sábado, 25 de fevereiro de 2012

A LÍBIA SEM GOVERNO

Líbia oscila perigosamente à beira do abismo
Frederic Wehrey - Herald Tribune
Um ano após o início da revolta líbia, um governo de transição fraco enfrenta milícias armadas e crescente frustração popular. Homens jovens desafiadores empunhando armamento pesado controlam os aeroportos, portos e instalações de petróleo da Líbia. Tribos e contrabandistas governam as áreas de deserto ao sul da capital. Crescem as disputas territoriais e por poder entre várias milícias.
O governo líbio permanece à margem, evitando conflitos com as milícias que não consegue controlar. Tentativas recentes de dominar os redutos de Gaddafi na cidade de Bani Walid terminaram em humilhação; as forças do governo eram inferiores em número e poder de fogo. A fraqueza delas é resultado da falta de uma instituição crucial para a construção de um Estado: um exército nacional.
As autoridades do governo anunciaram recentemente planos para desarmar as milícias e integrar os rebeldes no exército. Mas não há uma estrutura militar para absorver esses jovens combatentes –e nem confiança pública na capacidade do governo de desarmá-los. Apesar dos países da Otan e aliados como a Jordânia e o Qatar terem começado a treinar e equipar as forças de segurança, há muito mais que os estrangeiros podem fazer para ajudar.
Washington tem uma janela de oportunidade para moldar as relações civis-militares da Líbia e promover a democracia e o crescimento econômico, assim como ajudar a estabilizar o Norte da África. Os Estados Unidos descobririam que as forças armadas líbias são um quadro em branco. Diferente do Egito, a Líbia não possui uma junta de generais capaz de obstruir uma transição democrática. Muammar Gaddafi, temeroso de golpes, dava pouca autoridade aos escalões mais altos das forças armadas. Ele colocou seu filho, Khamis, um capitão, encarregado da unidade mais capaz do exército, a Brigada Khamis. Essa unidade, juntamente com a estrutura organizacional do exército, se desintegrou durante a guerra.
Os estoques de suprimentos estão em ruínas. Há uma grave escassez de jovens oficiais, um legado da decisão de Gaddafi de treinar jovens oficiais apenas para as unidades de elite do regime. As principais prioridades são treinamento e educação. O foco precisa se concentrar no treinamento básico dos soldados e na educação da próxima geração de oficiais líbios, em áreas como as relações civis-militares, o estado de direito e direitos humanos.
Os Estados Unidos reservaram US$ 350 mil para treinamento e educação dos militares líbios, um valor pequeno comparado ao engajamento militar americano com os vizinhos da Líbia e insuficiente para ajudar a reconstruir as instituições de defesa da Líbia. Grande parte desses fundos pode ser uma sobra da ajuda americana apropriadamente limitada no final da era Gaddafi, mas a lógica para esses limites não mais se aplica.
Além de treinamento, as forças armadas líbias precisam urgentemente de itens relativamente baratos e não letais: peças sobressalentes para veículos, aeronaves e navios; uniformes e equipamentos de proteção para os soldados, e tecnologia de controle de fronteira. Sistemas básicos de comunicação são especialmente urgentes. Sob Gaddafi, a tecnologia de comunicação era destinada principalmente ao serviço de inteligência, e não para o exército ou para a polícia. Itens maiores de equipamento podem ser comprados posteriormente pelo governo líbio, quando sua venda de petróleo for retomada. O que é crítico agora é orientação sobre como criar uma estrutura institucional para os militares e seu planejamento estratégico.
O Líbano serve como exemplo de como esse tipo de ajuda discreta pode resultar em dividendos enormes. Segundo muitos relatos, o Exército libanês é amplamente considerado a instituição mais confiável naquele país fragmentado. Em 2007, ele recebeu elogios de todos os setores da sociedade libanesa durante sua luta contra os militantes sunitas no campo de refugiados de Nahr al Bared. Transferências de equipamento e treinamento americano provaram ser cruciais na vitória naquela batalha. Hoje, à sombra da guerra civil na Síria, o Exército libanês pode muito bem ser a única instituição mantendo o país unido.
Um exército não é a única cura para os males da Líbia. Desenvolvimento econômico, um setor privado robusto, um judiciário independente, sociedade civil e o empoderamento do Parlamento, todos fazem parte da equação. Mas antes que essas instituições possam se enraizar, a segurança deve estar presente.

Frederic Wehrey é um analista político sênior da Corporação Rand, uma instituição de pesquisa sem fins lucrativos.
Tradutor: George El Khouri Andolfato 

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