Tim Arango - NYT
Apesar da assistência militar reforçada ao Iraque para combater os militantes do Estado Islâmico, e o compromisso público do presidente Barack Obama de manter o Iraque unido, os iraquianos há muito suspeitam de um plano nefasto pelos americanos para dividir seu país.
A
suspeita deles é intensificada por um século de experiência dolorosa com
intervenção do Ocidente, grande parte dela recente, e é ornamentada
pelo fascínio cultural por conspirações de toda espécie. Assim, quando
surgiu a notícia nesta semana de que os republicanos no Congresso
americano estavam propondo armar diretamente os iraquianos sunitas e
curdos sem o envolvimento do governo central liderado pelos xiitas, isso
foi imediatamente entendido como prova de que o plano americano contra o
Iraque entrou em uma nova fase.
A primeira página de um jornal iraquiano mostrava na quinta-feira um mapa do país, envolto em uma corrente para simbolizar os grilhões dos Estados Unidos e dividido em três nações: Xiastão, Sunistão e o Curdistão. A manchete em tinta vermelha dizia: "Congresso propõe lidar com curdos e sunitas como dois Estados".
A tempestade de ultraje iraquiano com a proposta, parte da versão republicana de um projeto de lei de autorização de defesa, fez os diplomatas americanos suarem para assegurar aos iraquianos que os Estados Unidos ainda estão comprometidos com um país unificado sob um governo nacional.
"A política americana em relação ao Iraque não mudou", dizia uma declaração da embaixada americana para os órgãos de imprensa iraquianos. "Nós apoiamos um Iraque unificado. Toda nossa assistência militar e entrega de equipamentos é fornecida ao governo do Iraque e às forças de segurança iraquianas."
Notando que a proposta é apenas um projeto, não uma lei, a declaração concluiu: "A política externa americana é determinada pelo presidente".
Apesar da proposta como foi redigida aparentemente não ter nenhuma chance de sobrevivência, a reação demonstra a dificuldade americana muito real para manter a influência no Iraque.
Para grande parte da maioria xiita do Iraque, os recentes meses de progresso pelas milícias apoiadas pelos iranianos no combate ao Estado Islâmico aumentaram o sentimento de que o Irã, e não os Estados Unidos, é o aliado mais confiável. Apesar de muitas dessas vitórias terem ocorrido com a ajuda de assistência financeira e poder aéreo americano, os xiitas ainda veem o Irã como seu protetor essencial.
Um conselheiro do presidente Hassan Rouhani do Irã refletiu recentemente sobre a crescente influência do país na região - obtida por meio de representantes no Iraque, Líbano, Síria e Iêmen - e chamou Bagdá de capital de um novo império persa. O comentário provocou alguma controvérsia dentro do Iraque, mas longe da revolta gerada pela proposta do Congresso de armar os sunitas.
Outra manchete iraquiana na quinta-feira, referindo-se a uma antiga proposta feita pelo vice-presidente Joe Biden como senador para dividir o Iraque em três regiões autônomas, dizia: "Projeto de Biden se torna real e faca está cortando nossos membros". Talk shows, veículos de notícias, clérigos e autoridades do governo, todos ficaram preocupados com o assunto.
Um porta-voz do deputado Mac Thornberry, republicano do Texas e presidente do Comitê de Serviços Armados da Câmara, que foi o autor da proposta, insistiu que a intenção não era interferir na soberania do Iraque. Mas ele não recuou na proposta, que pede que os curdos e sunitas iraquianos sejam tratados cada um como um "país" para estarem de acordo com as leis americanas de ajuda militar direta. O porta-voz forneceu os comentários feitos por Thornberry em uma reunião do comitê, nos quais ele disse: "O comitê não visa tomar decisões internas pelos iraquianos e sua soberania".
No Iraque, alguns sunitas apreciaram a proposta. Dhafar al-Aani, um político sunita, disse que os americanos deveriam dar assistência direta aos sunitas porque o governo iraquiano não está disposto a fazê-lo.
Mas armar diretamente os sunitas é uma ideia à qual a maioria xiita do Iraque é contra, acreditando que seria uma violação da soberania iraquiana e poderia alimentar a violência sectária, ao formar um exército sunita que poderia se voltar contra o governo.
Legisladores iraquianos formaram comitês na quinta-feira no Parlamento para explorar a questão e elaborar uma lei que proibiria a poderes externos fornecer armas a qualquer facção sem a aprovação de Bagdá.
