Temer fez com os tucanos o que eles não tiveram coragem de fazer com ele
Elio Gaspari - FSP
Fernando Henrique Cardoso e Tasso Jereissati jamais poderiam ter
imaginado que apoiando a deposição de Dilma Rousseff, substituindo-a por
Michel Temer, levariam o partido para sua pior crise, correndo o risco
da implosão. O vice-presidente da chapa de Dilma está esfarelando o
tucanato com a ajuda de Aécio Neves, o candidato do PSDB derrotado em
2014.
Com todos os seus defeitos, o PSDB não é um partido qualquer. Ele foi
criado por Fernando Henrique Cardoso, Mario Covas, Franco Montoro e José
Richa. Noves fora a qualidade biográfica desse grupo, eles abandonaram o
PMDB, porque prevalecera a caciquia do governador paulista, Orestes
Quércia.
Quércia foi o primeiro politico bilionário produzido pela
redemocratização. Ao morrer, em 2010, deixou um patrimônio de cerca de
R$ 1 bilhão. Montoro, Fernando Henrique e Covas fugiram desse modelo e
fundaram o PSDB em 1988. Dois anos depois, o poderoso Quércia e seu PMDB
elegeram seu sucessor e Aloysio Nunes Ferreira tornou-se
vice-governador. O tucanato só recuperou o governo de São Paulo em 1995,
com Mario Covas, e está lá até hoje, com o apoio do PMDB, é claro.
Michel Temer navegou no PMDB, sem ser admitido no círculo elitista do
tucanato de São Paulo. O vice Nunes Ferreira migrou para o PSDB em 1997 e
chegou a ocupar o Ministério da Justiça no governo de Fernando Henrique
Cardoso. Hoje é o ministro das Relações Exteriores de Temer e feroz
defensor da permanência do tucanato no governo. (Antonio Imbassahy,
atual ministro da Secretaria de Governo, também quer que os tucanos
fiquem no Planalto, mas sua relação com o PSDB começou em 2005. Antes
disso, era um quadro promissor dos governos de Antonio Carlos Magalhães
na Bahia.)
Brigas de tucanos não chegam a ser novidade, mas poucos estranhamentos
podem ser comparados ao que envolveu Tasso e Aloysio no Alvorada, em
dezembro de 2001. Uma testemunha temeu pelo pior. Os dois
reaproximaram-se, mas nem tanto.
O que parece ser uma briga de Aécio Neves com Tasso Jereissati pelo controle do PSDB é uma revanche do PMDB.
A revanche de um partido no qual o quercismo foi uma doença infantil
que se fortaleceu na maturidade e chegou ao poder com a deposição de
Dilma Rousseff.
Pode-se acusar o PSDB de tudo, mas ele tem uma corrente ideológica. É
ambígua, convive com o que condena, mas preserva uma ambição ideológica.
Quem duvidar dessa característica pode ler quaisquer páginas dos três
volumes dos "Diário da Presidência", de FHC.
Enquanto os tucanos mandaram em Brasília, sempre houve quem defendesse
um endurecimento do jogo com o PMDB. Tratava-se de contrariar seus
pleitos, elevando a tensão, na certeza de que o partido de Temer seria
capaz de tudo, menos de romper com o governo. A ideia nunca foi em
frente. Numa trapaça da História, Temer está na Presidência e fez com os
tucanos o que eles não tiveram coragem de fazer com ele.
Elevou a tensão e obrigou o PSDB e seus valorosos intelectuais a decidir
se são valentes a ponto de apoiar programas e abandonar cargos.
Para Tasso Jereissati, isso não é ameaça, é conforto. Para Temer, a briga com Aécio Neves é um presente dos deuses. O PSDB, dividido, poderá encolher, dando ao PMDB o direito de sonhar com o seu espólio. Não foi uma vingança planejada, era apenas inevitável.
Nenhum comentário:
Postar um comentário