Oportunidades da crise
João Bosco Rabello - OESP
O governo logrou a aprovação da anistia da meta
fiscal, a duras penas, mas a oposição também conseguiu alcançar seu
objetivo de impor imenso desgaste político à presidente Dilma Rousseff,
ajudada pelo PMDB que deu a maioria que lhe faltava enquanto executava
sua estratégia de pressionar o Planalto.
O assunto ganhou visibilidade nacional , assim como a
leitura de calote que a oposição conseguiu agregar ao projeto. Na volta
mesmo do Congresso Nacional, na madrugada de hoje, era possível a
muitos atores secundários da votação constatar que não há motorista de
táxi que tivesse interpretação diferente que a disseminada pela oposição
para o episódio.
Os telejornais cuidaram de explicar didaticamente o
tema, de alguma complexidade econômica e pontuado por terminologias
distantes do cotidiano da maioria das pessoas, traduzindo-o em uma conta
de assimilação ginasiana.
Ao governo não restava alternativa senão cruzar o
rubicão, que implicou o reconhecimento da impossibilidade de cumprir
metas que ele próprio estipulara, passando um atestado público de má
gestão – de resto, amplamente consolidada na opinião pública, diante das
contradições entre o dioscurso de campanha e o dia seguinte à reeleição
de Dilma Rousseff.
Não há dúvida para ninguém que o país está com a
economia estagnada, as contas públicas destroçadas, investimentos
paralisados, crescimento quase zero e que esse conjunto desanimador não
pode ser atribuído a uma crise externa.
Ajuda essa última percepção o avassalador avanço das
investigações que desnudam um esquema de corrupção de volume ímpar no
país, em que um gerente de terceiro escalão da Petrobras se compromete a
devolver 100 milhões de dólares.
O cidadão começa a fazer contas e a estabelecer a
linha lógica de raciocínio entre corrupção de Estado e ineficiência de
gestão, equação que explica a deterioração dos serviços públicos em
contrapartida a uma carga tributária altíssima e corrosiva.
Mesmo assim, o PT ainda sonha em voltar a viver
perigosamente, estimulando a ideia de que o novo ministro da Fazenda,
Joaquim Levy, tem prazo de vida no governo, no qual ficaria tempo
suficiente para consertar os erros, assumindo o ônus das medidas
recessivas.
Pode-se deduzir por pensamentos manifestados por
alguns integrantes do partido que a guinada ortodoxa de Dilma tem prazo
de validade, estimado em dois anos , ou pouco mais, tempo que se calcula
para repor a economia nos trilhos.
Cumprida essa etapa, voltaria o discurso e a prática
anteriores para viabilizar a candidatura do ex-presidente Lula em 2018,
que se vitoriosa completaria o ciclo de 20 anos de poder petista. É uma
nova ilusão, mas com riscos concretos de se levar o país à bancarrota.
A presidente Dilma ainda não deu os sinais
necessários para tirar a nomeação de Joaquim Levy do plano da dúvida
quanto à sua continuidade como modelo permanente para a economia. A
dúvida do mercado em relação ao assunto é alimentada pelas versões como a
do líder do PT, Humberto Costa (PE), que dão à nomeação de Levy caráter
transitório (“é apenas uma etapa”).
A rigor, a presidente perde a oportunidade de
enfrentar o fisiologismo de sua amplíssima base de sustentação no
Congresso, ao manter o número de 39 ministérios como base mpara as
negociações políticas em troca do apoio parlamentar.
O governo estimula a argumentação de que o número de Pastas, considerando as várias secretarias que têm status
de ministério, mas estruturas simples, não é fator essencial no
contexto do gasto público, o que orçamentariamente pode até fazer algum
sentido.
Mas o nefasto é o que sinaliza e propicia estrutura
tão grande. Sinaliza para um modelo de fartura, em época de
incontornável austeridade, e propicia gastos fora do interesse público,
para abrigar conveniências de uma constelação partidária que vai a 30
legendas, da qual se extraem apenas seis ou sete com legitimidade de
representação, configurando uma maioria que se dedica tão somente à
extorsão política.
Terá uma nova oportunidade a presidente da República
de promover mudança também nesses critérios, quando desabar sobre o
Congresso Nacional o telhado de concreto construído pela aliança mafiosa
entre construtoras e os partidos da base de sustentação de seu governo.
Se tomados por verdadeiros os frequentes sinais da
presidente de que o sistema a torna refém – e a qualquer outro – da
chantagem política de um universo de 30 partidos – que, teoricamente,
impõe a submissão à vontade dos três maiores para fazer valer a força do
governo -, a reforma política é a saída, ainda que nem precise se dar
em toda a extensão ideal.
Pois o quadro que advirá das investigações da
Petrobrás oferece a oportunidade histórica de somar esses cenários
fragmentados em um movimento que possa alterar o contexto nocivo atual.
Desde que a presidente se disponha a liderar a reforma em bases plurais
ao invés de fazer coro a mudanças sectárias que interessam apenas ao PT.
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