Perícia afirma que Joesley disse 'todo mês' ao falar de Cunha
CAMILA MATTOSO/REYNALDO TUROLLO JR./RUBENS VALENTE - FSP
O laudo produzido pela perícia da Polícia Federal afirma que o
empresário do setor de carnes Joesley Batista usou a expressão "todo
mês" em um ponto importante do diálogo travado com o presidente Michel
Temer em 7 de março no Palácio do Jaburu, e não "tô no meio", ao
contrário do que afirmou o perito contratado pela defesa do presidente.
Segundo a transcrição do diálogo feita pela PF, Joesley usou a expressão
quando falava sobre seu relacionamento com o ex-deputado federal
Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Em resposta, Temer indagou: "O Eduardo também,
né?", segundo a transcrição.
A expressão "todo mês" ligada a Cunha é relevante porque atua em favor
de manifestações anteriores da PGR (Procuradoria Geral da República),
que procura associar o diálogo a supostos pagamentos mensais feitos por
Joesley ao ex-deputado para uma "compra de silêncio" do ex-deputado, a
fim de evitar que ele se tornasse delator na Operação Lava Jato –uma das
teses centrais da investigação sobre Temer.
Em entrevista coletiva convocada em 22 de maio, o perito contratado
pelos advogados de Temer, Ricardo Molina, disse que Joesley havia falado
"tô no meio", e não "todo mês".
A perícia conseguiu recuperar trechos até então considerados inaudíveis.
No ponto em que Joesley e Temer conversavam sobre Loures, o empresário
indagou se o ex-assessor era o novo interlocutor da JBS após a queda do
ex-ministro GeddeL Vieira Lima (PMDB-BA). Segundo a perícia, Temer
respondeu: "Pode passar por meio dele, viu?".
Esse ponto, antes indicado como ininteligível, pode reforçar a acusação
de que Loures recebeu recursos que seriam direcionados, segundo a
acusação do Ministério Público Federal, para Temer.
O laudo final da perícia, com 123 páginas, mais um apêndice de duas
páginas, é assinado pelos peritos do INC (Instituto Nacional de
Criminalística) Paulo Max Gil Innocencio Reis e Bruno Gomes de Andrade,
designados pelo diretor substituto do INC, Mauro Mendonça Magliano, e
foi encaminhada ao STF na última sexta-feira pelo chefe do serviço de
perícias em audiovisual e eletrônicos do INC, Getúlio Menezes Bento.
Conforme a Folha havia antecipado na última sexta-feira (26),
o laudo técnico do INC da PF apontou que as "descontinuidades" do
áudio, que segundo o perito da defesa da Temer e um perito contratado
pela Folha seriam "edições", são na verdade um problema causado pelo tipo do aparelho gravador utilizado por Joesley.
As interrupções ocorreram, segundo a perícia, porque o aparelho operava
com um sistema de gravação automática, que começava ou parava conforme a
"pressão sonora", ou seja, a voz dos interlocutores. Essa
particularidade do gravador levou às pausas e reativações automáticas
que poderiam ser confundidas com "edições".
Segundo a PF, ocorreu um total de 294 "descontinuidades" ao longo de
toda a gravação feita no Jaburu. "Constata-se, no entanto, que tais
descontinuidades são compatíveis com as decorrentes de interrupção no
registro das amostras de áudio por atuação do mecanismo de detecção de
pressão sonora do equipamento gravador, conforme corroborado por meio
dos ensaios realizados", diz a perícia. Os peritos fizeram diversas
simulações com os dois aparelhos usados por Joesley e chegaram a
conclusões semelhantes.
Os peritos atestaram ainda sobre a conversa no Jaburu: "Em especial, não
foram encontrados elementos indicativos de que a gravação tenha sido
adulterada por meio da inserção ou supressão intencional de trechos de
falas ocorridas em outro momento ou em ambiente diverso".
"Os trechos contínuos sucessivos ao longo do áudio questionado
apresentam aparente encadeamento lógico de ideias e assuntos, e remetem a
um dialogo travado entre dois interlocutores, com início, meio e fim",
dizem os peritos.
Conforme a perícia, as "descontinuidades" tiveram, em média, a duração
de 1,3 segundo cada uma. Isso explicaria a diferença entre o total da
gravação e um programa da rádio CBN transmitido na noite do dia 7 cuja
emissão inicia e encerra a gravação feita por Joesley. O programa foi
captado pelo rádio do carro do empresário.
Ao comparar o tempo da gravação com o da emissão da rádio, a emissora
apontou a ausência de cerca de seis minutos na gravação de Joesley.
Segundo os peritos, "a existência de uma diferença temporal como esta é
esperada quando da gravação de arquivos de áudio com mecanismo de
ativação por detecção de nível de pressão sonora".
OUTRAS PERÍCIAS
Interrupções na gravação prejudicaram mais a fala de Temer, provando
"falta de partes de seu discurso", apontou perícia privada realizada
pelo IBP (Instituto Brasileiro de Peritos), a pedido da Folha.
Em maio, outro laudo a pedido do jornal, feito por Ricardo Caires dos
Santos, perito judicial pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo,
concluiu que a gravação da conversa entre Joesley e Temer havia sofrido
mais de 50 cortes.
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