Goleiro Bruno, o culpado-inocente, é o personagem que reflete nossa época
Elio Gaspari - FSP
Depois que a Procuradoria-Geral da República soltou a lista de fregueses
dos capilés da Odebrecht, surgiram doutrinadores do direito e da
ciência política defendendo uma anistia dos envolvidos e um narcótico
eleitoral que lhes assegure os mandatos sem que precisem pedir votos. Se
der, inocenta-se o culpado e criminaliza-se quem o acusa.
Nesses mesmos dias, ouviu-se outra voz. Ela merece atenção porque diz o seguinte:
Sobre seu crime:
"É um erro que talvez eu tenha cometido. Erros acontecem na vida."
Qual foi seu erro?
"Não sei. A Justiça acha que sim. Eu acho que não. (...) O que passou, passou."
Você se arrepende?
"Quando as coisas têm que acontecer, acontecem. Quem somos nós para julgar os outros?"
O entrevistado do repórter Luiz Cosenzo é o doutor Bruno Fernandes de Souza, também conhecido como "Goleiro Bruno", condenado a 22 anos de prisão
pelo assassinato, em 2010, de Eliza Samudio, mãe de um de seus filhos. A
mulher foi sequestrada, sofreu sucessivos espancamentos e seu corpo
nunca foi encontrado. Bruno passou sete anos preso e espera em liberdade o julgamento de seu recurso.
Existem personagens do cotidiano que em determinados momentos refletem
uma época. Bruno é o culpado-inocente, vítima da fatalidade e da
injustiça: "Não sou bandido".
Em 2005, o Partido dos Trabalhadores, símbolo de uma nova moralidade
política, foi apanhado no mensalão. É dessa época a fama de Bruna
Surfistinha, uma moça que saltou da vida numa família de classe média
alta de São Paulo e foi para o mercado da prostituição de luxo. Seu
livro de lembranças foi um sucesso de vendas. Anos antes, quando a
ekipekonômika e o presidente Fernando Henrique Cardoso desvalorizaram o
real depois de atravessar uma campanha eleitoral dizendo que isso não
aconteceria, o país encantou-se com a Tiazinha, do programa do Luciano
Huck. Era uma gostosona mascarada que empunhava um chicote. Antes dela, o
Brasil foi para a rua em 1984, pedindo eleições diretas. Elegeu
Tancredo Neves pelo sistema indireto e empossou José Sarney, um veterano
cacique da base de apoio da ditadura. Nesse cenário, a estrela da hora
chamava-se Roberta Close, um travesti cor de jambo que hoje mora na
Suíça.
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