Lucas Berlanza - Instituto Liberal
É inevitável deduzir que nossos padrões
de exigência, diante do nível de nossas figuras públicas e dos
escândalos colossais que temos presenciado, estão baixos demais. O
mínimo do mínimo que se poderia esperar daqueles que ocupam funções de
governo seria que não insultassem o povo sobre o qual exercem seus
mandatos e cargos. Diante disso, não consigo entender por que a ministra
dos Direitos Humanos, Luislinda Valois, do PSDB, ainda está à frente da
pasta.
Que o ministério de Direitos Humanos é
apenas uma grande futilidade para alojar apaniguados e satisfazer os
aliados políticos, já sabemos. Da mesma forma por que o Ministério da
Cultura existe apenas para amenizar a pressão das esquerdas, graças a um
vexatório recuo do presidente Michel Temer ao começo de seu governo. No
entanto, se existem complicações políticas para simplesmente abolir
esse “enfeite para socialista ver” da máquina pública, ao menos o nosso
mandatário maior ou mesmo os próprios tucanos deveriam pôr a mão na
consciência e mandar embora essa inigualável senhora.
Sim, inigualável. Já tivemos de tudo
neste país; Dilma Rousseff esteve por aí no Planalto para provar, e ela é
páreo duro – na verdade, hors concours pelo conjunto da obra.
Acredito, porém, mesmo sob o risco de cometer um erro de juízo pela
proximidade temporal, que a declaração de Luislinda foi a bizarrice
desrespeitosa mais absurda, surreal, folclórica, descabida, revoltante,
repugnante, ridícula, fora de propósito (se lembrar outro adjetivo,
coloco aqui) já vista. É difícil encontrar palavras para convencer a mim
mesmo, enquanto escrevo estas linhas, de que isso realmente ocorreu e
ela efetivamente disse o que sabemos que ela disse.
Se você esteve fora de órbita e não
ficou sabendo desta pérola, saiba que, acredite se quiser, a senhora
ministra do seu país lindo de meu Deus encaminhou ao governo um pedido
para acumular seu salário no cargo com o de desembargadora aposentada,
totalizando R$ 61,4 mil, o que estaria acima do teto permitido pela
Constituição aos funcionários públicos. O salário medíocre de R$ 33,7
mil, segundo ela, mesmo sendo equivalente ao de um ministro do Supremo
Tribunal Federal (STF), seria “sem sombra de dúvidas” similar ao “trabalho escravo” (!!!!).
Isso porque, coitada, como ministra, ela precisa de dinheiro para estar
“trajada dignamente”, bem vestida, e este valor não é suficiente para
tal.
Ainda olho para o parágrafo que acabei
de escrever e tenho dúvidas da minha própria sanidade. Será que estou
imaginando tudo isso? Gostaria de estar. Infelizmente, parece não ser o
caso. O acúmulo esdrúxulo de privilégios no alto funcionalismo público, a
perpetuação histórica de uma cultura patrimonialista, a cisão de
imaginário e valores entre uma estranha elite contemporânea e o povo,
todos esses elementos já são uma constante nas análises sobre a história
da sociedade brasileira e seus costumes e vida política. Acredito que a
senhora Luislinda inaugurou um novo capítulo épico mais inacreditável
que os anteriores. É como se vários monstros gigantes de Power Rangers
se juntassem em um só. Pelo amor de Deus!
Essa senhora não ofendeu apenas o povo
brasileiro, que se esforça exorbitantemente todo ano até junho só para
destinar seus rendimentos ao Estado sob a forma de nossos impostos
abusivos, sustentando os luxos de gente como Valois. Não ofendeu apenas
nossos empreendedores que dignamente desafiam o Leviatã para tentar
manter, a duras penas, seus negócios de pé.
Caras pálidas, essa mulher conseguiu contrair uma autêntica dívida histórica!
Para eu usar nessa situação um conceito que sempre neguei existir, é
porque realmente me faltam expressões razoáveis para me referir a ela.
Luislinda conseguiu ofender todos os escravos do Brasil e da história da Humanidade (!),
muitos dos quais, provavelmente, seus antepassados. Ganhar mais de R$
30 mil para ocupar um ministério é comparável, para ela, a viver na
senzala sem qualquer direito sobre a própria vida e sob risco de punição
com chibatadas. Luislinda está suplicando por um movimento
abolicionista para livrá-la de sua terrível condição? Joaquim Nabuco, Isabel, Patrocínio, Rebouças, João Alfredo se reviram nos túmulos.
O presidente Michel Temer se livrou das
denúncias no Congresso. Ainda pesam fortes suspeitas sobre sua lisura e
honestidade e ele continua sendo o peemedebista que avalizou os governos
de Dilma, mas no fim das contas será julgado após deixar o cargo e tem
um governo a conduzir apenas até 2019, no qual já empreendeu reformas
relevantes, a despeito de sua impopularidade e seu passado duvidoso. Sem
as delações da JBS e as investidas em geral pouco republicanas de Janot
pesando-lhe sobre o mandato como fantasmas, comenta-se que ele pretende
“relançar” sua plataforma, dirigindo-se mais objetivamente ao povo.
Poderia começar exonerando Luislinda.
Não adianta “pedir desculpas”. Uma pessoa que diz o que ela disse não
tem mais qualquer condição de ser respeitada pelo povo como ministra.
Diz-se que o governo deixou a escolha ao PSDB, e este decidiu que, caso
silencie de agora em diante, ela pode ficar. Uma vergonha quase tão
grande quanto as palavras de Luislinda. Fora, Luislinda!
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