a desigualdade é possível. Entre 2000 e 2011, o percentual de pessoas que vivem abaixo da linha da pobreza na América Latina foi reduzido de 42% para 29%, enquanto o número de pessoas em situação de extrema pobreza caiu de 18% para 11,5%. A redução da desigualdade não é fácil, mas é essencial para ajudar a aliviar a turbulência política durante tempos econômicos difíceis.
Consertar a economia, no entanto, é apenas uma das tarefas de Maduro. A segunda vai ser mais difícil: ele precisa deixar de lado a insistência conspiratória e os instintos autoritários herdados do regime de seu antecessor, Hugo Chávez, e aceitar que a verdadeira democracia inclui a dissidência -e isso significa que nem sempre as coisas serão do seu jeito.
Libertar os líderes da oposição presos é o primeiro passo; reconhecer que os manifestantes têm preocupações válidas e o direito de expressão é um segundo passo necessário. Infelizmente, não temos visto nenhum sinal de que Maduro tem esse entendimento, ou que está disposto a mudar. Enquanto isso não acontece, a comunidade internacional deve manter uma pressão externa comparável à pressão interna das ruas.
A realidade é que a luta contra a desigualdade e a luta pela democracia andam de mãos dadas. Quando os ganhos são mais amplamente compartilhados, a economia não é a única beneficiada: a democracia também recebe um impulso. As sociedades democráticas mais igualitárias economicamente tendem a ser democracias notavelmente mais profundas, com maior participação e compartilhamento do poder e da tomada de decisão.
A melhoria em uma área pode ter efeitos salutares em outra. Quando as pessoas sentem que seu trabalho está sendo recompensado e que os frutos do sucesso são mais amplamente compartilhados, ficam mais inclinadas a ver a si mesmas como cidadãs, com direitos e responsabilidades. Da mesma forma, quando as pessoas sentem que o Estado de Direito é forte e que a democracia é sólida, ficam mais propensas a fazer os investimentos de capital e de trabalho, que são as bases do crescimento econômico de longo prazo.
O caminho adiante para a Venezuela, assim como para muitas outras nações que enfrentam problemas semelhantes, não vai ser fácil, e as mudanças não virão da noite para o dia. Mas, sem dúvida, detenções e negação não são a resposta. A Venezuela, a América Latina e o mundo merecem algo melhor.
Tradutora: Deborah Weinberg

Nenhum comentário: