A piora das contas públicas
O Estado de S.Paulo
Sem grande esforço, o governo conseguiu piorar suas
contas, gastar um dinheirão com incentivos fiscais e chegar ao terceiro
aniversário com indústria ainda estagnada, inflação maior que a do ano
anterior e perspectiva de resultados medíocres em 2014. Mas o balanço
fiscal ainda teria sido mais fraco sem a grande contribuição de receitas
extraordinárias, como os R$ 22,07 bilhões obtidos com as concessões no
setor de infraestrutura e os R$ 21,79 bilhões coletados com o novo
Refis, o programa de refinanciamento de dívidas tributárias. Só a soma
desses dois itens - R$ 43,86 bilhões - corresponde a 56,9% do superávit
primário de R$ 77,07 bilhões anunciado na sexta-feira pelo governo
central e apresentado pelo secretário do Tesouro, Arno Augustin, como um
resultado "importante". Em 2012 o governo central havia conseguido R$
88,26 bilhões de superávit primário, dinheiro destinado ao pagamento de
uma parte dos juros da dívida pública - só uma parte, porque sempre
sobra uma boa fatia dos compromissos financeiros do ano.
Mas o resultado de 2012, embora oficialmente superior ao do ano
passado, foi obtido graças a uma porção de malabarismos. Os truques
ficaram conhecidos internacionalmente como "contabilidade criativa".
O pífio saldo primário do governo central - Tesouro, Previdência e
Banco Central (BC) - resultou da combinação de três fatores: a gastança
de sempre, o baixo crescimento econômico e o desperdício representado
pela maior parte dos R$ 77,8 bilhões de incentivos fiscais.
Grande parcela desse dinheiro serviu somente para impulsionar o
consumo e favorecer alguns segmentos industriais, mas o efeito global
foi insignificante. A expansão da oferta foi insuficiente para atender
os consumidores, parte da procura foi coberta com aumento de importações
e, além disso, houve aumento de preços. A indústria nacional, com baixo
investimento e custos muito altos, continuou incapaz de competir com os
produtores estrangeiros fora e dentro do País.
Com o fiasco dos incentivos, o Tesouro acumulou dois problemas - o
baixo crescimento, o desafio original, e o derivado, a perda
representada pelas desonerações inúteis. Quanto à gastança, seguiu o
padrão conhecido. A receita líquida do governo central foi 12,5% maior
que a de 2012, mas a despesa cresceu 13,6%, segundo o Tesouro.
O resultado geral do setor público - governo central, governos de
Estados e municípios e estatais - também foi ruim. Os números da União
são um pouco diferentes dos apresentados pelo Tesouro, por causa dos
critérios de cálculo. O BC, responsável pelo relatório consolidado,
calcula o resultado pelas necessidades de financiamento, sem levar em
conta apenas a diferença entre receitas e despesas primárias. Pelas
contas do BC, o superávit primário do setor público atingiu R$ 91,3
bilhões, ou 1,9% do PIB. No ano anterior, havia chegado a R$ 105
bilhões, ou 2,39% do produto. Foi, em termos porcentuais, o pior
resultado da série iniciada em 2001. Pelas mesmas contas, o saldo
primário do governo central ficou em R$ 75,3 bilhões, ou 1,57% do PIB
estimado.
São resultados bem inferiores àqueles programados inicialmente pelo
governo federal. A meta foi reduzida gradualmente, com descontos de
investimentos e de desonerações, e finalmente o Ministério da Fazenda só
se comprometeu com o resultado previsto para o governo central. Esse
resultado, de R$ 73 bilhões, foi afinal superado, mas somente graças a
receitas extraordinárias.
O governo federal só vai fixar em fevereiro a meta fiscal deste ano
e, como preparação, representantes do Ministério da Fazenda estão
consultando especialistas do mercado. A decisão final caberá à
presidente Dilma Rousseff. Certamente ela tentará combinar os critérios
das agências de classificação de crédito (há o risco de rebaixamento da
nota do Brasil) e as conveniências eleitorais. Além disso, terá de dar
atenção às novas condições do financiamento internacional, afetadas pelo
aperto da política monetária americana. Mas uma guinada para a
austeridade será uma surpresa. Sem essa mudança, o BC continuará
cuidando sozinho do combate à inflação e será difícil evitar novas altas
de juros.
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