Medidas propostas pelo governo são inviáveis e perigosas, dizem especialistas
TATIANA FREITAS - FSP
A maior parte das medidas oferecidas pelo governo para os caminhoneiros
desbloquearem as estradas é difícil de ser implementada, dizem
especialistas e integrantes do setor consultados pela Folha.
O principal entrave está na criação de uma tabela referencial de fretes,
que levaria a preços mínimos pelo serviço. Hoje, esse valor muda de
acordo com a oferta e a demanda pelo transporte.
"O mercado de frete rodoviário é muito próximo à concorrência perfeita.
Será muito difícil estipular um valor mínimo", diz Thiago Péra,
coordenador do grupo de pesquisa e extensão em logística agroindustrial
da Esalq-USP.
Uma experiência recente em Mato Grosso exemplifica a dificuldade no
tabelamento. No início deste ano, a ATC (Associação de Transportes de
Cargas de Mato Grosso) criou um balizador referencial de fretes, com
valores mínimos para as principais rotas.
Não deu certo. Empresas transportadoras que já tinham contrato com as
tradings realizaram o transporte pelos preços já acordados
anteriormente, e outros transportadores, ociosos, acabaram reduzindo os
seus valores abaixo da tabela.
Segundo Péra, dificuldades em fiscalizar o cumprimento da tabela também torna inviável o tabelamento.
"O contratante também tem de estar de acordo com isso", lembra. E não é o caso.
As tradings, responsáveis pelo transporte de grãos, foram totalmente
contrárias ao tabelamento em Mato Grosso, assim como os produtores, que
são os mais prejudicados com essa prática.
"Quanto maior é o frete, menor é a rentabilidade do produtor", diz Edeon
Vaz Ferreira, do Movimento Pró-logística da Aprosoja. Ao fazer o
pagamento aos agricultores, as tradings descontam o valor do frete. Por
isso, em momentos de queda no preço das commodities, fica mais difícil a
negociação.
SONO
A isenção da cobrança de pedágio por eixo suspenso, prevista no projeto
de lei que propõe mudanças na lei do caminhoneiro, também é de difícil
implementação.
A ABCR (Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias) diz que os
caminhões não poderão mais usar o pagamento eletrônico nos pedágios,
exigindo paradas constantes nas cabines para verificação dos eixos.
Segundo a entidade, isso acarretará em aumento do tempo de viagem dos motoristas e demais usuários.
Além disso, a ampliação da jornada dos motoristas aumenta o risco de
acidentes, segundo Marco Túlio Mello, especialista em sono e professor
da Universidade Federal de Minas Gerais.
"O mais preocupante é a autorização para dirigir cinco horas e meia sem
parar. Para que não se perca a atenção, é recomendado descanso a cada
três horas", diz o especialista, que faz pesquisas com motoristas desde
1993.
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