Nacionalismo canhestro
Merval Pereira - O Globo
De duas, uma:
ou há uma conspiração internacional contra o Brasil, ou o governo
brasileiro está flertando perigosamente com o perigo, alheio às
advertências que partem de todos os lados sobre as fragilidades de nossa
economia.
Ontem, foi o Fundo Monetário Internacional (FMI) que
colocou o país entre as cinco economias mais vulneráveis do mundo, ao
lado de Índia, Turquia, Indonésia e África do Sul.
Também a
agência de classificação Moody’s divulgou um relatório no qual afirma
que a Petrobras é, entre as empresas petrolíferas da América Latina, a
que corre o maior risco financeiro porque está sendo usada politicamente
para segurar a inflação com o represamento dos preços de combustíveis
no país.
E o que respondem nossos dirigentes? Ao mesmo tempo em
que vibram com a derrota política que impuseram ao banco espanhol
Santander, tratam de declarar platitudes, à espera de que as coisas
melhorem por si, sem demonstrar a menor intenção de fazer mudanças no
rumo tomado. Ao contrário, consideram que não há o que mudar.
A
única concessão feita pela presidente Dilma foi admitir que o
ex-presidente Lula errou ao julgar que a crise financeira que estourou
em 2008 chegaria ao Brasil como uma “marolinha”.
A presidente
Dilma mais uma vez considera “inadmissível” o pessimismo em relação à
economia brasileira, e compara-o ao pessimismo sobre a Copa no Brasil.
Para Dilma, não há necessidade de mudanças. Ela nega que a inflação no
país esteja “descontrolada”.
Já o ministro da Fazenda, Guido
Mantega, disse que o FMI comete o mesmo equívoco de outros organismos no
passado, quando afirmaram que o Brasil estaria entre as cinco economias
mais frágeis.
Segundo o ministro, “ninguém mais falou nesse
assunto e nada aconteceu”. Para ele, uma instituição financeira
respeitável não faria uma análise dessas.
Pois foi a
diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Christine
Lagarde, que comentou ontem o relatório sobre o Brasil, reiterando que
há 15 meses o FMI vem repisando “as mesmas fortes recomendações para que
reformas estruturais sejam feitas, gargalos sejam reduzidos na economia
e que o potencial, a capacidade de o Brasil entregar crescimento seja
liberada. E isso não vem sendo feito”.
Lagarde repetiu que o
receituário para superar os obstáculos, é único: reformas estruturais,
conserto dos problemas macroeconômicos como inflação alta, déficits em
contas externas, desequilíbrios fiscais.
A previsão do FMI é a de
que o país será afetado duramente pela retirada de estímulos e pelo
aumento de juros, especialmente nos Estados Unidos, se os emergentes
continuarem crescendo abaixo do esperado, como ocorre há três anos.
A
queda dos preços das commodities é outro fator que pode complicar a
vida dos emergentes, alerta o FMI. Já a agência Moodys destaca que a
estatal irá enfrentar também “riscos políticos substanciais”, pois está
“cerceada pelas políticas de preços para gasolina e óleo diesel”.
A
Moody’s ressalta ainda que o cenário macroeconômico do país tem
“desacelerado” desde a crise de 2009. A expectativa da agência é de
crescimento de apenas 1,5% no PIB brasileiro, o que é uma previsão
otimista, tendo em vista que a pesquisa Focus, realizada pelo Banco
Central, já está em 0,9%.
O tal mercado financeiro está cheio de
dúvidas e de advertências à política econômica do governo brasileiro, e
nossas autoridades brincam de um nacionalismo canhestro, como se
mobilizar sindicatos e militantes políticos para demitir analistas de
mercado e desmoralizar banqueiros internacionais fosse melhorar a
situação de nossa economia.
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