Sauditas expandem poder regional enquanto outros perdem força
David D. Kirkpatrick - NYTOs governantes da Arábia Saudita tremeram quando as revoltas da Primavera Árabe irromperam quatro anos atrás.
Mas longe de prejudicar a dinastia saudita, o caos que se seguiu por
toda a região parece, em vez disso, ter elevado a monarquia a um poder e
influência sem rivais. À medida que um novo rei assume o trono em Riad,
o autoritarismo de "estabilidade primeiro" que os sauditas há muito
favorecem está ressurgindo desde Túnis até o Cairo e Manama. Os
islamitas com eleições em mente, que antes os sauditas temiam, estão em
fuga. O príncipe Mohammed bin Nayef, ministro de interior que liderou a
pressão contra eles, foi recompensado na semana passada com sua elevação
a vice-príncipe da coroa, o primeiro em sua geração na linha de
sucessão.
O problema, dizem analistas e diplomatas, é que a ascensão dos sauditas é em grande parte um subproduto da fraqueza ou quase colapso de tantos estados ao seu redor, entre eles o Iraque, Egito, Síria, Iêmen, Líbia, Bahrain e Tunísia. E a perseverança da velha ordem depende muito de um fluxo estável de recursos sauditas, então a influência deles pode ser cara.
Os sauditas estão sustentando o reino de Bahrain, e estão lutando ao lado dos Estados Unidos para apoiar o governo em Bagdá. Bilhões de dólares dos cofres sauditas estão sustentando governos amigáveis no Egito e na Jordânia. Milícias apoiadas pelos sauditas estão lutando na Líbia, e a mídia noticiosa saudita fornece apoio crítico para as facções preferidas pela monarquia na Tunísia e em outros lugares.
O reino pode reivindicar poucas vitórias, entre elas o governo militar instalado no Cairo e o governo eleito em Túnis. Mas os mesmos problemas que enfrentam seus vizinhos também podem dar aos governantes da Arábia Saudita motivo para se preocupar. Seus esforços não têm resultado em nenhum sinal de estabilidade na Síria, Iraque ou Líbia. Uma plano de transição apoiado pela Arábia Saudita no vizinho Iêmen fracassou, deixando os rebeldes apoiados pelo Irã no controle da capital.
"Um ponto forte pode ser interpretado como um ponto fraco", disse um diplomata árabe sênior, falando sob condição de anonimato para evitar afastar os sauditas. "Se todo mundo ao seu redor está indo mal, então sua influência ao redor de suas fronteiras diminui", disse o diplomata, acrescentando: "francamente, a influência de todo mundo no Oriente Médio diminuiu. É simplesmente uma bagunça completa."
Para uma monarquia absoluta cujas raízes dinásticas datam de 300 anos, o papel de liderança da Arábia Saudita na luta para arrumar essa bagunça é um resultado inesperado da Primavera Árabe, que chegou a despertar a esperança pelo estado de direito e a democracia moderna.
"É irônico e anacrônico se visto de fora", disse Gamal Abdel Gawad, um pesquisador do Centro Al Ahram para Estudos Estratégicos e Internacionais no Cairo, financiado pelo estado, e especialmente se acreditarmos que "a região precisa urgentemente de democracia."
"Mas os últimos quatro anos testemunharam contra isso", disse ele, "e se o que a região mais precisa é de estabilidade, governança efetiva e recursos – tudo o que a Arábia Saudita tem – então faz sentido que ela desempenhe um papel de liderança, quaisquer que sejam as características de seu sistema político."
O rei Abdullah da Arábia Saudita morreu na semana passada com um sentimento de vingança, dizem analistas e diplomatas. Robert W. Jordan, ex-embaixador norte-americano na Arábia Saudita, disse que em uma visita social à corte real alguns anos atrás, ele havia agradecido ao rei Abdullah "por não falar: 'eu te disse'."
O rei simplesmente riu. "Porque a verdade é que ele falou 'eu te disse' muitas vezes, e ele continuou a falar para funcionários do atual governo que nós estávamos muito errados", disse Jordan, que foi nomeado pelo presidente George W. Bush.
Entre as queixas do rei, disse Jordan, estão: a urgência da promoção da democracia por parte do governo Bush, o vácuo deixado quando os norte-americanos se retiraram do Iraque, o fato de o governo Obama ter abraçado as revoltas da Primavera Árabe, e particularmente o fracasso em cumprir as ameaças de ação militar contra o presidente Bashar Assad da Síria.
