Kimiko De Freytas Tamura - NYT
A família de Aqsa Mahmood a via como uma adolescente popular e
inteligente que ajudava a cuidar de seus três irmãos mais novos e de
seus avós na casa dela na Escócia. Ela ouvia Coldplay, lia os livros de
Harry Potter e bebia Irn Bru, um refrigerante escocês.
A visível tendência de mulheres jovens estudiosas, aparentemente motivadas, deixarem seus lares para se juntar a jihadistas violentos está se tornando perturbadoramente familiar. Uma autoridade da Polícia Metropolitana de Londres disse na segunda-feira (24) que uma das meninas, Shamima Begum, enviou uma mensagem pelo Twitter para uma mulher em 15 de fevereiro, dois dias antes de deixarem o Reino Unido, mas se recusou a revelar seu nome.
Especialistas que rastreiam atividade jihadista online, incluindo Audrey Alexander, do Centro Internacional para o Estudo da Radicalização, em Londres, identificou a mulher como sendo Mahmood, de 20 anos.
Acredita-se que ela agora esteja vivendo em Raqqah, Síria, a capital do Estado Islâmico, onde se casou com um jihadista e atua como uma espécie de líder escotista virtual, oferecendo conselhos às vezes duros para as garotas que seguem seus passos.
Enquanto as famílias das três meninas desaparecidas faziam apelos às lágrimas para que suas filhas voltassem para casa, a família de Mahmood também fez uma declaração no último fim de semana, a respeito da própria filha, a quem chamaram de "desgraça". A família disse estar "cheia de horror e raiva" por ela "poder ter tido um papel" no recrutamento de meninas para o Estado Islâmico.
"Suas ações são uma distorção pervertida e maligna do Islã", disse a família em sua declaração, feita por meio de seu advogado, Aamer Anwar. "Você está matando sua família todo dia com suas ações. Eles imploram para que você pare, se alguma vez já os amou."
As meninas –Kadiza Sultana, 16 anos, Begum, 15, e Amira Abase, 15– foram descritas por uma colega de classe como estudiosas, debatedoras e motivadas, não diferentes de Mahmood. A conta de Sultana no Twitter mostra que ela seguia muitas contas de combatentes jihadistas. Begum, que enviou uma mensagem pelo Twitter para Mahmood, pediu aos seguidores dela antes de partir que "me mantenham em suas 'duas'", ou orações. (As contas delas foram recentemente desativadas.)
As adolescentes disseram às suas famílias em 17 de fevereiro que passariam o dia fora, mas o vídeo de uma câmera de segurança no Aeroporto de Gatwick, perto de Londres, mostrou as meninas embarcando em um voo da Turkish Airways para Istambul, e a Polícia Metropolitana disse na terça-feira que elas chegaram à Síria.
Outra colega de classe da escola das meninas –a Bethnal Green Academy, no leste de Londres– tomou um voo da Turkish Airlines em dezembro e acredita-se que esteja na Síria. Os policiais fizeram na época perguntas às três adolescentes a respeito do desaparecimento da colega, disse uma autoridade da Polícia Metropolitana.
Como elas, "Aqsa era muito inteligente, querida, alegre, gentil e carinhosa", disse Anwar, o advogado. Mas o Estado Islâmico transformou Mahmood em "garota-propaganda de recrutamento no Reino Unido", ele disse, "e ela própria é uma recruta de alto valor".
O papel preciso que Mahmood pode ter exercido no voo das três adolescentes para Londres é incerto, já que Begum, e não Mahmood, iniciou a conversa pelo Twitter. A conversa delas passou rapidamente para um canal criptografado da rede social, o que é uma prática padrão entre aspirantes a jihadistas buscando informação prática sobre como chegar à Síria.
Há cerca de 100 mulheres britânicas entre as 550 mulheres ocidentais que acredita-se que tenham se juntado a grupos radicais islâmicos na Síria e no Iraque, segundo o Soufan Group, uma consultoria de segurança com sede em Nova York. As recrutadoras costumam ser mais jovens que seus pares masculinos, disse Ross Frenett, do Instituto para o Diálogo Estratégico, uma organização de pesquisa em Londres que estuda o extremismo.
Na visão dos radicais, "uma jovem de 15 anos dá uma boa esposa", ele disse. "Um garoto de 14 anos é menos útil como combatente."
As mulheres que se juntam ao Estado Islâmico tentam aliciar outras mulheres para se casarem com os militantes e ajudá-los a construir uma nova sociedade islâmica retrógrada. Mahmood despontou como uma das principais defensoras do Estado Islâmico e uma de suas recrutadoras online mais estabelecidas, segundo o SITE Intelligence Group, que monitora a atividade online dos jihadistas.
Ela tentou incitar ataques terroristas contra países ocidentais por meio de seu blog no Tumblr e múltiplas contas no Twitter, convocando os muçulmanos britânicos a seguir o exemplo dos "irmãos de Woolwich, Texas e Boston". Mas ela também cita ocasionalmente o tédio de fazer os deveres de dona de casa.
Pelo Twitter, ela disse que em comparação à Escócia, os invernos na Síria "são duros" e aconselhou: "Irmãs, por favor, não esqueçam de trazer roupas quentes ou se arrependerão depois". Ela também as orienta: "Irmãs, por favor, em nome de Alá, contatem as irmãs que estão online em vez de abordar os irmãos. Saibam também que muitos irmãos que vocês contatam e com os quais conversam são casados. Tenham dignidade e não sejam destruidoras de lares :)".
As famílias das três adolescentes desaparecidas de Londres também criticaram os serviços de segurança do Reino Unido por fracassarem em intervir e impedir suas filhas de irem para a Síria, apesar de estarem monitorando a atividade de Mahmood online.
Após ter deixado seu lar há mais de um ano, Mahmood telefonou para seus pais da fronteira turca, lhes dizendo que voltariam a se ver no "Dia do Juízo Final" e que ela os levaria para o céu, segurando suas mãos. Mas os serviços de segurança britânicos aconselharam os pais dela a manter o desaparecimento da filha "fora do radar", disse Anwar. "Caso os serviços de segurança estivessem realmente preocupados com o bem-estar de Aqsa Mahmood, eles teriam movido céus e terras para trazê-la de volta em novembro de 2013", ele disse.
Tradutor: George El Khouri Andolfato
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