segunda-feira, 26 de junho de 2017

A história da ruína do Rio num restaurante tradicional da Lapa
Elio Gaspari - FSP
Pezão, o governador do Rio de Janeiro, avisa que poderá ir embora antes do fim do seu mandato. Jorge Picciani, o dono da Assembleia do Estado, diz que Pezão é um incompetente e deve ser posto para fora.
Passará o tempo e tanto Pezão como Picciani virarão asteriscos da história da ruína do Rio. O mesmo não acontecerá com a memória de algo maior que Pezão ou Picciani: a amargura de coisas como o possível fechamento do restaurante "Nova Capela". Seu dono diz que a crise do Estado e a violência da cidade derrubaram a freguesia.
Não é bem assim. A crise do Capela é mais um símbolo do esgotamento da fantasia demófoba que encantou o Rio. Para entendê-la é preciso voltar ao início do século passado, quando o restaurante foi aberto, no largo da Lapa. O Capela era uma casa de decoração elegante, com toques de art nouveau. (O beco das perplexidades e tristezas de Manuel Bandeira ficava a uns 200 metros.) Atendia boêmios e vendia boa comida. Seus grandes pratos eram o filé ou o frango à francesa, com batatas fritas ervilhas e tiras de presunto.
No anos 70, o quarteirão onde estava o velho Capela foi demolido e a casa mudou-se para alguns quarteirões adiante. Chamou-se Nova Capela, mais modesto que o anterior, mas continuou a ser um restaurante do velho centrão do Rio.

Pedro Carrilho/Folhapress
A fachada do restaurante Nova Capela, na Lapa
A fachada do restaurante Nova Capela, na Lapa
A decoração era pobre e da velha casa restavam só alguns quadros. A comida, os preços, os garçons e a base da freguesia eram os mesmos. Até certa hora, atendia famílias da vizinhança. Depois, como disse "Seu" Cabral, um velho jornalista, todo mundo, inclusive "prostitutas, proxenetas e pequenos policiais..." Vendo meganhas numa mesa ao lado, emendou "...e grandes policiais".
Há 20 anos surgiu uma Nova Lapa e, em seguida, um novo Rio. Nele, o candidato a prefeito Sérgio Cabral dizia que a Rocinha era uma fábrica de marginais. Mais tarde, eleito governador, chegou a anunciar que muraria uma favela. (O juiz Marcelo Bretas murou-o.)
Na Nova Lapa desse novo Rio, surgiu uma nova freguesia e o Nova Capela entrou na moda. Começaram aí seu esplendor e o consequente declínio. Os preços subiram e a velha freguesia, aquela que comia bem pagando pouco, foi-se embora. A nova clientela, atraída pelo charme da casa, diminuiu a exigência, derrubou a qualidade da comida e foi em frente. O Capela deixou de ser o que era, para ser nada.
O dono do restaurante atribui o declínio do restaurante à crise econômica e à violência. Nem uma nem outra. Se fosse assim, não haveria restaurantes na Lapa. O Rio Maravilha do Novo Capela, de Cabral, Pezão, Picciani e Eduardo Paes foi uma fantasia fracassada. Foi um Rio que foi dormir em Miami e acordou na Mem de Sá.

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