O
Ocidente chama de crise de refugiados ou questão humanitária. Mas os
islâmicos chamam de hégira. O que está em jogo na lei de imigração?
As verdadeiras questões em disputa na geopolítica, e mesmo na configuração do mundo de hoje, passam tão ao largo da intelligentsia moderna – políticos, jornalistas, analistas, professores e o circuito think tank – que não surpreende quando todos se surpreendem com um resultado que seria óbvio fora de seu jargão de educação técnica.
A lei de imigração, de autoria do atual
chanceler Aloysio Nunes (PSDB/SP), ex-motorista do terrorista Carlos
Marighella, é um caso de estudo gritante: poucos conhecem seus prováveis
resultados, raros entendem a dinâmica e quais são as forças em jogo,
mas quase todos estão prontos para empunhar declarações com fontes na
internet para, imediatamente, sacar o vocabulário do jornalismo e da
Academia, acreditando que estão vencendo preconceitos, e não
repetindo preconceitos socialmente aceitos, quando dizem que “nem todo
muçulmano é terrorista”, ou ainda venerando vocábulos cristalizados como
“islamofobia”.
Se a intelligentsia se recusa a usar termos com maior capacidade de descrever o que se passa no mundo, como jihad ou salafismo, que dirá até mesmo saber o que são questões fundamentais para o islamismo, mas menos “pop”, como saber o que é uma hégira.
A importância para o islam
Responda rápido: qual é o evento que
marca o início do calendário islâmico, aproximadamente em julho de 622
para o calendário juliano? Para os “não-preconceituosos” que apenas
conhecem a religião muçulmana em comparação ao cristianismo, a tentação
de responder algo como “o nascimento de Maomé” ou “o dia da revelação do
‘anjo Gabriel’ a Maomé” é quase carnal de tão sedutora, mas o início do
tempo sagrado do islamismo começa de outra forma: com a hégira – a imigração de Maomé de Meca para Medina.
Uma religião que marca o início de sua história com uma imigração,
na mais branda das hipóteses, possui uma relação com imigrações
indescritivelmente maior do que qualquer religião ou movimento político
em toda a história do planeta. Enquanto ocidentais, que do Corão e do
islamismo só conhecem os comentários da Globo News, falam em “crise de
refugiados” ou “questão humanitária” (termos que nem possuiriam uma
tradução aproximada em árabe), o que muçulmanos estão fazendo, mirando
no Ocidente, é seguir os passos de Maomé, pregando abertamente
uma hégira (hijra ou هجرة).
Quando Maomé afirma ter recebido a sua
“revelação” (em estado de transe, ao contrário de Maria, que responde
racionalmente) do suposto “anjo Gabriel”, começa uma pregação em Meca,
sua terra natal, importantíssimo entreposto comercial, tentando
“corrigir” o judaísmo e o cristianismo.
Naquilo que estudiosos do Corão
determinam como os mais antigos escritos de Maomé, o “profeta” ainda é
pacífico em relação a cristãos e judeus, “os povos do livro”, conforme o
linguajar islâmico. Sua proposta é praticamente reescrever a Bíblia,
sobretudo o Novo Testamento. Quem mais aparece nesse momento no Corão (e
em boa parte do livro inteiro) é Jesus, não negando seus milagres, seu
nascimento virginal, seu papel como profeta – mas negando sua mensagem,
quase como se proferisse o tempo todo: “Eu nunca disse tal coisa!”.
Blasfêmias pesadíssimas e imperdoáveis para a mentalidade islâmica, como dizer que é Filho de Deus (como Alá, que não criou o homem à sua imagem e semelhança, pode ter alguma familiaridade com um humano?!) ou, oh, horror,
que teria morrido numa cruz, algo que faria toda a teologia islâmica
perder o sentido, mas que ocidentais seculares nem fazem idéia do porquê
(vide nossos artigos Por que ateus devem comemorar o Natal e episódio Por que a esquerda adora muçulmanos do Guten Morgen, o nosso podcast).
Muçulmanos podem conviver com um tal de
Jesus que multiplica pães e ressuscita mortos, mas não com um que morreu
numa cruz, por isso costumam se focar não no aspecto messiânico (Kristos)
de Jesus, mas no seu local de nascimento, preferindo chamar cristãos de
“nazarenos”, até os marcando, em terras islâmicas, com a letra nuun (ن). Era tudo isso que o Corão buscava “corrigir”.
A
pregação de Maomé não foi bem aceita por cristãos e judeus, mas também
não por pagãos, que, pela visão da nova religião, não tinham nem mesmo
o status de sub-religiões, os “errados” que deveriam marcar sua inferioridade se convertendo, pagando o imposto da jizya (“oferecido”
apenas a cristãos e judeus). Meca, convoluta com a pregação de porta em
porta do nosso auto-intitulado “profeta”, pregando um Deus que não era
mais Verbo (logos) encarnado, mas pura vontade e mando, viu sua
paz ser ameaçada e Maomé foge para uma cidade razoavelmente próxima,
provavelmente com uma pequena caravana de convertidos: Medina, ou Yathreb. É a hégira que vai determinar tanto o islamismo que marca o início do tempo “verdadeiro”.
