segunda-feira, 30 de novembro de 2015

É preciso acabar com a loucura de uma Europa sem fronteiras
Wolfgang Munchau - FT/DN
Uma das consequências inevitáveis dos atentados terroristas de Paris é a de que a França precisará de gastar mais em segurança, especialmente em serviços de informações. O mesmo irá acontecer com a maior parte dos Estados membros do espaço Schengen.
Schengen é o nome da zona em que se pode viajar sem passaporte e que é constituída por 26 países europeus, incluindo 22 Estados membros da UE. Na semana passada ficou claro que a rede de segurança que supostamente opera silenciosa e eficientemente nos bastidores de Schengen não está a funcionar. A morte de Abdelhamid Abaaoud durante uma rusga policial no subúrbio parisiense de Saint- -Denis foi, a um certo nível, um grande sucesso. A polícia apanhou o suspeito de terrorismo que coordenou este e outros atentados. A um outro nível, a sua morte foi também um choque desagradável. O que diz isto sobre Schengen quando um dos mais procurados criminosos à escala mundial foi capaz de se movimentar livremente entre a Síria, a França e a Bélgica? Isso não deveria ser possível.
Existem, em princípio, duas soluções: reformular o espaço Schen- gen ou reverter para os sistemas nacionais. As duas funcionam. A primeira seria economicamente eficiente, mas é difícil de concretizar politicamente. A segunda é politicamente mais fácil de executar, mas iria constituir um choque de despesa de escala macroeconómica para muitos países.
A reformulação do espaço Schengen teria de ir além da agenda pouco ambiciosa dos ministros da Justiça e da Administração Interna que se reuniram na passada sexta-feira para discutir algumas propostas de ordem prática. O problema com Schengen é que dentro de poucas semanas terá per- dido o seu maior trunfo - a confiança da população. O presidente François Hollande claramente não confiou no sistema. Por que outra razão teria ele restabelecido os controlos fronteiriços?
Para Schengen recuperar a confiança, o controlo da fronteira externa comum teria de ser feito pelos padrões dos melhores dos Estados membros e não a um qualquer ilusório nível médio da UE. A UE dirige uma agência, a Frontex, com sede em Varsóvia, encarregada da coordenação da política e da manutenção de padrões. Mas, fundamentalmente, no espaço Schengen cada país é responsável por manter os seus próprios controlos nas fronteiras externas. A fronteira externa da Grécia, por exemplo, também faz parte das fronteiras externas comuns do espaço Schengen.
A Frontex não tem os recursos sequer para fazer o seu trabalho adequadamente, muito menos para atuar como unidade de controlo fronteiriço a nível federal, que é o que é verdadeiramente necessário. A América tem os Serviços de Cidadania dos EUA e de Imigração, que fazem parte do Departamento de Segurança Interna, e a Guarda Costeira dos EUA, que é um ramo das Forças Armadas. Na Europa, contamos com funcionários públicos que passam informações uns aos outros. Ou não - como se viu.
A UE vai mexer com Schengen, mas não o vai corrigir. Parece familiar? Quando a crise da zona euro começou, algumas medidas corajosas tê-la-iam resolvido. Mas não havia maioria política para uma solução a nível federal para as crises da banca e da dívida soberana. Porque haviam os líderes da UE de fazer a coisa certa em relação a Schengen, quando não o conseguiram fazer relativamente à zona euro?
A alternativa seria permitir que Schengen se desvanecesse, para reverter para os sistemas nacionais e implementar as mudanças necessárias a nível interno. Isto é o que eu espero que vá acontecer. Não é uma má opção. Ela irá funcionar porque os Estados membros têm ainda as suas infraestruturas de base montadas. É, claro, terrivelmente ineficiente que sejam 26 países a operar as suas próprias redes de informações e a policiar as suas fronteiras internas. Só a extensão das linhas de fronteira de França e da Alemanha é de cerca de 3000 km cada. A fronteira terrestre externa de todo o espaço Schengen é de apenas 8800 quilómetros. Se o puzzle se desfizer haverá muitos pedaços e peças e muitas arestas salientes. As fronteiras internas teriam de regressar.
Antes dos atentados, elas eram quase invisíveis. No comboio de Bruxelas para Paris era praticamente impossível perceber quando se mudava de país. Na autoestrada, um posto fronteiriço abandonado lembrava que em tempos tinha existido ali uma fronteira, seguida por uma tabuleta com o nome do país rodeado pelas 12 estrelas da União Europeia. Schengen transformou o bairro de Molenbeek de Bruxelas e o de Saint--Denis, no Norte de Paris, em bairros adjacentes. Os terroristas levavam a vida de passageiros suburbanos que viviam em Bruxelas e trabalhavam em Paris.
Uma vez que não vamos reformular Schengen, regressemos ao controlo das fronteiras nacionais. Vai sair muito caro, especialmente para França, que ainda tem de construir um serviço de segurança interna totalmente funcional.
Os custos serão de uma ordem de grandeza capaz de inviabilizar qualquer plano de orçamento e irão despertar a ira dos conta-dores de feijões da zona euro. A França deve invocar, unilateralmente, se necessário, a cláusula de uma circunstância excecional nos termos das regras orçamentais europeias.
O objetivo primordial deve ser o de preservar um dos bens comuns mais importantes que a UE pode proporcionar aos seus cidadãos: um nível moderno e profissional de segurança interna. Schengen não pode proporcionar isso. Mas os Estados membros ainda podem, e devem ser autorizados a fazê-lo.

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