(Assad, um cliente do Irã, é um homem forte do qual os sauditas querem se livrar, mas alguns analistas argumentam que os Estados Unidos estão agora seguindo a lógica mais ampla da preferência saudita pela estabilidade acima da democracia, atenuando as demandas pela saída de Assad.)
"Os sauditas não querem mostrar fraqueza. Eles não querem mostrar vulnerabilidade aos ventos da mudança de uma forma que possa convidar essas mudanças", disse Jordan, simpatizando de certa forma com o desejo saudita de "administrar a mudança em vez de forçá-la."
"Como seria a Arábia Saudita sem a família real? Ela se pareceria com a Líbia, ou a Síria sem Assad", disse Jordan.
Como a Líbia de Muammar Gaddafi, a Arábia Saudita é controlada por uma família governante sem o benefício de instituições duráveis no governo ou na sociedade civil. E como a Síria, os sauditas – agora liderados pelo rei Salman – mantiveram uma tampa bem fechada sobre as tensões sectárias que fervem entre a minoria de muçulmanos xiitas do reino e seus governantes sunitas.
Alguns historiadores argumentam que a Arábia Saudita costuma projetar suas ansiedades internas sobre a região. Preocupações por tensões com os xiitas em casa alimentam sua rivalidade com o Irã xiita, ou temores sobre um desafio doméstico por parte de islamitas políticos alimentam a hostilidade do reino à Irmandade Muçulmana no exterior, diz Toby Jones, historiador da Rutgers University que estuda a Arábia Saudita.
"Os sauditas dizem: 'essas são coisas que precisam ser dominadas' na região porque também são coisas que precisam ser dominadas dentro do reino", disse Jones.
Como o mais populoso estado árabe, o Egito foi por muito tempo considerado o líder árabe de fato, responsável por reunir a Liga Árabe, supervisor das negociações israelenses-palestinas, e principal contrapeso militar ao poder iraniano. Mas quando a revolução que derrubou o presidente Hosni Mubarak em 2011 mergulhou o Egito no tumulto, a Arábia Saudita "assumiu suas responsabilidades" como capitã regional, disse Abdel Gawad, do Centro Al Ahram, no Egito.
O rei Abdullah também deixou saberem nos bastidores que desaprovava a derrubada de Mubarak, castigando autoridades norte-americanas por terem-no abandonado. E os governantes sauditas lamentaram em silêncio a eleição subsequente de islamitas para a Irmandade Muçulmana.
Quando Abdel-Fattah el-Sissi, então general e ex-attaché militar para a Arábia Saudita, liderou a tomada militar do Cairo no verão de 2013, a Arábia Saudita se tornou seu patrocinador mais importante, fornecendo rapidamente mais de US$ 12 bilhões em assistência financeira.
El-Sissi, que agora é presidente, decretou na semana passada sete dias incomuns de luto nacional pelo rei Abdullah. Isso incluiu o cancelamento de celebrações marcadas para domingo para comemorar o quarto aniversário da Primavera Árabe – um passo que os ativistas aqui viram como um reconhecimento ao papel do rei Abdullah na eliminação da revolta.
Nabil Fahmy, ex-ministro de relações exteriores no governo de transição do Egito depois da tomada, disse que os sauditas eram apenas um "ator coadjuvante" da resposta interna contra a Irmandade.
"Os sauditas se posicionaram muito rápido e disseram que nos apoiavam, claro", disse ele. "Mas, francamente, isso ia acontecer."
A Arábia Saudita, junto com os Emirados Árabes Unidos, está agora comprometida a sustentar o governo de el-Sissi com bilhões de dólares de ajuda, provavelmente por anos a fio. O Egito queimou cerca de US$ 20 bilhões da Arábia Saudita e seus aliados no Golfo Pérsico apenas no primeiro ano da tomada militar, sem muita mudança no balancete do governo, e a moeda do Egito atingiu uma nova baixa recorde em relação ao dólar.
"Sim, é um fardo, sem dúvida, especialmente com a queda no preço do petróleo", disse Mustafa Alani, um analista do Centro de Pesquisa do Golfo que é próximo do governo saudita. "Mas eles estão próximos de apoiar a economia do Egito por muito tempo, porque o custo estratégico do fracasso seria um fardo ainda maior se o Egito entrasse em colapso."
A Arábia Saudita emergiu como líder regional porque "ela conseguiu aguentar a tempestade", disse ele. "Então agora eles sentem que 'sim, sobrevivemos, ótimo, mas precisamos estabilizar o ambiente em torno se quisermos sobreviver por mais tempo.'"