Após a hégira, já em Medina, Maomé troca
completamente a sua estratégia de pregação cabana por cabana. Seu texto
passa para a agressividade: ao invés da opção de pagar jizya para
admitir a inferioridade, cristãos e judeus podem agora também ter a
tentadora opção de serem mortos (já “infiéis” pagãos, como yazidis e
afins, só podem mesmo se converter ou morrer, e suas mulheres serem
usadas como escravas sexuais).
Hégira como teologia
Teólogos muçulmanos influentes nas
principais universidades islâmicas do mundo costumam fazer a leitura
desses versos contraditórios do Corão, que ora falam em “amar os
judeus”, ora em “impor terror sobre aqueles descrentes, e então esmagar
suas cabeças” (Qur’an 8:12), justamente pela posterioridade dos
segundos sobre os primeiros: os versos de Medina, pós-Hégira, seriam
mais “verdadeiros”. É por isso que um sem-número de países muçulmanos,
mesmo com versos no Corão pregando alguma forma de “paz” com cristãos e
judeus, proíbe sua permanência em suas terras.
É o que faz a dissidente (“apóstata”) Ayaan Hirsi Ali,
que abandonou o islamismo e fugiu da Arábia Saudita, dividir os
muçulmanos não da forma da tradição islâmica (sunitas, xiitas e
kharijistas), mas entre muçulmanos de Meca e muçulmanos de Medina.
Os primeiros, felizmente a maioria, seguem os ditos de Maomé
pré-Hégira, quando seus escritos ainda falam de comércio, de código
civil e de reformas teológicas em um clima que crê que o islamismo vai
ser dominante por sua atração própria. Os segundos, que podem até ser
uma minoria ínfima, mas são um perigo extremo numa religião com quase 2
bilhões de praticantes, além da hégira, preconizam a jihad, a
guerra santa para a conversão – não de pessoas, mas de povos, regiões e
países inteiros. Note-se a diferença gritante com uma religião que
começa com um Êxodo, para seguir seu Deus e sua verdade em paz.
Afinal, o islamismo, sendo um jin,
não é só uma religião, mas também uma cosmogonia, um método de
pensamento (incluindo o “científico”), um código civil, de alimentação,
vestuário etc. Além do que ocidentais, incluindo seculares, chamam de
“religião” (conceito latino que aprenderam unicamente pela via do
complexo do judaico-cristianismo).
O maior estudioso das religiões do mundo, o romeno Mircea Eliade, define em sua importantíssima obra O Sagrado e o Profano que
os religiosos devem seguir o comportamento dos seus líderes, até por
imitação. Apesar de não haver uma “preconização” de que muçulmanos devem
sair “imigrando” pelo mundo, até a forma de interpretação do Corão
depende dos hadith, textos atribuídos que narram a vida do “profeta” Maomé exatamente para tal fim.
Hégira como conquista
A hégira “original” é apenas a imigração
de Meca para Medina (não é chamada de hégira nem mesmo o retorno de
Maomé para Meca, já dotado de uma ideologia guerreira, e entrando em
conflito armado com os habitantes locais, iniciando seu reinado
conhecido pelo fio da cimitarra).
Entretanto, como tanto o tempo quanto o espaço do islamismo são 100% sagrados
(ao contrário do cristianismo, ou das antigas religiões de Roma, que
permitem uma confluência entre sagrado e profano), uma imigração feita
com fins religiosos, com o objetivo de povoamento de um lugar não-islâmico (Dar al-Harb, lar da guerra) para se tornar uma região muçulmana (Dar al-Islam, lar da submissão ou da “paz”: daí o apelido do islamismo) também pode ser chamado de hégira, por se estar imitando os passos do profeta.
Apenas tal entendimento explica 90% da
idéia de um “Estado Palestino” na região de Israel que muçulmanos querem
tomar para si, expulsando todos os judeus de seu território – com o
beneplácito da ONU e do Ocidente, criticando “assentamentos” (ou seja,
judeus que ousam existir na Dar al-Islam, ofendendo muçulmanos que não aceitam judeus existindo no seu “lar da paz”).
Seria uma imigração “sagrada”: como segue o roteiro Meca-Medina, é uma imigração “na paz”, e não ainda praticando a jihad, mesmo para muçulmanos que defendem o jihadismo: de fato, a história do islamismo é uma eterna repetição de tratados de paz (hudna), como o de Hudaybiyyah, feito pelo próprio Maomé.
Enquanto o muçulmano, geralmente seu
líder, está pensando numa trégua com fins de islamizar uma região, o
ocidental pensa em “tratado de paz”. Após ter maioria populacional
em Hudaybiyyah, através da poligamia e do incentivo islâmico ao prazer
sexual (ao contrário do cristianismo católico), em 10 anos, Maomé
declara guerra à cidade.
