Terror primário
FSP
A eficácia monstruosa do 11 de Setembro —com o ineditismo do ataque de
grande escala em solo americano e a novidade da organização
transnacional de redes terroristas de inspiração islâmica— obscureceu
por algum tempo o fato de que o terror é ameaça bem mais antiga e
problema persistente, de difícil solução.
Decerto passa-se por um ciclo mais ativo desse tipo de barbárie; mas o
terrorismo, doméstico ou importado, de inspiração religiosa ou política,
é duradouro.
Existia terror antes dos islâmicos —ataques de separatistas bascos,
irlandeses, corsos, para citar apenas alguns exemplos notórios; ou a
guerra entre Israel e Palestina, que muita violência provocou em Paris.
Existirá, quase certamente, depois deles.
A atual amplitude de alvos e a frequência dos morticínios, de todo modo,
impressiona. Depois dos atentados a bomba da primeira década do século,
tornam-se comuns massacres com armas automáticas e atropelamentos
coletivos.
Houve Londres, Estocolmo, Nice, Berlim e, desta feita, Barcelona e Cambrils, nos episódios de maior alcance homicida.
Muito concorre para a persistência desse horror. Guerras e ódios, crises
geopolíticas e desastres socioeconômicos decorrentes não serão
resolvidos tão cedo.
Desde 1979, com a revolução no Irã, renovaram-se os conflitos entre o
Ocidente rico e o Oriente Médio. Desde 2001, Estados Unidos e aliados
estão em guerra com países muçulmanos, seja Afeganistão, Iraque ou
Síria. Para os fanáticos, trata-se de novos episódios de séculos de
cruzadas contra o islã.
Hoje, a porosidade de fronteiras e as redes globais de comunicação
favorecem o trânsito de terroristas e a propagação de suas ideias.
Não se necessita de sofisticação para produzir mortandades. Basta, em
última análise, um "lobo solitário", como os inspirados à distância pela
facção Estado Islâmico. Basta uma van ou bombas feitas de um botijão de
gás acoplado a uma panela cheia de parafusos.
Por imperativo que seja redobrar a vigilância doméstica (bem como
intensificar medidas militares e diplomáticas), é difícil imaginar que
haja policiais ou barreiras nas ruas suficientes para prevenir ações tão
primárias.
Um risco recorrente da reação defensiva, por fim, é o de cercear
liberdades individuais, conforme discussão muito acesa no Reino Unido e
na França depois dos atentados desta década.
A questão será como buscar a segurança dos cidadãos sem que as
sociedades abertas acabem por ceder alguma vitória ao terror,
desgastando os fundamentos de sua vida civilizada e democrática.
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