domingo, 30 de agosto de 2015

Porto-riquenhos que buscam vida nova transformam região da Flórida
Lizette Alvarez Kissimmee - TINYT
Jacob Langston/The New York Times
Fotografias de Porto Rico decoram parede do café Melao Bakery, em Kissimmee (EUA) Fotografias de Porto Rico decoram parede do café Melao Bakery, em Kissimmee (EUA)
Quando Manuel Hernandez, um professor em Porto Rico, analisou os motivos para ficar em seu país ou se arriscar junto à crescente diáspora porto-riquenha na Flórida Central (EUA), esta não foi uma decisão difícil.
"Eu estava farto", disse Hernandez sobre sua vida em San Juan, "e minha mulher estava farta, as frustrações estavam se acumulando".
Então, em outubro, Hernandez desceu do avião e chegou aqui, um lugar mais conhecido por receber rodeios e o Mickey Mouse, mas também cada vez mais visto como um subúrbio distante de Puerto Rico, uma tendência que se acelerou à medida em que a economia da ilha afunda num atoleiro.
A Flórida agora está prestes a superar Nova York como o Estado com mais porto-riquenhos --perto de 1 milhão, de acordo com o Centro de Estudos Porto-riquenhos na Universidade da Cidade de Nova York. Cerca de 400 mil porto-riquenhos se instalaram na região de Orlando, e segundo algumas estimativas, milhares continuam a chegar todo mês, um aumento acentuado em relação a uma década atrás.
Nem todos os recém-chegados vêm da ilha; um grande número também chega do nordeste e de Chicago, lugares que eles trocam pelo clima quente e pelo custo de vida mais barato da Flórida Central.
A migração --a terceira e maior onda daqui em quatro décadas e que começou há vários anos-- está transformando um corredor da Flórida Central, que cada vez mais é visto como uma região economicamente poderosa, culturalmente diversa e politicamente importante.
"Porto Rico tem 78 municípios", disse Art Otero, comissário da cidade de Kissimmee, que nasceu em San Juan e está concorrendo a prefeito aqui, enquanto se sentava em meio ao alvoroço da Melao Bakery, um lugar popular para comer mallorcas, o pão doce porto-riquenho polvilhado com açúcar. "Agora eles dizem que nós seremos o 79º".
Como cidadãos norte-americanos, os porto-riquenhos da ilha, que geralmente são a favor dos democratas, mas têm menos consciência partidária do que seus irmãos do continente, podem se registrar para votar com facilidade. E nas últimas duas eleições presidenciais, eles compareceram às urnas em grande número, ajudando as vitórias do presidente Barack Obama na Flórida. Mas eles também ajudaram a eleger o governador Charlie Crist quando ele era republicano.
Sua participação nas urnas e disposição para considerar ambos os partidos faz deles um grupo altamente cobiçado, um voto indeciso crucial no maior Estado indeciso do país.
"Há um grande número de independentes e de pessoas que votam no carisma dos candidatos, as filiações partidárias não significam muito para eles", disse Edwin Meléndez, diretor do Centro de Estudos Porto-riquenhos, que analisou os dados mais recentes do censo sobre a migração recente. "O voto porto-riquenho aqui não é simplesmente capturado por um dos partidos. Os candidatos precisam conversar conosco."
O número cada vez maior de porto-riquenhos --cerca de 15% da população da área em 2013-- também facilitou sua organização e mobilização em torno de questões que afetam Porto Rico, entre elas a pressão pela igualdade do Medicare e Medicaid na ilha, e por mudanças para aliviar as dívidas por meio de leis de falência.
E eles estão gradualmente ganhando uma posição política própria em comissões locais e no Legislativo estadual, onde há seis deputados de ascendência porto-riquenha, metade deles republicanos. Um senador do Estado, Darren Soto, está concorrendo a uma cadeira vaga no Congresso.
A marca porto-riquenha sobre a cultura e o trabalho da região é inconfundível. Normalmente bilíngue em diferentes graus, os porto-riquenhos costumam ser contratados para trabalhar como médicos, professores e engenheiros, mas também para trabalhar na Disneylândia e em hotéis.
Há apenas dois anos, a Administração de Assuntos Federais de Porto Rico, vendo o crescimento da população, abriu um escritório aqui para ajudar os porto-riquenhos a se estabelecerem na área.
Restaurantes que servem mofongo [prato típico] não são mais difíceis de encontrar nesta cidade outrora tranquila, onde a Disneylândia foi construída sobre um pântano. Universidades e empresas porto-riquenhas, incluindo as especializadas em alimentos, aviação e ensino de línguas, também estão se mudando para a área para atender os recém-chegados.
Mas a onda de porto-riquenhos nem sempre faz uma transição fácil.
Na pressa de se mudar para a área de Orlando, às vezes surgem complicações, principalmente para aqueles que não têm nenhum trabalho a sua espera, nenhum convite de parentes e dinheiro insuficiente para se virar. Encontrar moradia a preços acessíveis na área, onde os alugueis são mais caros do que em Porto Rico, e antecipar depósitos podem ser um problema para muitos.
Alguns porto-riquenhos se veem vivendo de semana a semana nos motéis baratos que se enfileiram na principal avenida de Kissimmee, porque esta é a única opção, diz Otero.
E muitos percebem que seu inglês, embora fosse passável em Porto Rico, precisa ser refinado aqui, tornando difícil de encontrar empregos, disse Betsy Franceschini, chefe do escritório da Administração de Assuntos Federais de Porto Rico aqui. Seu conselho: fazer aulas de inglês.
As histórias de pessoas fazendo as malas e voltando para Porto Rico parecem estar aumentando, disse ela.
"Aqueles que planejam têm mais sucesso", disse ela. "É um choque para os que não pesquisam antes."
Mesmo quando alguém chega com um bom trabalho e inglês perfeito, a transição pode ser complicada. Hernandez, que foi recrutado em Porto Rico, onde treinava professores para trabalhar para a Osceola High School por causa de sua especialidade no ensino de inglês, terminou primeiro dividindo um trailer com um estranho, depois em dois motéis (inclusive um com percevejos na cama) com sua esposa e filho. Ele disse que outros porto-riquenhos também estavam morando em motéis.
Seu emprego na Osceola surgiu inesperadamente, e ele tinha acabado de voltar de férias caras de carro com sua família, deixando pouco dinheiro para fazer um depósito de aluguel. Por fim, ele recebeu ajuda por meio de um programa chamado Famílias em Transição.
"As condições de vida eram horríveis no motel", disse Hernandez, que é originalmente de Nova York e participou de uma palestra TEDx sobre ensino de inglês como segunda língua.
Mas voltar para Porto Rico, onde sua carreira parecia estar congelada, não há aumentos salariais e os impostos estavam subindo, pareceu impensável.
Agora, ele está em um "belo apartamento" de dois quartos em frente à escola, e a família está se estabelecendo muito bem e sua carreira como professor brilha com promessa.
"Eu realmente acredito que estou no lugar certo na hora certa", disse ele.

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