O
modelo segue sendo repetido em toda a islamização da religião com mais
rápida ascensão no mundo: imigrações (hégiras), tratados de paz (hudnas), ocasionais guerras (jihad) e tomada de poder (Dar al-Islam). Muçulmanos conhecem o roteiro de cor e salteado. Ocidentais acreditam em “crise de imigração”. Dos portões de Viena
ao acordo nuclear com o Irã, comemorando por acólitos de Barack Obama
como uma “vitória” do presidente americano, ao mesmo tempo em que os imãs iranianos garantiam ao povo que fora uma vitória contra a América, que seria colocada de joelhos e teria a morte vinda de Alá, a novela é sempre reprise.
Do Irã à Bósnia e Herzegovina, de Omã à
Chechênia, dos Emirados Árabes Unidos à Ucrânia, da Turquia ao
Afeganistão, o islamismo se espalhou por tal meio. Não por jesuítas e
filosofia patrística e escolástica com universalização de ensino
teológico como o cristianismo, mas pela submissão, o próprio significado da palavra islam.
Vá e ensine a palavra do profeta – e mate os infiéis
Muçulmanos enxergam o tempo, em seu
calendário, pelo ponto de vista da Eternidade, quase como se tudo
ocorresse simultaneamente para Alá. Se o Vaticano é um dos lugares no
mundo em que mais se pode encontrar arte grega e romana (incluindo as
mais pornográficas), o Estado Islâmico precisa destruir estátuas de
deidades já não adoradas há milênios.
Jihadistas consideram que atropelar civis com um caminhão é o mesmo que praticar a jihad com a espada na época de Maomé. Chamam hoje os combatentes aos grupos jihadistas de Cruzados, ou mesmo de romanos,
enquanto a mídia ocidental se recusa até a dizer que dizem “Alá é
grande”. Líderes islâmicos de países em guerra, no que chamamos de
“crise imigratória”, incentivam sua população a praticar hégira, e a não respeitar
as leis locais, esperando pela lei verdadeira de Alá. O resultado não
poderia ser mais óbvio, caso ocidentais falassem claramente o que
acontece no mundo.
A hégira não é importante, portanto,
apenas como história, ou teologia, ou metafísica mítica para
interessados no sobrenatural, mas como atividade política de
transformação de um país para a não-tão lenta submissão de sua população
ao islamismo.
Quando o chanceler Aloysio Nunes,
eternamente ex-motorista do terrorista Carlos Marighella, cria uma lei
para “ajudar” na “crise de refugiados” da Síria, tudo o que ele está
fazendo, de verdade, é permitir que uma hégira finalmente mire o Brasil.
E ainda dando mais direitos a muçulmanos do que a nativos brasileiros.
Um microcosmo de imigração islâmica
ocorreu na Argentina de Perón e depois com a conivência dos socialistas
Néstor e Cristina Kirchner, até mesmo permitindo um atentado terrorista
contra uma sinagoga que foi encoberto pelo casal. Também temos, é claro,
das ligações da Venezuela com grupos terroristas pelo mundo, além do
Irã. O vice-presidente venezuelano, o druso Tareck El Aissami, além de acusações de tráfico de drogas, foi acusado por um ex-ministro chavista de dar centenas de passaportes venezuelanos verdadeiros a terroristas sírios para praticar jihad na América.
As perspectivas da lei de imigração de Aloysio Nunes não são exatamente animadoras.
O perigo de um atentado terrorista, da jihad moderna, não é exatamente o que principal
a ser temido – por isso é inócuo o apelo de que “nem todo muçulmano é
terrorista”, se nem mesmo todo jihadista, como nem todo defensor das
Forças Armadas, está de arma em punho, matando infiéis no campo de
batalha e degolando infiéis.
Mas o islamismo, ao contrário de qualquer outra
religião, vê imigração de uma maneira completamente distinta da de
outros religiosos ou seculares. Não significa, é claro, que todo
muçulmano tenha um plano de “islamizar” o lugar para onde migre, mas
basta ver o pensamento dos imigrantes muçulmanos sobre apedrejamento de
mulheres adúlteras, pena de morte para apóstatas ou o que acham de gays
para se entender o tamanho do problema.
Fora, é claro, que mesmo assim, há risco do próprio terrorismo e dos efeitos que teria no Brasil (o massacre de Realengo não é lembrado com o primeiro ato de terrorismo islâmico no Brasil).
Como disse o atual prefeito de Londres, o muçulmano Sadiq Khan, do
Partido Trabalhista, o terrorismo é uma realidade com a qual as grandes
cidades hoje “terão de conviver”. Sair na rua com Aloysio Nunes, desde
seus tempos como motorista de Marighella, significa brincar de roleta
russa sem nada a ganhar em caso de sobrevivência.
Para quem considerou o muslim ban,
o veto de Donald Trump a imigração vinda de 7 países do Oriente Médio,
como mero “racismo”, “xenofobia” ou “islamofobia”, fica realmente a
dúvida se sabem de 10% do que vai acima.
Sem necessidade de uma jihad, mais uma vez a esquerda ultra-atéia permite que a idéia de algum dia se implantar a lei da shari’ah em um lugar onde ela parecia ser impensável se torna questão não de se, mas de quando.
Ocidentais acabam sendo crentes em deuses que nem sabem que existem, e
nem sabem como esses deuses querem seus pescoços no chão.
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