Em uma declaração, o primeiro-ministro do Iraque, Haider al-Abadi, disse: "Qualquer armamento será feito apenas por meio do governo iraquiano" e acrescentou que se a proposta virar lei, isso levaria a "mais divisões" entre o Iraque e os Estados Unidos.
Ammar al-Hakim, um clérigo xiita e líder político como chefe do Conselho Islâmico Supremo do Iraque, viu a proposta como um esforço americano para redesenhar o mapa do Oriente Médio, assim como a França e o Reino Unido fizeram após a Primeira Guerra Mundial. "O Iraque determinará as fronteiras do novo Oriente Médio", ele disse.
Ao mesmo tempo, Muqtada al-Sadr, um clérigo xiita cuja milícia já combateu os americanos, ameaçou violência. Em uma declaração, ele disse que os Estados Unidos estavam preparando a divisão do Iraque e que se isso ocorrer, ele reativaria sua milícia parra "visar os interesses americanos no Iraque e fora do Iraque, se possível".
Mesmo enquanto autoridades americanas buscavam conter a controvérsia, ela acentuou uma questão que é central para a política americana no Iraque: como armar e apoiar as tribos sunitas para combater o Estado Islâmico. Os americanos pressionaram o governo do Iraque, liderado pelos xiitas, para fornecer mais armas e treinar os combatentes tribais sunitas, basicamente recriando o programa liderado pelos Estados Unidos vários anos atrás que ajudou a pacificar o país, ao pagarem para os sunitas mudarem de lado na luta contra a Al Qaeda no Iraque.
Mas os esforços do governo iraquiano para armar as tribos sunitas foram mínimos. Al-Abadi sugeriu estar disposto a fazê-lo, mas ele é restringido pelos xiitas linhas-duras, muitos dos quais têm fortes elos com o Irã.
A questão cristalizou nas últimas semanas à medida que o governo iraquiano buscava realizar uma ofensiva contra o Estado Islâmico na província de Anbar, dominada pelos sunitas. A campanha ali estagnou, à medida que o exército iraquiano provou ser em grande parte ineficaz.
Em outros campos de batalha, como Tikrit, que foi recentemente retomada dos militantes, as forças mais eficazes em solo foram as milícias xiitas, algumas das quais sob controle do Irã, enquanto outras são mais diretamente controladas pelo governo. A presença de milícias em Anbar, temem as autoridades americanas, poderia ser contraproducente e ajudar a instigar divisões sectárias.
Tradutor: George El Khouri Andolfato
A primeira página de um jornal iraquiano mostrava na quinta-feira um mapa do país, envolto em uma corrente para simbolizar os grilhões dos Estados Unidos e dividido em três nações: Xiastão, Sunistão e o Curdistão. A manchete em tinta vermelha dizia: "Congresso propõe lidar com curdos e sunitas como dois Estados".
A tempestade de ultraje iraquiano com a proposta, parte da versão republicana de um projeto de lei de autorização de defesa, fez os diplomatas americanos suarem para assegurar aos iraquianos que os Estados Unidos ainda estão comprometidos com um país unificado sob um governo nacional.
"A política americana em relação ao Iraque não mudou", dizia uma declaração da embaixada americana para os órgãos de imprensa iraquianos. "Nós apoiamos um Iraque unificado. Toda nossa assistência militar e entrega de equipamentos é fornecida ao governo do Iraque e às forças de segurança iraquianas."
Notando que a proposta é apenas um projeto, não uma lei, a declaração concluiu: "A política externa americana é determinada pelo presidente".
Apesar da proposta como foi redigida aparentemente não ter nenhuma chance de sobrevivência, a reação demonstra a dificuldade americana muito real para manter a influência no Iraque.
Para grande parte da maioria xiita do Iraque, os recentes meses de progresso pelas milícias apoiadas pelos iranianos no combate ao Estado Islâmico aumentaram o sentimento de que o Irã, e não os Estados Unidos, é o aliado mais confiável. Apesar de muitas dessas vitórias terem ocorrido com a ajuda de assistência financeira e poder aéreo americano, os xiitas ainda veem o Irã como seu protetor essencial.
