Rodrigo Constantino - VEJA
Sim, essa é a conclusão da coluna
de Renato Janine Ribeiro no Valor hoje. Após muitos rodeios, o
professor titular de Ética e Filosofia Política na USP conclui que falta
ética aos brasileiros e sobra à Dilma, eis seu grande problema. Janine
escreve:
[...] uma
presidenta séria, pouco disposta a brincadeiras, exigente com o Tesouro,
isto é, com “o seu dinheiro, o meu, o nosso”, avessa a concessões em
matéria de princípios – como o Código Florestal -, acreditando na coisa
pública e inimiga dos malfeitos, nome que dá à corrupção. Nem a mídia
mais hostil a seu governo e partido questiona sua honestidade. Num país
em que a discussão política é pobre a ponto de se concentrar numa nota
só, que é acusar o adversário de desonesto, ela é criticada por suas
políticas e por sua eficiência, não por sua moral.
Exigente com o nosso dinheiro? É por isso
que quase US$ 2 bilhões foram jogados fora com a compra da refinaria em
Pasadena? É por isso que seu governo só faz aumentar gastos públicos
sem retorno algum para a sociedade? É por isso que até programa para
distribuir iPads foi criado pela presidente em claro ato demagógico de
compra de votos? É por isso que ela tinha verdadeira obsessão com o
trem-bala, um monstrengo que, caso colocado em prática, torraria dezenas
de bilhões do nosso dinheiro? É por isso que o BNDES emprestou USR 1
bilhão para a ditadura cubana construir um porto? É por isso que seu
governo transfere centenas de milhões a esta mesma ditadura para
importar escravos ao país? É por isso que seu ministro faz tantos
malabarismos toscos para continuar desperdiçando o dinheiro público e
desrespeitando a Lei de Responsabilidade Fiscal?
Avessa a concessões em matéria de
princípios? Por isso ela disse que fará “o diabo” para ser reeleita? Por
isso fecha parceria com todo tipo de escroque? Por isso realizou
concessões e privatizações após anos demonizando tais práticas quando
era o PSDB que estava no poder? Por isso Erenice Guerra estava em sua
posse, após cair por escândalo de nepotismo e indícios de tráfico de
influência? Por isso Carlos Lupi voltou para seu governo?
Dilma não é mais criticada por
sua política e sua (falta de) eficiência por não haver crítica no
aspecto moral, e sim porque sua péssima política e sua incrível
ineficiência estão afundando de vez com a economia brasileira. Ou seja,
chama mais a atenção. Mas seu governo é recordista em escândalos de
“malfeitos”, eufemismo abusado pela presidente, aliás, o que já
demonstra seu “rigor” ético contra a CORRUPÇÃO (nome mais adequado).
Para Janine, essa personalidade inflexível de Dilma é que lhe causaria tantos problemas:
Isso tem um
custo político, que ela paga. Não é pragmática, queixam-se os
empresários. Não gosta de política, reclamam políticos e colunistas. Nos
dois casos, isso significaria que não escuta o outro, não quer ter
notícias más, não faz concessões. Mas é tênue a linha separando essa
descrição, que delineia um governante no limite do autoritário, e a do
político sem princípios. Fazer uma negociação, que é coisa boa, está a
apenas duas ou três letras de fazer uma negociata. Onde ficam as
fronteiras da negociação, legítima, necessária na política, e da
negociata, sua caricatura, sua negação?
A falta de pragmatismo não é por ser
ética demais, e sim por ser ideológica demais, ou seja, age feito
aqueles equinos com a visão tapada apontada apenas para uma única
direção – no caso, uma totalmente equivocada. Fazer acordos e concessões
é a essência do regime democrático. Não é preciso confundir isso com
negociatas, desde que sejam concessões programáticas.
Ou seja, um partido cede parte de um
projeto, faz concessões, pois precisa negociar com outros eleitos de
forma legítima e que desejam coisas diferentes. Nem por isso tais trocas
precisam envolver mesadas como no mensalão, ou seja, compra de votos.
Não! As fronteiras podem nem sempre ser tão claras como o professor
gostaria, mas é evidente que há negociações legítimas em qualquer
democracia, necessárias, e há negociatas, as preferidas pelo PT de
Dilma.
E eis que surge o verdadeiro culpado:
você! Para Janine, a sociedade brasileira não pratica a ética, enquanto
Dilma é ética demais da conta, e paga um preço alto:
Muitas
críticas a Dilma, penso eu, exprimem um problema nosso, de nossa
sociedade, não exatamente dela. Queremos ética na política, mas sabemos
que na prática não é bem assim. Desconfiamos que a ética, na política,
não entrega os bens desejados. Por isso, prestamos homenagem, da boca
para fora, à moral, mas – pragmaticamente – aceitamos infrações a ela.
Isso não é raro. Já vi pessoas que se indignavam com a desonestidade
vigente mas sobrefaturavam a conta que emitiam. Essa divisão na
personalidade, essa contradição ética entre a fala honesta e a prática
desonesta, percorre a sociedade brasileira de cima em baixo. Ninguém
esquece o senador goiano que era um dos críticos mais veementes da
corrupção petista, estando, ele próprio, envolvido em negócios que lhe
custaram o mandato.
Eu já vi pessoas enaltecendo a
importância da fidelidade conjugal após chegar de um motel com a amante.
Mas isso não faz todos nós canalhas, apenas aqueles que assim agem. Tal
generalização é injusta e perigosa. Não nego que exista no Brasil uma
permissividade grande com “malfeitos”, mas tenho alguns pontos a
colocar: 1) nem todos agem assim, então vamos valorizar os mais éticos e
condenar os demais; 2) há claramente gradações em “malfeitos”, e é
preciso separar o joio do trigo, os casos mais banais daqueles que
afetam mais gente e causam estrago muito maior; 3) o fato de muita gente
relativizar a questão ética é justamente parte da explicação de por que
o PT está no poder há tanto tempo; 4) espera-se que o exemplo venha de
cima sim, ou seja, nada pior para a degradação moral do que as
autoridades e as elites agindo de forma totalmente antiética.
Janine pode tentar aliviar a barra de
Dilma e do PT junto, mas não vai conseguir. A realidade salta aos olhos
de quem ainda os têm abertos. Dilma é péssima presidente pois é uma
gestora incompetente, arrogante, inflexível com sua ideologia
ultrapassada nacional-desenvolvimentista, incapaz de escutar os outros e
admitir seus inúmeros erros, autoritária e grosseira com críticos.
Além disso, faz parte de um partido que é
simplesmente o mais imoral de todos, e o faz em silêncio, ou seja,
cumplicidade. A Dilma que não tolera malfeitos é um mito, uma construção
de marketing, um engodo. Atribuir à suposta rigidez ética seus
problemas de governança, como tenta Janine, é simplesmente ridículo.
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