“Houve um gesto de tão baixo nível”, escreveu Míriam, “que prefiro nem relatar aqui”
A Central Única dos Trabalhadores, a Força
Sindical e Militantes do PT realizam manifestação em frente a sede
Administrativa da Rede Globo, em Botafogo, no Rio de Janeiro, neste
domingo (06) (Paulo Campos/Folhapress)
O episódio difere por duas razões de
similares como os xingamentos sofridos pelo ex-ministro Guido Mantega à
porta do hospital aonde fora levar a mulher ou os sofridos pelo também
jornalista Alexandre Garcia num aeroporto. Em primeiro lugar, nesses
casos os agressores eram livres-atiradores, enquanto no de Míriam eram
delegados que, depois de participar da convenção nacional do partido,
regressavam às suas bases. Em segundo, eles agiam como um grupo
organizado, o que os aproxima dos esquadrões de assalto do fascismo
italiano e do nazismo alemão e lhes aumenta a covardia. Eram uns vinte,
segundo a jornalista, alguns já entrados nos 50 anos, e vestiam a camisa
vermelha assim como os fascistas e nazistas de outrora vestiam a
camisa negra.
Faz pouco tempo Míriam Leitão rompeu o
silêncio que guardou por muitos anos sobre um episódio ocorrido quando,
jovem militante do PCdoB, foi presa na ditadura. Seus algozes, depois de
tapas, chutes e repetidas ameaças de estupro, trancafiaram-na, nua,
numa sala escura, e ali a deixaram com uma jiboia por companhia. O
escuro, o desamparo, a impotência, o esforço para não se mexer nem fazer
ruído que pudesse atrair a cobra – tudo somado, o medo era proporcional
ao tamanho da crueldade. O caráter revelado pelos petistas do avião os
aproxima dos torturadores. Deixa supor do que seriam capazes, se
possuíssem os meios de coerção e punição dos agentes da ditadura.
E, no entanto…
No entanto, o que fez o PT? Numa nota, a
nova presidente do partido, a senadora Gleisi Hoffmann, lamentou o
ocorrido e afirmou ser orientação à militância “não realizar
manifestações políticas em locais impróprios e não agredir qualquer
pessoa por suas posições políticas”. É pouco. O grupo em questão não era
de peões da militância. Era de delegados ao maior evento do calendário
partidário, a convenção nacional, mais relevante ainda, nesse caso,
porque elegeria a nova presidente e os novos diretores do partido. O
primeiro motivo de perplexidade é saber que gente da laia de quem
agrediu a jornalista está entre os convocados para decidir os altos
destinos da agremiação. O segundo motivo é que até onde se sabe nenhuma
sanção interna, nem a mais leve admoestação, foi dirigida pelas
instâncias superiores do partido ao grupo de cafajestes e trogloditas do
voo da Avianca.
Eis o PT flagrado em seu labirinto. A
mesma nota da senadora Gleisi afirma que a Rede Globo é “em grande
medida responsável pelo clima de radicalização e até de ódio por que
passa o Brasil”. Não fosse o argumento uma tentativa de atenuar o
impossível de ser atenuado, revela que o PT continua a assistir à Rede
Globo do tempo da ditadura e da campanha de Collor. Assim como o PSDB,
seu contrário mas também seu alter ego, tem o futuro comprometido por
não conseguir se desgarrar do passado. É pena porque o PT é importante
para o Brasil. Representa um segmento significativo da opinião pública,
tem raízes na sociedade e canalizou para as arenas parlamentar e
eleitoral forças que, sem essa alternativa, estariam à deriva como
estiveram as que na Colômbia aderiram às Farc.
“Quando me levantei”, escreveu Míriam
Leitão, no fecho de seu relato, “um deles, no corredor, me apontou o
dedo, xingando em altos brados. Passei entre eles no saguão do aeroporto
debaixo do coro ofensivo.” Em nenhum momento a turba foi perturbada
pelo comandante ou pela tripulação. No voo e nas instâncias partidárias
prevaleceu, impune e triunfante em sua boçalidade, o PT do estardalhaço
fascista.
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