Ainda assim, Jones, o historiador, disse que é muito cedo para julgar. "Eles estão apoiando o mesmo elenco de personagens que os deixaram em uma posição vulnerável em primeiro lugar", quando a Primavera Árabe sacudiu a região em 2011, disse ele. "Isso apenas faz o relógio voltar."
É a fragilidade da ordem existente, disse ele, "que produziu o efeito de fazer com que os sauditas parecessem ainda mais poderosos, porque eles são os únicos que ficaram com poder e recursos suficientes para sustentar isso."
Tradutor: Eloise De Vylder
O problema, dizem analistas e diplomatas, é que a ascensão dos sauditas é em grande parte um subproduto da fraqueza ou quase colapso de tantos estados ao seu redor, entre eles o Iraque, Egito, Síria, Iêmen, Líbia, Bahrain e Tunísia. E a perseverança da velha ordem depende muito de um fluxo estável de recursos sauditas, então a influência deles pode ser cara.
Os sauditas estão sustentando o reino de Bahrain, e estão lutando ao lado dos Estados Unidos para apoiar o governo em Bagdá. Bilhões de dólares dos cofres sauditas estão sustentando governos amigáveis no Egito e na Jordânia. Milícias apoiadas pelos sauditas estão lutando na Líbia, e a mídia noticiosa saudita fornece apoio crítico para as facções preferidas pela monarquia na Tunísia e em outros lugares.
O reino pode reivindicar poucas vitórias, entre elas o governo militar instalado no Cairo e o governo eleito em Túnis. Mas os mesmos problemas que enfrentam seus vizinhos também podem dar aos governantes da Arábia Saudita motivo para se preocupar. Seus esforços não têm resultado em nenhum sinal de estabilidade na Síria, Iraque ou Líbia. Uma plano de transição apoiado pela Arábia Saudita no vizinho Iêmen fracassou, deixando os rebeldes apoiados pelo Irã no controle da capital.
"Um ponto forte pode ser interpretado como um ponto fraco", disse um diplomata árabe sênior, falando sob condição de anonimato para evitar afastar os sauditas. "Se todo mundo ao seu redor está indo mal, então sua influência ao redor de suas fronteiras diminui", disse o diplomata, acrescentando: "francamente, a influência de todo mundo no Oriente Médio diminuiu. É simplesmente uma bagunça completa."
Para uma monarquia absoluta cujas raízes dinásticas datam de 300 anos, o papel de liderança da Arábia Saudita na luta para arrumar essa bagunça é um resultado inesperado da Primavera Árabe, que chegou a despertar a esperança pelo estado de direito e a democracia moderna.
"É irônico e anacrônico se visto de fora", disse Gamal Abdel Gawad, um pesquisador do Centro Al Ahram para Estudos Estratégicos e Internacionais no Cairo, financiado pelo estado, e especialmente se acreditarmos que "a região precisa urgentemente de democracia."
"Mas os últimos quatro anos testemunharam contra isso", disse ele, "e se o que a região mais precisa é de estabilidade, governança efetiva e recursos – tudo o que a Arábia Saudita tem – então faz sentido que ela desempenhe um papel de liderança, quaisquer que sejam as características de seu sistema político."
O rei Abdullah da Arábia Saudita morreu na semana passada com um sentimento de vingança, dizem analistas e diplomatas. Robert W. Jordan, ex-embaixador norte-americano na Arábia Saudita, disse que em uma visita social à corte real alguns anos atrás, ele havia agradecido ao rei Abdullah "por não falar: 'eu te disse'."
O rei simplesmente riu. "Porque a verdade é que ele falou 'eu te disse' muitas vezes, e ele continuou a falar para funcionários do atual governo que nós estávamos muito errados", disse Jordan, que foi nomeado pelo presidente George W. Bush.
Entre as queixas do rei, disse Jordan, estão: a urgência da promoção da democracia por parte do governo Bush, o vácuo deixado quando os norte-americanos se retiraram do Iraque, o fato de o governo Obama ter abraçado as revoltas da Primavera Árabe, e particularmente o fracasso em cumprir as ameaças de ação militar contra o presidente Bashar Assad da Síria.
(Assad, um cliente do Irã, é um homem forte do qual os sauditas querem se livrar, mas alguns analistas argumentam que os Estados Unidos estão agora seguindo a lógica mais ampla da preferência saudita pela estabilidade acima da democracia, atenuando as demandas pela saída de Assad.)
"Os sauditas não querem mostrar fraqueza. Eles não querem mostrar vulnerabilidade aos ventos da mudança de uma forma que possa convidar essas mudanças", disse Jordan, simpatizando de certa forma com o desejo saudita de "administrar a mudança em vez de forçá-la."
