quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

PARAGUAI - TERRA DE BANDIDOS, TRAFICANTES E CONTRABANDISTAS DEVERIA TER SIDO CIVILIZADO NA GUERRA DO SÉCULO XIX. PERDEMOS ESSA CHANCE

Terra sem lei
Paraguai está dividido entre os produtores rurais brasileiros, os brasiguaios, e sem-terra da base de apoio do presidente Lugo
LAURA CAPRIGLIONE - FSP
"É a corrupção de sempre que está agora, de novo, dando as cartas. Para aumentar seu cacife político, o presidente Fernando Lugo manipula esses bandidos que querem invadir terras", afirma Felino Amarilla, 54, advogado da União dos Grêmios da Produção, a UGP, espécie de sindicato nacional dos produtores rurais do Paraguai.
Debaixo de uma lona preta, sob o calor sufocante de 42ºC, no meio do acampamento 12 Apóstolos de trabalhadores sem-terra, perdido em uma pequena faixa inculta no meio da imensa plantação de soja, às margens do rio Paraná, o dirigente Rosalino Casco, 38, ameaça: "Desta semana não passa. É sim ou sim. Se Lugo disser que as terras são deles, nós ocupamos. Se disser que não são deles, ocupamos também".
A um ano e meio das eleições que definirão quem será o sucessor do presidente paraguaio esquerdista, Fernando Lugo, o país está dividido. De um lado, trabalhadores rurais sem-terra, base histórica do próprio Lugo.
De outro, os produtores de soja, empreendedores rurais em grande medida responsáveis pelos espetaculares 15% de crescimento econômico do Paraguai em 2010 -exportaram soja para alimentar os porcos que alimentam os chineses.
O trator da economia paraguaia, porém, não é visto com bons olhos pelos pequenos produtores rurais do país. Além das acusações de que usa sementes geneticamente alteradas, ainda não testadas em seu potencial agressivo sobre o ambiente, de que emprega agrotóxicos venenosos para as populações e para os animais no entorno, de que concentra a terra e expulsa o homem -no caso, paraguaio- do campo, o agronegócio tem um elemento adicional explosivo.
"Os donos dos latifúndios são brasileiros. Tudo o que queremos é que os pequenos produtores paraguaios também recebam apoio. A terra paraguaia é dos paraguaios", afirma Casco.
Em todo o acampamento localizado na cidadezinha de Ñacunday, podem-se ler faixas com dizeres nacionalistas em espanhol e guarani.
"São xenófobos", acusa Amarilla. "Mas trata-se de xenofobia fabricada pelo governo populista de Lugo. É tão inconsistente que Lugo, o antibrasileiro, trata seu câncer no hospital Sírio-Libanês de São Paulo, o mesmo hospital de Lula, e não em um centro de saúde paraguaio. E por quê?", pergunta o dirigente.
Os sem-terra reivindicam 167 mil hectares de terras na região do Alto Paraná, faixa de fronteira com o Brasil. Dizem que se trata de apenas uma parte dos quase 300 mil hectares de propriedades cuja titularidade nunca saiu das mãos do Estado. Terras públicas que teriam sido usurpadas por "grileiros de terras brasileiros".
STROESSNER
Segundo os produtores rurais, os sem-terra são contra qualquer empreendedor. "Opõem-se aos brasiguaios, mas também aos japaguaios e aos polacoguaios", diz, referindo-se à forma como os brasileiros que investiram no Paraguai são conhecidos.
Amarilla diz que os produtores têm os registros de todas as terras que ocupam. "Que culpa temos se, durante o regime do ditador Alfredo Stroessner [1954-1989], ele resolveu vender as terras públicas do leste do país pela bagatela de US$ 1 por hectare? Que culpa temos se ele resolveu premiar cada soldado que completava o serviço militar com dez hectares de terras e que muitos desses soldados tenham optado por vender suas posses para empreendedores rurais?"
Segundo Amarilla, isso foi feito nos anos 1970-80, e não pode ser desfeito. "Era essa a legalidade de então. Simples assim", diz.
"Ainda que fosse legal, não seria justo", diz o dirigente dos sem-terra Victoriano Lopez. "Se dez pessoas infringem a lei, são dez criminosos. Mas, se 1 milhão infringe a lei, a lei tem de ser mudada."
O chefe de gabinete civil de Fernando Lugo, Miguel López Perito, disse que cabe à Justiça decidir o destino das terras. E ofereceu "segurança" para os brasileiros.

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