quinta-feira, 17 de julho de 2008

No café, outra pequena epifania

Às vezes parece que os deuses nos sorriem e concedem um fiapo de esperança para que esqueçamos, ao menos temporariamente, o desespero que aflige e fustiga a nossa breve existência nesse pedaço de chão.
Ontem, a mensagem dela explodiu na tela do meu computador. Míriade de cores, flores e grafias. Como uma good trip. O coração elevou a pressão e as pupilas dilataram: ela queria marcar um encontro no café! "Mas há que tentar o diálogo quando a solidão é vício.", dizia Drummond. Deixei a vida miserável, e fui ao encontro da minha Galatéia.
Entrei no café, e ela estava lá, recostada na cadeira lendo um Deleuze. Para ficar melhor, pensava eu, só falta ela me amar!
Sua blusa, larga, ressaltava o seu corpo magro, insinuante e sensual, jovem. Juventude reafirmada por um jeans manchado e por um par de tênis All Star cano curto. Quase menina nos seus vinte e um anos, ergueu seus olhos do livro e sorriu daquele jeito que sorria quando estava feliz.
Falamos sobre a vida, as nossas dificuldades (diferentes para cada um nós). Falamos sobre poesia: Quintana, Adélia, Drummond, João Cabral, Cecília Meireles e outras glórias deste país tão emotivo que é o Brasil. Discutimos sobre as diferentes emoções de diferentes povos espalhados por essa grande nave azul. E concluímos: o nosso povo é mais solidário e afetuoso do que os outros. Não importa que se diga ao contrário.
Foi nesse momento, enquanto ela gesticulava e ria (ficava levemente ruborizada quando ria) é que percebi como as suas mãos com dedos finos e longos eram bonitas. E, subindo um pouco mais o olhar (já medindo os centímetros) observei os seus ombros esculpidos no mais puro e alvo dos marfins e me envergonhei de pensá-la minha.
Ela deve ter percebido, pois parou de falar e tornou a rir, agora do meu jeito meio sem graça de ter sido flagrado em pensamentos impróprios.
Percebemos como o tempo correu depressa, quando o café começou a fechar, com os funcionários colocando as cadeiras com as pernas pro ar sobre as pequenas mesas redondas que deviam ter testemunhado vários encontros como o nosso, decretavam o fim da jornada.
Levantamos e, juntos, resolvemos terminar o nosso assunto em outro lugar.
Lá fora a temperatura havia caído, mas nada no mundo seria capaz de nos demover daquilo que nos havíamos proposto.

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