Benjamin Barthe e Guillaume Perrier - Le Monde
Seria uma versão síria de Davi contra Golias. No início da semana, indo no sentido contrário do regime Assad, que concentrava seus esforços na retomada de controle da zona fronteiriça com o Líbano, brigadas rebeldes avançaram pelas colinas turcomenas, ao sul da fronteira com a Turquia.
Com a cobertura tácita do Exército turco, que abateu um avião de caça sírio e deixou que eles passassem por seu território, os insurgentes, pela primeira vez, alcançaram a margem mediterrânea. Mas esse avanço, que interrompeu uma série de reveses preocupantes para a oposição, já parece estar desacelerando, em razão do poder de fogo amplamente superior do lado lealista.
Na quinta-feira (27), fiel a uma de suas táticas contra-insurrecionais preferidas, a aviação síria jogou barris de explosivos sobre o Observatório 45, uma colina estratégica próxima do vilarejo de Kastal Maaf. Segundo uma fonte militar síria, citada pela Agence France Presse (AFP), os bombardeios forçaram os rebeldes a abandonarem esse ponto elevado que domina a província de Latakia, a terra ancestral do clã Assad. Paralelamente, o Exército regular bombardeava os arredores de Kassab, um vilarejo armênio, muito próximo da Turquia, do qual insurgentes se apoderaram no domingo, ao mesmo tempo que um posto fronteiriço.
"O moral dos revolucionários foi novamente elevado"
Segundo Rami Abdel Rahmane, do Observatório Sírio dos Direitos Humanos, Damasco mobilizou milhares de soldados e de milicianos, buscando dentro da comunidade alauíta, a religião do clã Assad, dominante na região de Latakia. O governo sírio, que aos poucos vai tomando as posições rebeldes desde a queda de Qusair, em junho de 2013, não pode deixar seus adversários se estabelecerem em seu santuário sem reagir com veemência. Ainda mais que um parente de Bashar al-Assad, Hilal al-Assad, chefe dos comitês de defesa nacional, um grupo paramilitar alauíta, foi morto nos combates de Kassab."O regime está furioso", diz Rania Kisar, uma militante anti-Assad, de passagem por Paris. "Ele enviou vários reforços para a costa. Isso vai diminuir a pressão sobre as outras frentes. O moral dos revolucionários voltou a se elevar com essa ofensiva-surpresa."
O analista político Radwan Ziadeh, membro do governo interino criado pela oposição, está nitidamente menos empolgado. "Existe uma pressão popular muito forte para levar o combate para as terras de Assad. Mas como o regime controla o espaço aéreo, o ataque não irá longe. Além disso, em um terreno como o de Latakia, povoado por inúmeras minorias, é grande o risco de que as coisas saiam de controle. É uma estratégia de visão curta."
Em agosto de 2013, combatentes do grupo jihadista Estado Islâmico no Iraque e no Levante (EIIL) já haviam se infiltrado no interior de Latakia. Antes que a contraofensiva das forças governamentais os expulsasse, os jihadistas executaram cerca de 200 civis alauítas, segundo a Human Rights Watch, entre eles mulheres e crianças.
800 famílias teriam fugido com a chegada dos rebeldes
Dessa vez, o ataque está sendo conduzido pela Frente Al-Nusra, uma outra formação jihadista, afiliada à Al Qaeda, mas mais aceita nos meios da oposição, bem como por outros grupos islamitas. Atacado por seus rivais no início do ano, o EIIL se refugiou duas semanas atrás em seu reduto de Rakka, no leste sírio.E conseguirão os homens da Al-Nusra evitar os abusos sectários? Para esses radicais, os armênios e alauítas, além de serem suspeitos de apoiar o regime, são considerados hereges. A guerra de vídeos e depoimentos contraditórios começou, já um grande clássico do conflito sírio. Um armênio de Kassab, entrevistado por telefone em Latakia, onde se refugiou, afirma que 800 famílias fugiram com a chegada dos rebeldes.
Ele afirma que foram disparadas granadas da Turquia e que casas e uma igreja foram saqueadas. Nesse vilarejo, que sobreviveu ao genocídio de 1915, é possível ver a mão de Ancara por trás dos ataques dos jihadistas. Mas um vídeo, gravado por um militante presente ao lado dos agressores, mostra uma igreja intacta. "Nós somos diferentes do EIIL", afirma um rebelde entrevistado pela AFP. "Não temos problemas com as comunidades religiosas. Só queremos que o regime vá embora."
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