"Como seria a Arábia Saudita sem a família real? Ela se pareceria com a Líbia, ou a Síria sem Assad", disse Jordan.
Como a Líbia de Muammar Gaddafi, a Arábia Saudita é controlada por uma família governante sem o benefício de instituições duráveis no governo ou na sociedade civil. E como a Síria, os sauditas – agora liderados pelo rei Salman – mantiveram uma tampa bem fechada sobre as tensões sectárias que fervem entre a minoria de muçulmanos xiitas do reino e seus governantes sunitas.
Alguns historiadores argumentam que a Arábia Saudita costuma projetar suas ansiedades internas sobre a região. Preocupações por tensões com os xiitas em casa alimentam sua rivalidade com o Irã xiita, ou temores sobre um desafio doméstico por parte de islamitas políticos alimentam a hostilidade do reino à Irmandade Muçulmana no exterior, diz Toby Jones, historiador da Rutgers University que estuda a Arábia Saudita.
"Os sauditas dizem: 'essas são coisas que precisam ser dominadas' na região porque também são coisas que precisam ser dominadas dentro do reino", disse Jones.
Como o mais populoso estado árabe, o Egito foi por muito tempo considerado o líder árabe de fato, responsável por reunir a Liga Árabe, supervisor das negociações israelenses-palestinas, e principal contrapeso militar ao poder iraniano. Mas quando a revolução que derrubou o presidente Hosni Mubarak em 2011 mergulhou o Egito no tumulto, a Arábia Saudita "assumiu suas responsabilidades" como capitã regional, disse Abdel Gawad, do Centro Al Ahram, no Egito.
O rei Abdullah também deixou saberem nos bastidores que desaprovava a derrubada de Mubarak, castigando autoridades norte-americanas por terem-no abandonado. E os governantes sauditas lamentaram em silêncio a eleição subsequente de islamitas para a Irmandade Muçulmana.
Quando Abdel-Fattah el-Sissi, então general e ex-attaché militar para a Arábia Saudita, liderou a tomada militar do Cairo no verão de 2013, a Arábia Saudita se tornou seu patrocinador mais importante, fornecendo rapidamente mais de US$ 12 bilhões em assistência financeira.
El-Sissi, que agora é presidente, decretou na semana passada sete dias incomuns de luto nacional pelo rei Abdullah. Isso incluiu o cancelamento de celebrações marcadas para domingo para comemorar o quarto aniversário da Primavera Árabe – um passo que os ativistas aqui viram como um reconhecimento ao papel do rei Abdullah na eliminação da revolta.
Nabil Fahmy, ex-ministro de relações exteriores no governo de transição do Egito depois da tomada, disse que os sauditas eram apenas um "ator coadjuvante" da resposta interna contra a Irmandade.
"Os sauditas se posicionaram muito rápido e disseram que nos apoiavam, claro", disse ele. "Mas, francamente, isso ia acontecer."
A Arábia Saudita, junto com os Emirados Árabes Unidos, está agora comprometida a sustentar o governo de el-Sissi com bilhões de dólares de ajuda, provavelmente por anos a fio. O Egito queimou cerca de US$ 20 bilhões da Arábia Saudita e seus aliados no Golfo Pérsico apenas no primeiro ano da tomada militar, sem muita mudança no balancete do governo, e a moeda do Egito atingiu uma nova baixa recorde em relação ao dólar.
"Sim, é um fardo, sem dúvida, especialmente com a queda no preço do petróleo", disse Mustafa Alani, um analista do Centro de Pesquisa do Golfo que é próximo do governo saudita. "Mas eles estão próximos de apoiar a economia do Egito por muito tempo, porque o custo estratégico do fracasso seria um fardo ainda maior se o Egito entrasse em colapso."
A Arábia Saudita emergiu como líder regional porque "ela conseguiu aguentar a tempestade", disse ele. "Então agora eles sentem que 'sim, sobrevivemos, ótimo, mas precisamos estabilizar o ambiente em torno se quisermos sobreviver por mais tempo.'"
Ainda assim, Jones, o historiador, disse que é muito cedo para julgar. "Eles estão apoiando o mesmo elenco de personagens que os deixaram em uma posição vulnerável em primeiro lugar", quando a Primavera Árabe sacudiu a região em 2011, disse ele. "Isso apenas faz o relógio voltar."
É a fragilidade da ordem existente, disse ele, "que produziu o efeito de fazer com que os sauditas parecessem ainda mais poderosos, porque eles são os únicos que ficaram com poder e recursos suficientes para sustentar isso."
Tradutor: Eloise De Vylder
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