quinta-feira, 4 de maio de 2017

Adaptação a seco 
FSP
Embora os olhos do país se voltem para o Planalto e as reformas em exame no Congresso, outro enredo digno de atenção —antigo e dramático— se desenrola no Nordeste: a seca. Seu espectro já ronda as capitais da região, normalmente pouco afetadas pela estiagem.
Com exceção de Teresina, sedes de governos nordestinos se localizam no litoral e recebem umidade do oceano. A precipitação em geral acima de 1.000 mm por ano as localiza fora do chamado semiárido, mas nem por isso se acham agora a salvo de grave crise hídrica.
No Grande Recife, 800 mil habitantes já enfrentam racionamento em Olinda, Abreu e Lima, Igarassu e Paulista. O rodízio implantado faz com que recebam água num dia e fiquem outros cinco sem ela.
A pior situação entre os reservatórios que abastecem a região metropolitana está no de Botafogo, com 12% da capacidade, e a melhor, no de Pirapama (36%). Se não chover o bastante até julho, o rodízio pode chegar à capital.
Em Salvador, que não tem racionamento há 45 anos, o reservatório Joanes 2 caiu para 9% e depende agora da transposição de água do de Pedra do Cavalo (24%).
O Castanhão, que garante boa parte da distribuição em Fortaleza, encolheu a 6% do volume usual. Medidas emergenciais asseguram água para domicílios, mas a cota da indústria já caiu 20%.
Assim como na Grande São Paulo, é prudente ir além das medidas de urgência, como recorrer ao chamado volume morto, e preparar-se para um cenário de escassez que pode tornar-se crônico. Em especial no Nordeste, que entra no seu sexto ano de estiagem.
Embora essa longa fase seca tenha precedido o forte fenômeno El Niño de 2015/16, este com certeza contribuiu para sustentá-la e alongá-la. O quadro ameaça complicar-se agora que a Organização Meteorológica Mundial calcula entre 50% e 60% a probabilidade de outro El Niño no segundo semestre.
A reedição dessa anomalia no oceano Pacífico em intervalo tão curto pode bem ser um efeito da mudança climática global. Qualquer que seja a causa, a perspectiva de El Niños mais frequentes recomenda investir mais recursos na adaptação da infraestrutura hídrica e urbana à nova realidade.
Para começar, há que reduzir o nível de perdas registrado no Nordeste. Cerca de 45% da água tratada e distribuída se esvai na rede, índice acima da média nacional de 37%. São 390 litros desperdiçados por dia em cada ligação, água que faz cada vez mais falta.

Nenhum comentário: