sábado, 31 de outubro de 2015

Os dez pontos que mais preocupam os espiões dos EUA
Joan Faus - El País
SAUL LOEB/AFP
Na porta do auditório Lisner da Universidade George Washington, na manhã da última terça-feira (27), havia uma fila de carros 4x4 pretos com vidros escuros e antenas no teto. Dentro do prédio, a nata das agências de espionagem e segurança dos EUA discutia os desafios de sua profissão.
As mesas-redondas atraíram centenas de especialistas, estudantes e jornalistas. Em Washington há todo tipo de colóquio diário com a participação de altos cargos, mas raramente abordam assuntos cercados de opacidade como a espionagem.
Este é o segundo ano consecutivo que a CIA (Agência Central de Inteligência na sigla em inglês) organiza jornadas universitárias sobre segurança nacional. Nos corredores do auditório foram distribuídos panfletos sobre as funções da CIA e oportunidades de emprego. Em uma pausa entre os debates, o diretor da agência, John Brennan, fazia fila tranquilamente em um café próximo, como qualquer estudante. De longe, dois agentes vigiavam seus movimentos.
Dez lições de uma jornada acadêmica com os chefes da espionagem dos EUA:

1. Reduzir a incerteza

"Por que realizamos (análises de) inteligência?", perguntou-se James Clapper, diretor da Inteligência Nacional, o órgão que reúne 16 agências de inteligência e departamentos do governo de Barack Obama. "Fazemos isso para reduzir a incerteza das pessoas que tomam decisões", respondeu.

2. O abalo sísmico da internet

Clapper disse que a expansão da internet alterou os "fundamentos" da obtenção de informações. Durante a Guerra Fria, explicou, havia duas redes claras de comunicação: a dos EUA e a da União Soviética. "Hoje todas as redes de internet e telecomunicações são globais e interconectadas", disse. "Nosso trabalho é muito mais difícil."

3. O alto-falante das redes sociais

Doug Wise, diretor-adjunto da Agência de Inteligência de Defesa, concentrou o efeito da internet na expansão das redes sociais. Disse que essas plataformas "canalizam" a ascensão do grupo jihadista Estado Islâmico (EI) e concedem oportunidades aos chamados atacantes solitários. "Dá vantagem a grupos que nunca teriam representado uma ameaça", salientou.

4. O melhor momento, o pior momento

"É o melhor momento para o papel da inteligência. Nunca fomos tão necessários", afirmou o almirante Mike Rogers, chefe do comando cibernético e diretor da Agência Nacional de Segurança (ANS, dedicada a perscrutar comunicações). Mas acrescentou: "É o pior dos momentos, porque a complexidade para executar as missões nunca foi mais difícil". Rogers disse que essa complexidade se alimenta da desconfiança na obtenção de inteligência por parte dos governos e dos cortes orçamentários.

5. A ameaça cibernética

Perguntado sobre que assunto o preocupa mais quando vai dormir, Brennan, o diretor da CIA, respondeu que é a ameaça de ataques cibernéticos. O chefe da agência de espionagem alertou sobre as "capacidades tremendas" de alguns países, grupos e indivíduos; e defendeu garantir que, diante de uma futura expansão da internet, exista a capacidade legal e de segurança necessária para repelir ataques.
Brennan reconhece esse perigo em primeira mão. Na semana passada, um estudante disse ter roubado informação de sua conta pessoal de e-mail. A organização Wikileaks publicou alguns dos e-mails subtraídos, que só incluíam informação pessoal, como números de Seguridade Social e de passaporte de seus familiares. "Estava indignado, preocupado com o que as pessoas fariam disso", disse Brennan nesta terça-feira sobre o roubo de informação.

6. Oriente Médio, um território mais difícil

Brennan disse que o Oriente Médio foi a região em que a CIA teve de modificar mais sua estratégia nos últimos cinco anos. As revoltas da Primavera Árabe, iniciadas em 2011, "transformaram totalmente a paisagem política, social e de segurança no Oriente Médio". O resultado: as instituições se enfraqueceram, a população perdeu a confiança nos governos e surgiram "fenômenos transnacionais" como o EI. "Estas circunstâncias tornam nosso trabalho, o dos EUA, muito mais difícil", afirmou.

7. O ressurgimento do Estado-nação

Rogers, diretor da ANS, afirmou que os órgãos de inteligência enfrentam um novo desafio: o "ressurgimento" de Estados-nações com ambições expansionistas, como Rússia e Irã. Rogers disse que é uma realidade que existiu em outros momentos da história, mas que agora irrompe depois de anos em que a principal ameaça eram grupos sem Estado, como a Al Qaeda.

8. O efeito Snowden

Os vazamentos jornalísticos em 2013 do ex-analista da ANS Edward Snowden revelaram os longos tentáculos da espionagem telefônica dos EUA a seus cidadãos e a políticos estrangeiros. A polêmica golpeou a imagem da ANS e propiciou reformas que limitaram a coleta de dados e ampliaram a transparência.
Clapper, o supervisor de todas as agências, salientou que os vazamentos custaram dados chaves de inteligência e que a ANS nunca violou a lei, mas admitiu que houve erros e disse que é vital manter a confiança da cidadania. Defendeu uma maior transparência e pedagogia que ressaltem a importância da espionagem e os "padrões éticos" com que ela opera.

9. O medo do erro

Ben Rhodes, assessor-adjunto de Segurança Nacional do presidente Obama, alertou sobre os riscos de uma cautela extrema das agências de inteligência. Diante do medo de não intuir possíveis ameaças, disse, "agora recebemos avisos de tudo. Há um perigo de superproteção diante de futuros erros".

10. Os métodos clássicos de inteligência

Rhodes defendeu o desenvolvimento tecnológico na obtenção de dados de inteligência, mas salientou que às vezes os métodos clássicos são mais eficazes. Por exemplo, explicou que os EUA detectaram uma virada no discurso político do presidente russo, Vladimir Putin, graças a análises feitas por pessoas que acompanham de perto a realidade russa. "Isso ofereceu uma melhor advertência estratégica que a tecnologia", enfatizou.
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves 

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