sábado, 1 de setembro de 2012

BOAS CERCAS FAZEM BONS VIZINHOS


Boas cercas, bons vizinhos

Sob a alegação de conter o terrorismo, EUA, Israel e Índia ergueram barreiras caras, incompletas e ultrapassadas

Reece Jones -  NYT - OESP
WASHINGTON - Em seu poema Mending Wall ("Consertando Muros", em tradução livre), Robert Frost contesta o seguinte truísmo: "Boas cercas fazem bons vizinhos". "Antes de erguer um muro, perguntaria / O que eu estaria incluindo ou excluindo / E a quem poderia ofender. / Algo existe que não ama um muro, / Que quer o muro abaixo."
Nos últimos dez anos, algumas das principais democracias mundiais construíram muros e cercas em suas fronteiras. EUA, Índia e Israel - muitas vezes definidas, respectivamente, como a democracia mais antiga do mundo, a maior democracia do mundo e a democracia mais estável do Oriente Médio - construíram mais de 5,5 mil quilômetros de muros e cercas, a distância entre Nova York e Los Angeles. Os três países afirmam que esses muros servem para excluir os terroristas. O governo israelense denomina oficialmente o seu muro de "o muro antiterroristas". Nos debates no Congresso americano a respeito da Lei do Muro de Segurança, de 2006, seus patrocinadores vincularam repetidamente o muro ao terrorismo.
Entretanto, em 2012, a guerra ao terror está esmorecendo. Osama bin Laden está morto. Numerosos suspeitos de liderar a Al-Qaeda foram mortos ou presos e ficarão nas prisões dos EUA por período indeterminado. Os atentados suicidas em Israel efetivamente pararam no fim da Segunda Intifada, em 2005. Embora esses muros e cercas sejam os remanescentes mais visíveis da guerra ao terror, é duvidoso que constituam um elemento eficiente para prevenir o terrorismo.
Em primeiro lugar, como Michael Chertoff, então secretário do Departamento de Segurança Nacional americano, afirmou em 2007: "Acho que o muro passou a adquirir um significado simbólico que não deve ocultar o fato de que o problema é muito mais complexo do que erguer um muro que alguém poderia transpor com uma escada ou escavando um túnel com uma pá". A atual secretária, Janet Napolitano, fez uma observação semelhante em 2005, quando foi governadora do Arizona: "Mostrem-me um muro de 16 metros de altura e eu lhes mostrarei uma escada de 18 na fronteira. É desse modo que a fronteira funciona".
Em segundo lugar, a construção de um muro é cara, assim como sua manutenção. O governo dos EUA calcula que cada quilômetro e meio de muro na fronteira mexicana custará US$ 20 milhões para uma vida útil de 20 anos. As barreiras israelense e indiana custaram vários bilhões de dólares cada uma. Nos três países, elas constituem os maiores projetos de infraestrutura da década passada.
Em terceiro lugar, nenhum dos projetos destinados à segurança nas três fronteiras conseguem fechá-las completamente. O muro dos EUA cobre um terço da fronteira mexicana, o projeto israelense foi concluído em dois terços e os muros indianos correspondem, aproximadamente, a 80% das fronteiras do Paquistão e de Bangladesh.
Qual é, portanto, o efeito no longo prazo desses muros dispendiosos e aparentemente ineficientes? A resposta está na preocupação de Frost em relação a quem o muro poderia ofender. Para os que vivem do lado palestino, a maciça barreira de concreto, que tem o dobro da altura do Muro de Berlim, simboliza a violência da ocupação israelense na Cisjordânia.
Para a grande minoria muçulmana da Índia, o arame farpado simboliza as feridas causadas pela divisão e pela marginalização. Para os mexicanos que vivem nos EUA, o muro no deserto simboliza as leis discriminatórias sobre a imigração. Os muros tornaram-se emblemáticos da política de exclusão, e não dos seus ideais de liberdade e democracia.
Será que boas cercas fazem bons vizinhos? Talvez devêssemos interpretar de maneira diferente o poema de Frost: "Onde existe o muro, não precisamos dele". 
TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA
* É AUTOR DO LIVRO "BORDER WALLS: SECURITY AND THE WAR ON TERROR IN THE UNITED STATES. INDIA AND ISRAEL".

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