Luis Prados - El País
"O sol brilha, os caixas dão dinheiro e as pessoas foram trabalhar",
disse na manhã de ontem um porta-voz do Syriza. A vitória da esquerda
radical grega não representou nenhum cataclismo do tipo que previam "as
Cassandras dentro e fora da Grécia", como afirmou no domingo à noite seu
líder, Alexis Tsipras, e efetivamente ontem as ruas de Atenas
apresentavam o mesmo aspecto rotineiro de uma segunda-feira qualquer. As
extrapolações políticas do que ocorreu neste país são tentadoras, mas
geralmente errôneas, e o pacto de governo entre o Syriza e a direita
nacionalista e antieuropeia da Anel (Gregos Independentes) terá
desconcertado os que imaginaram uma mudança de sistema telúrica e a
revolução um pouco mais próxima.
Nem a Espanha é a Grécia nem o
Syriza é o Podemos. Nem pelo tamanho de suas economias, nem pela
profundidade e a gravidade da crise, é possível equiparar os dois
países. Bastam alguns dados: a Grécia perdeu nos últimos seis anos um
quarto de sua riqueza nacional e, em uma população de 10 milhões, 200
mil funcionários públicos perderam seus empregos e outros 200 mil
gregos, na maioria jovens, abandonaram o país. Nem no Syriza existem
devaneios chavistas nem pretensões de hegemonia cultural, começando pela
falsificação da história recente do país.
Tampouco é a Esquerda Unida, embora no passado tenha existido certa afinidade. As raízes do Syriza se encontram no antigo Partido Comunista do Exterior, eurocomunista, que acabou derivando em uma coalizão de grupos de esquerda e ecologistas chamada Synaspismós, que teve durante uma década uma meritória atividade política e eleitoral - o próprio Tsipras fez surpresa ao conseguir 10,5% dos votos como candidato à prefeitura de Atenas em 2006 - e que é a base do atual partido ganhador das eleições, uma vitória alcançada nas costas de uma crise econômica, esta sim telúrica, e de medidas de austeridade asfixiantes para a população.
Pela mesma razão, é temerário estabelecer paralelos entre o partido espanhol Cidadãos e o grego To Potami (O Rio), um grupo criado em março passado por um dos mais proeminentes empresários da construção deste país com um líder jornalista de televisão, sem prestígio profissional ou intelectual. Ou perguntar-se, como faz o "Financial Times", se Tsipras será Lula ou Chávez. A pergunta mais correta seria se o líder do Syriza poderia chegar a ser Andreas Papandreu.
A resposta não é fácil. O velho leão do Pasok inoculou o populismo na política grega e seu carisma marcou época. Seu autoritarismo, sua liderança indiscutível no partido e sua compreensão do cenário internacional da época não parecem ocorrer no caso de Tsipras. Este também não terá agora a vantagem do generoso fluxo de fundos europeus. Mas o velho Papandreu conseguiu, eleição após eleição, transformar um pequeno partido de esquerda em uma organização de massa e abandonar sua retórica exaltada pelo pragmatismo.
Tsipras e o Syriza pertencem ao contexto bizantino da política grega, embora seu êxito se deva em grande parte, e isto sim é global, ao fracasso das formações tradicionais e ao descrédito das classes dirigentes.
O próprio pacto de governo, se se limitar a realizá-lo com a direita rançosa dos Gregos Independentes - contrários à separação entre Igreja e Estado, ao casamento gay e ao acordo permanente com a Turquia -, surpreendente em outras latitudes, tem aqui um precedente: o famoso "pacto à grega" entre conservadores e comunistas com o objetivo de limpar (a célebre "catarse") os estábulos do Estado, depois de um acúmulo de escândalos de corrupção que terminou com um sonoro fracasso.
O novo primeiro-ministro grego vai precisar reunir um sólido consenso nacional para reforçar sua posição de negociação com a troica (UE, BCE, FMI) e ao mesmo tempo manejar com habilidade as doenças infantis do esquerdismo dentro de seu próprio partido.
A esperança prometida tem um preço, e os credores europeus e internacionais não são conhecidos por seu sentimentalismo. Será preciso esperar para saber se essa espécie de frente de rejeição à Europa acordada com os Gregos Independentes soma ou subtrai.
Mas existe um risco, como advertiu há alguns dias o comentarista político Alexis Papachelas, no jornal "Kathimerini": "Que o trem da Europa passe à nossa frente e nem sequer percebamos ou, inclusive pior, que nos deixe para trás porque esperávamos na plataforma errada na hora errada".
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
Tampouco é a Esquerda Unida, embora no passado tenha existido certa afinidade. As raízes do Syriza se encontram no antigo Partido Comunista do Exterior, eurocomunista, que acabou derivando em uma coalizão de grupos de esquerda e ecologistas chamada Synaspismós, que teve durante uma década uma meritória atividade política e eleitoral - o próprio Tsipras fez surpresa ao conseguir 10,5% dos votos como candidato à prefeitura de Atenas em 2006 - e que é a base do atual partido ganhador das eleições, uma vitória alcançada nas costas de uma crise econômica, esta sim telúrica, e de medidas de austeridade asfixiantes para a população.
Pela mesma razão, é temerário estabelecer paralelos entre o partido espanhol Cidadãos e o grego To Potami (O Rio), um grupo criado em março passado por um dos mais proeminentes empresários da construção deste país com um líder jornalista de televisão, sem prestígio profissional ou intelectual. Ou perguntar-se, como faz o "Financial Times", se Tsipras será Lula ou Chávez. A pergunta mais correta seria se o líder do Syriza poderia chegar a ser Andreas Papandreu.
A resposta não é fácil. O velho leão do Pasok inoculou o populismo na política grega e seu carisma marcou época. Seu autoritarismo, sua liderança indiscutível no partido e sua compreensão do cenário internacional da época não parecem ocorrer no caso de Tsipras. Este também não terá agora a vantagem do generoso fluxo de fundos europeus. Mas o velho Papandreu conseguiu, eleição após eleição, transformar um pequeno partido de esquerda em uma organização de massa e abandonar sua retórica exaltada pelo pragmatismo.
Tsipras e o Syriza pertencem ao contexto bizantino da política grega, embora seu êxito se deva em grande parte, e isto sim é global, ao fracasso das formações tradicionais e ao descrédito das classes dirigentes.
O próprio pacto de governo, se se limitar a realizá-lo com a direita rançosa dos Gregos Independentes - contrários à separação entre Igreja e Estado, ao casamento gay e ao acordo permanente com a Turquia -, surpreendente em outras latitudes, tem aqui um precedente: o famoso "pacto à grega" entre conservadores e comunistas com o objetivo de limpar (a célebre "catarse") os estábulos do Estado, depois de um acúmulo de escândalos de corrupção que terminou com um sonoro fracasso.
O novo primeiro-ministro grego vai precisar reunir um sólido consenso nacional para reforçar sua posição de negociação com a troica (UE, BCE, FMI) e ao mesmo tempo manejar com habilidade as doenças infantis do esquerdismo dentro de seu próprio partido.
A esperança prometida tem um preço, e os credores europeus e internacionais não são conhecidos por seu sentimentalismo. Será preciso esperar para saber se essa espécie de frente de rejeição à Europa acordada com os Gregos Independentes soma ou subtrai.
Mas existe um risco, como advertiu há alguns dias o comentarista político Alexis Papachelas, no jornal "Kathimerini": "Que o trem da Europa passe à nossa frente e nem sequer percebamos ou, inclusive pior, que nos deixe para trás porque esperávamos na plataforma errada na hora errada".
Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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