Lula infla sua imagem
Merval Pereira - O Globo
Mesmo
que as pesquisas de opinião demonstrem sua fragilidade eleitoral neste
momento, Lula precisa manter viva a expectativa de poder, para não
abandonar o PT moribundo no meio da praça e, ao mesmo tempo, inflar sua
imagem política para constranger iniciativas que visem criminalizá-lo.
Como
não tem controle sobre as investigações da Operação Lava-Jato nem sobre
as delações premiadas, as já feitas e as que estão por vir, só resta a
Lula fazer política. Afinal, na Operação Mãos Limpas da Itália, foram
presos nada menos que 438 parlamentares, dos quais quatro haviam sido
primeiros-ministros.
Seu alter-ego “Lula Inflado”, o boneco que
o apresenta no uniforme de presidiário com o número 13 (do PT) 171
(artigo do código penal para estelionato), que tanto sucesso fez na
recente manifestação de Brasília, é um inesperado estrago à sua imagem
e, assim como ele, começou uma viagem pelo Brasil aparecendo ontem em
diversos pontos da capital paulista.
Por coincidência, ontem
também o juiz Sérgio Moro titular da 13ª Vara Federal, em Curitiba,
centro das investigações da Lava Jato, fez uma palestra na sede do
Ministério Público Federal em São Paulo e comparou a ação brasileira à
Operação Mãos Limpas, o famoso combate na Itália contra a corrupção,
ocorrido na década de 90.
Considerado um dos maiores
especialistas em combate à lavagem de dinheiro, Moro é um estudioso do
caso italiano e publicou em 2004 na revista do Conselho de Justiça
Federal artigo em que traça paralelos entre o Brasil daquela época e a
Itália. Moro fez uma brincadeira quando falava ontem sobre as críticas
que recebe pela decretação de prisões preventivas na Operação Lava-Jato.
Depois de citar as 800 prisões por corrupção na Mãos Limpas, Moro
comparou com a Lava Jato. “Ainda tenho um saldo”.
Dois anos
depois de iniciada, em meados de fevereiro de 1992, com a prisão de
Mario Chiesa, que ocupava o cargo de diretor de instituição filantrópica
de Milão, 2.993 mandados de prisão haviam sido expedidos; 6.059 pessoas
estavam sob investigação, incluindo 872 empresários, 1.978
administradores locais.
Aqui ainda não chegamos a tanto, mas
também, como Moro faz questão de frisar, ainda não estamos nem mesmo na
metade do caminho. Na Itália, o Partido Socialista (PSI) e a Democracia
Cristã (DC) saíram devastados da primeira eleição depois da Operação
Mãos Limpas, em 1994, obtendo 2,2% e 11,1% dos votos, respectivamente. O
PT começa a se desmanchar, perdeu só em São Paulo este ano cerca de 20%
dos prefeitos que elegeu em 2012, e parlamentares simbólicos como a
senadora Marta Suplicy, e é provável que outros anunciem a saída até o
começo do outubro, prazo para mudança de legenda para quem pretende
disputar a eleição em 2016.
A eleição municipal, por sinal, deve
ser um marco na redução da representação do Partido dos Trabalhadores em
decorrência dos escândalos que vêm envolvendo o partido desde o
mensalão em 2005. Os membros do governo e dirigentes petistas já não
conseguem sair à rua sem serem rejeitados publicamente – outro dia o
Advogado Geral da União Luis Adams que foi praticamente colocado para
fora em um restaurante em Brasília, o que é lamentável mas reflete um
sentimento predominante.
Das três causas apontadas pelos
estudiosos que possibilitaram o surgimento da Operação Mãos Limpas, pelo
menos duas existem entre nós: uma conjuntura econômica difícil, aliada
aos custos crescentes da corrupção; e a queda do “socialismo real”, que
levou à deslegitimação de um sistema político corrupto, fundado na
oposição entre regimes democráticos e comunistas. A outra causa está
relacionada à competitividade da União Européia.
Os governos de
esquerda que dominaram a América Latina nos últimos anos estão sofrendo
uma onda de contestação pelas crises econômicas que produziram e a
corrupção disseminada. O juiz Sérgio Moro ressalta em seu artigo que
essa “deslegitimação” do sistema político foi agravada com o início das
prisões e a divulgação de casos de corrupção.
No Brasil, as
revelações de que o esquema de corrupção na Petrobras era coordenado
pelo PT; que o ex-ícone da esquerda José Dirceu recebia propinas em
causa própria, e que o presidente da Eletronuclear Brigadeiro Othon Luiz
Pinheiro, considerado “o pai do programa nuclear brasileiro” montou um
esquema para receber “pixulecos” das empresas que construíram o complexo
nuclear de Angra dos Reis, serviram também para deslegitimar a ação
política do governo e seus aliados partidários. ( Amanhã, a pressão da
sociedade).
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