Um conselheiro do presidente Hassan Rouhani do Irã refletiu recentemente sobre a crescente influência do país na região - obtida por meio de representantes no Iraque, Líbano, Síria e Iêmen - e chamou Bagdá de capital de um novo império persa. O comentário provocou alguma controvérsia dentro do Iraque, mas longe da revolta gerada pela proposta do Congresso de armar os sunitas.
Outra manchete iraquiana na quinta-feira, referindo-se a uma antiga proposta feita pelo vice-presidente Joe Biden como senador para dividir o Iraque em três regiões autônomas, dizia: "Projeto de Biden se torna real e faca está cortando nossos membros". Talk shows, veículos de notícias, clérigos e autoridades do governo, todos ficaram preocupados com o assunto.
Um porta-voz do deputado Mac Thornberry, republicano do Texas e presidente do Comitê de Serviços Armados da Câmara, que foi o autor da proposta, insistiu que a intenção não era interferir na soberania do Iraque. Mas ele não recuou na proposta, que pede que os curdos e sunitas iraquianos sejam tratados cada um como um "país" para estarem de acordo com as leis americanas de ajuda militar direta. O porta-voz forneceu os comentários feitos por Thornberry em uma reunião do comitê, nos quais ele disse: "O comitê não visa tomar decisões internas pelos iraquianos e sua soberania".
No Iraque, alguns sunitas apreciaram a proposta. Dhafar al-Aani, um político sunita, disse que os americanos deveriam dar assistência direta aos sunitas porque o governo iraquiano não está disposto a fazê-lo.
Mas armar diretamente os sunitas é uma ideia à qual a maioria xiita do Iraque é contra, acreditando que seria uma violação da soberania iraquiana e poderia alimentar a violência sectária, ao formar um exército sunita que poderia se voltar contra o governo.
Legisladores iraquianos formaram comitês na quinta-feira no Parlamento para explorar a questão e elaborar uma lei que proibiria a poderes externos fornecer armas a qualquer facção sem a aprovação de Bagdá.
Em uma declaração, o primeiro-ministro do Iraque, Haider al-Abadi, disse: "Qualquer armamento será feito apenas por meio do governo iraquiano" e acrescentou que se a proposta virar lei, isso levaria a "mais divisões" entre o Iraque e os Estados Unidos.
Ammar al-Hakim, um clérigo xiita e líder político como chefe do Conselho Islâmico Supremo do Iraque, viu a proposta como um esforço americano para redesenhar o mapa do Oriente Médio, assim como a França e o Reino Unido fizeram após a Primeira Guerra Mundial. "O Iraque determinará as fronteiras do novo Oriente Médio", ele disse.
Ao mesmo tempo, Muqtada al-Sadr, um clérigo xiita cuja milícia já combateu os americanos, ameaçou violência. Em uma declaração, ele disse que os Estados Unidos estavam preparando a divisão do Iraque e que se isso ocorrer, ele reativaria sua milícia parra "visar os interesses americanos no Iraque e fora do Iraque, se possível".
Mesmo enquanto autoridades americanas buscavam conter a controvérsia, ela acentuou uma questão que é central para a política americana no Iraque: como armar e apoiar as tribos sunitas para combater o Estado Islâmico. Os americanos pressionaram o governo do Iraque, liderado pelos xiitas, para fornecer mais armas e treinar os combatentes tribais sunitas, basicamente recriando o programa liderado pelos Estados Unidos vários anos atrás que ajudou a pacificar o país, ao pagarem para os sunitas mudarem de lado na luta contra a Al Qaeda no Iraque.
Mas os esforços do governo iraquiano para armar as tribos sunitas foram mínimos. Al-Abadi sugeriu estar disposto a fazê-lo, mas ele é restringido pelos xiitas linhas-duras, muitos dos quais têm fortes elos com o Irã.
A questão cristalizou nas últimas semanas à medida que o governo iraquiano buscava realizar uma ofensiva contra o Estado Islâmico na província de Anbar, dominada pelos sunitas. A campanha ali estagnou, à medida que o exército iraquiano provou ser em grande parte ineficaz.
Em outros campos de batalha, como Tikrit, que foi recentemente retomada dos militantes, as forças mais eficazes em solo foram as milícias xiitas, algumas das quais sob controle do Irã, enquanto outras são mais diretamente controladas pelo governo. A presença de milícias em Anbar, temem as autoridades americanas, poderia ser contraproducente e ajudar a instigar divisões sectárias.
Tradutor: George El Khouri Andolfato
Nenhum comentário:
Postar um comentário