Mensagens negativas
José Paulo Kupfer - OESPO Banco Central do governo Dilma sempre teve um relacionamento complicado com o mercado. A diretoria puro-sangue nomeada pela presidente, formada por funcionários de carreira, sem ninguém oriundo do mundo financeiro privado, foi recebida com desconfiança e, de fato, surpreendeu os analistas, tomando rumos não sancionados por eles, em mais de uma ocasião. O anúncio sem prévio aviso, semana passada, de reversão parcial das medidas macroprudenciais adotadas em fins de 2010 causou estranheza e promete voltar a elevar o nível do ruído entre as partes.
Essa desconfiança de origem, no jargão mercadista, atende pelo nome de "falta de credibilidade". A convicção dos analistas de mercado de que o BC presidido por Alexandre Tombini, com sua política monetária, mira mesmo o teto da meta - e não o seu centro - está na base do desacerto. A suspeita de que a diretoria, desprovida da autonomia que alardeia dispor, também opera, sem mandato para tanto, na busca de um mínimo de crescimento econômico, por imposição do estilo intervencionista da presidente, reforça o desencontro.
Todos se lembram do fogo de barragem vindo do mercado a partir do início de um ciclo de cortes na taxa básica de juros (Selic), em fins de agosto de 2011. A tentativa de aproveitar brechas criadas pela demora na recuperação global e a manutenção de taxas de juros baixíssimas mundo afora não deu certo.
Menos ruidosa, mas ainda assim marcante, a reversão agora de parte das macroprudenciais pode ter razões técnicas para sua adoção, mas configurou nova falha de comunicação com o mercado. Pela amplitude restrita das medidas e pelo prazo defasado para que produzam efeitos, o BC parece ter errado no "timing", ao anunciar as novas medidas no dia seguinte ao da divulgação de uma ata do Comitê de Política Monetária (Copom) na qual, com inédita clareza, reafirmava o compromisso essencial da política monetária com o controle da inflação. Por que não esperou um pouco mais?
De maneira geral, medidas macroprudenciais - e, obviamente, sua reversão - já são entendidas como parte legítima do arsenal de política monetária à disposição de bancos centrais. Não custa lembrar que, quando não levam em conta o nível de emprego, como ocorre, por exemplo, nos Estados Unidos, além de administrar a circulação de moeda e controlar a inflação, os BCs devem zelar pela estabilidade do sistema financeiro. Isso significa atuar para calibrar o crédito - para mais ou para menos. Vide os "quantitative easings" atuais.
Existem mecanismos de controle do crédito, tanto via limites nas proporções entre reservas e ativos, quanto com a imposição de depósitos compulsórios sobre passivos bancários. São instrumentos à disposição para uso quando é o caso de atuar não em todo o espectro afetado por movimentos nos juros - taxa de câmbio, por exemplo -, como foi feito em 2010 para conter o crédito, e, agora, para soltar.
A aparente afoiteza do BC, porém, deu espaço a novas discordâncias e abalou ainda mais a sua já baixa credibilidade junto ao mercado - o que é ruim para o alinhamento de expectativas. Mesmo que seja possível defender as medidas, que visam, timidamente, ajustar posições a um quadro de restrição da oferta de financiamentos, apesar da redução dos riscos de inadimplência, bem diferente do que prevalecia na época em que as macroprudenciais foram adotadas - igualmente sob críticas mais ortodoxas -, a ação do BC passou diversas mensagens negativas.
Uma delas é a de que, diante dos limites estreitos a que levou a política monetária, está confuso e toma medidas contraditórias - mantém o aperto monetário ao não mexer nos juros e, ao mesmo tempo, solta moeda, com o estímulo ao crédito. Outra é a de que não resiste às pressões de Dilma para animar a economia, ainda que o faça por meios tortos e dissimulados.
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