Ao revisar decisões de Moro, tribunal aumenta penas em metade dos casos
Dez condenados na primeira instância foram absolvidos pelo TRF-4; em outros sete casos, ocorreu o inverso
Cleide Carvalho, Gustavo Schmitt, Dimitrius Dantas - O Globo
Ao condenar o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto e aumentar sua pena de dez para 24 anos de reclusão, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) manteve tendência de aplicar penas mais duras do que o juiz da Lava-Jato Sergio Moro.
Levantamento feito pelo GLOBO mostra que, das 98 decisões referentes à
operação avaliadas pela segunda instância, 63 foram alteradas. Em metade
desses casos, a situação do réu piorou: o tempo de cadeia aumentou para
31 deles, enquanto outros 14 tiveram a pena reduzida. Há ainda, entre
as decisões alteradas, casos em que o TRF-4 reformou não o tempo de
pena, mas outros aspectos da sentença.
O tribunal discordou de decisões do juiz da Lava-Jato e inclusive
reformou sentenças em que Moro absolveu ou condenou acusados. Em pelo
menos sete casos, réus absolvidos por Moro foram condenados pelo TRF-4.
Em outras dez sentenças, aconteceu o inverso. Os desembargadores
inocentaram réus condenados pelo magistrado.
O ex-tesoureiro do PT é um dos exemplos. Vaccari acabou sendo
inocentado em dois dos cinco processos pelos quais havia sido condenado.
Ao apelar para a segunda instância, a corte entendeu que não havia
provas e que o processo se baseara apenas em palavras de delatores, o
que, por lei, é insuficiente para a condenação de um réu.
No primeiro processo, Vaccari foi acusado de pedir propina registrada
como doação legal para o PT e por meio de empresas do doleiro Adir
Assad. A pena aplicada por Moro havia sido de 15 anos e quatro meses. No
segundo caso, o ex-tesoureiro foi acusado de intermediar repasses da
empreiteira Engevix para o ex-ministro José Dirceu. Moro o condenou a
nove anos de prisão. Mas as provas também não foram suficientes para
incriminá-lo na segunda instância.
INTERMEDIAÇÃO DE PROPINAS
Desta vez, porém, o
TRF-4 entendeu de forma diferente. Para a corte, havia, sim, provas de
que Vaccari intermediou o pagamento de propinas do Grupo Keppel Fels,
que mantinha contratos com a Petrobras e a Sete Brasil, para o PT. Parte
do valor que seria destinado ao partido acabou na conta mantida na
Suíça por João Santana.
Vaccari teria pedido ao operador Zwi Skornicki, representante do
estaleiro, que pagasse US$ 5 milhões para o marqueteiro das campanhas
petistas. Zwi foi então procurado por Mônica Moura, mulher de Santana,
que combinou receber o valor em dez parcelas. Acabou recebendo US$ 4, 5
milhões.
O
desembargador Leandro Paulsen, que havia dado voto pela absolvição de
Vaccari nas duas outras ações, afirmou que, neste processo, pela
primeira vez há provas de que Vaccari intermediou o pagamento de
propina. O desembargador Victor Luiz dos Santos Laus concordou e disse
que agora há “farta prova documental”.
A
íntegra dos votos dos desembargadores ainda não foi divulgada. Entre as
provas apresentadas pelo Ministério Público Federal estavam
comprovantes das transferências bancárias feitas por Zwi para o
marqueteiro do PT e uma lista de convidados para uma festa de
aniversário do filho do operador, na qual Vaccari aparecia ao lado de
outros envolvidos no esquema de corrupção da Sete Brasil e da Petrobras,
como Renato Duque, Pedro Barusco e Eduardo Musa. A lista de convidados
foi citada num relatório da Polícia Federal, de janeiro de 2016, como
indício de que havia relação próxima entre Zwi, Vaccari e funcionários
da Sete Brasil e da Petrobras.
Em sua delação, Pedro Barusco, que foi funcionário da Sete Brasil e
da Petrobras, afirmou que a parte do PT era, na maioria das vezes,
entregue em dinheiro para Vaccari, que levava as notas numa mochila. Por
isso, o controle de entregas era feito com a sigla “Moch”.
Os procuradores afirmaram, na denúncia inicial, que Vaccari repetiu a
forma de agir de outro ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares, flagrado no
mensalão e que determinava a empresas que usassem verbas de propina
para quitar dívidas com fornecedores do partido.
A defesa de Vaccari informou que vai recorrer da decisão e sustenta
que não há provas que corroborem a acusação dos delatores. Diz ainda que
buscará o perdão judicial do ex-tesoureiro em novos recursos.
MESMO TRIBUNAL JULGARÁ LULA
Assim como
Vaccari, outros três executivos da empreiteira Galvão Engenharia também
recorreram da condenação por Moro e tiveram o dissabor de verem suas
penas aumentadas pela corte sediada em Porto Alegre. Os três
desembargadores da 8ª Turma do TRF-4 também aumentaram o tempo de cadeia
do ex-presidente da Galvão Engenharia Dario Queiroz Galvão Filho de 13
anos e dois meses para 20 anos e seis meses. Além dele, outros dois
ex-diretores da empreiteira tiveram suas penas elevadas.
O ex-diretor da área de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto
Costa, um dos primeiros delatores da Lava-Jato, também era réu nessa
ação e teve a pena mantida em cinco anos e cinco meses. Segundo os
procuradores, a Galvão Engenharia era parte do cartel de empresas que
ajustava previamente as vencedoras das licitações da Petrobras.
Em outra apelação julgada na terça-feira, o TRF-4 foi favorável aos
réus e reduziu as penas do ex-senador Gim Argello, do ex-presidente da
OAS Léo Pinheiro e do empresário Ricardo Pessoa, da empreiteira UTC.
Todos participaram de um esquema que resultou no pagamento de propina
para evitar que empreiteiros prestassem depoimento na CPI da Petrobras,
em 2014.
Argello teve a pena reduzida de 19 anos para 11 anos e oito meses.
Léo Pinheiro, condenado por Moro a oito anos e dois meses de prisão,
teve pena diminuída para cinco anos e meio. A pena de Ricardo Pessoa
passou de dez anos e seis meses para sete anos e a de Walmir Pinheiro,
ex-diretor da UTC, baixou de nove anos e oito meses para seis anos e
dois meses.
Responsável pelos casos da Lava-Jato, o TRF-4 vai julgar também o
recurso do ex-presidente Lula no caso do tríplex. Uma condenação na
segunda instância faria o petista começar a cumprir a pena de nove anos e
meio de prisão e o deixaria fora das eleições de 2018.
Nenhum comentário:
Postar um comentário