quinta-feira, 30 de julho de 2015

Reino Unido não pode conter o extremismo por meio de legislação
Jay Elwes - Prospect
Khalid al-Mousily/Reuters
Populares retornam ao local onde um carro-bomba foi detonado em Bagdá, no Iraque, em 21 de julho. O país foi alvo de quatro ataques terroristas com carros-bomba, todos atribuídos ao grupo terrorista Estado Islâmico (EI)
Populares retornam ao local onde um carro-bomba foi detonado em Bagdá, no Iraque, em 21 de julho. O país foi alvo de quatro ataques terroristas com carros-bomba, todos atribuídos ao grupo terrorista Estado Islâmico (EI)
Nos últimos 10 anos, a ameaça do extremismo no Reino Unido "parece ter aumentado", segundo Richard Dearlove, o ex-chefe do MI6. Desde os ataques terroristas em Londres de 2005, nos quais 52 pessoas foram mortas, ocorreu apenas uma morte por terrorismo no Reino Unido –-o assassinato de Lee Rigby, em Woolwich, em 2013.
"Mas em termos de números", disse Dearlove, "os aspectos inspiradores de um movimento como o EI (o grupo Estado Islâmico) causaram um bom grau de atração entre os jovens muçulmanos".
Diante dos ataques terroristas de junho em Sousse, a cidade turística praiana tunisiana onde 30 cidadãos britânicos foram assassinados por um homem armado ligado ao Estado Islâmico, esses comentários são motivo para profunda preocupação. O extremismo islâmico aumentou no Oriente Médio, norte da África, Nigéria e sul da Península Árabe. As autoridades nos Estados Unidos estão preocupadas com o fato de um crescente número de americanos estar exposto a material promocional e de arrecadação de fundos do Estado Islâmico. Dearlove sugere que mais muçulmanos britânicos estão se radicalizando.
"Somos afortunados por muitas dessas pessoas terem deixado o país e não estarem aqui, mas sim na Síria", disse Dearlove. "Mas isso deixa a preocupação sobre se voltarão, como se comportarão e que tipo de atitude terão em relação à sociedade."
Parte da reação do governo à ameaça do extremismo tem sido a introdução de uma abordagem chamada de "espectro pleno", onde o extremismo não violento será considerado como precursor do extremismo violento e será tratado com tal. Dearlove chamou esta de "uma época excepcionalmente difícil".
"Quando se fala em 'espectro pleno', eu não vejo que medidas devem ser tomadas. Obviamente, se restrições legais a isso começarem a ser implantadas, há a preocupação sobre o que isso significará na prática."
Dearlove disse que a cura para o extremismo só pode ser encontrada dentro das comunidades muçulmanas britânicas, a tornando "mais uma questão sociocultural do que uma questão legal". "Ocorreu um fracasso, não apenas em nossas relações com as comunidades muçulmanas, mas dentro das próprias comunidades muçulmanas" no trato à radicalização, ele disse.
Também é incerto quanto uma abordagem de espectro pleno entrará em conflito com os valores britânicos de liberdade de expressão e pensamento. "Durante a Guerra Fria", disse Dearlove, "nós convivíamos de modo razoavelmente confortável com partidos comunistas em nosso meio, que se fôssemos analisar a lógica da posição deles, era fundamentalmente oposta aos valores de uma sociedade democrática. Havia o problema da subversão interna, mas não era tratada como um problema que exigia uma legislação contrária". Seu argumento sugere que a tentativa de criar legislação contra os grupos que buscam minar internamente os valores britânicos é desnecessária.
Segundo a avaliação de Dearlove, a ameaça do extremismo existirá no Reino Unido ao longo de pelo menos a próxima década, com sua persistência incitada por um clima geopolítico que permite sua proliferação. Desde que Barack Obama chegou ao poder em 2009, os Estados Unidos adotaram uma política de engajamento leve no Oriente Médio, preferindo desenvolver áreas de influência em outros lugares. A Casa Branca de Obama mudou o foco de sua política externa para a Ásia, onde os vastos mercados da China atraem. A decisão de se afastar do Oriente Médio foi uma reação compreensível diante das aventuras militares fracassadas.
"Não há dúvida de que a postura de Obama em relação à presença americana no Oriente Médio exibe fortes tendências isolacionistas", disse Dearlove. "A retirada do Afeganistão, a retirada do Iraque –-foram decisões populares domesticamente. Acho que em termos do posicionamento dos Estados Unidos como poder global foi algo desafortunado. É com certeza um passo para trás. Isso permitiu que forças como o Taleban e o EI, em particular, preenchessem esses vácuos que foram deixados em consequência da política americana."
Quanto ao Reino Unido, disse Dearlove, "nós poderíamos ter mantido nossa presença militar no Afeganistão", acrescentando que o Reino Unido fracassou em sua "inabilidade de moldar a oposição síria".
"Isso não necessariamente significaria o envio de tropas, mas (...) um compromisso de apoio e treinamento em grande escala, que nunca se materializou."
Os governos ocidentais enfrentam uma série de ameaças, dentre as quais o extremismo é apenas uma. A crise da dívida grega é uma ameaça à estabilidade da zona do euro, a ocupação da Ucrânia pela Rússia permanece entrincheirada e a economia chinesa passa por um período de extrema instabilidade. Comum a todas as situações está a inabilidade do Ocidente em exercer qualquer influência substancial.
Parece que agora há uma disposição renovada em combater o Estado Islâmico, mas os governos ocidentais ainda não traduziram sua retórica dura em uma ação direta. Um contínuo fracasso em agir poderia ser profundamente contraproducente. "Se os Estados Unidos não agirem de modo mais ativo", alerta Dearlove, "nós teremos uma sucessão de crises regionais muito sérias".
Tradutor: George El Khouri Andolfato 

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